No primeiro dia do mês em que se comemora o Dia Internacional da Mulher eu embarquei no Brasil rumo à Riyadh, na Arábia Saudita, para participar da Brazil Saudi Arabia Conference, evento realizado de 3 a 5 de março e que reuniu 80 empresários sauditas e 72 brasileiros. O evento, promovido pelo LIDE Global, teve por objetivo fomentar negócios entre os dois países em diferentes setores da economia, como infraestrutura, agronegócio e tecnologia. Além disso, fez parte das estratégias do governo saudita no projeto Visão 2030, que quer diminuir a dependência econômica do país do petróleo e, para isso, está dando mais liberdade para as mulheres.
Cheguei sozinha no reino que é conhecido por fazer uma das leituras mais radicais da lei islâmica. Foi minha terceira vez no Oriente Médio, mas a primeira em Riyadh, capital da Arábia Saudita. Há poucos anos, as mulheres não podiam usar piscinas ou andar de bicicleta por aqui; para frequentar restaurantes, só acompanhada do marido e apresentando a certidão de casamento. Somente nos últimos anos as mulheres sauditas conquistaram o direito de dirigir, já podem viajar sem precisar da autorização de um homem e vão ao médico sozinhas, sem necessitar da permissão do seu guardião. Durante a viagem, pesquisei muito sobre os costumes e me preparei psicologicamente para o que poderia encontrar.
O que vemos e ouvimos de uma cultura tão distante da nossa é gritante, mas tem algumas questões que se parecem com o mundo ocidental. Aqui, pela lei, a opinião da mulher vale meia opinião. Parece engraçado, mas ao meu ver se aproxima quando nós, ocidentais, que muitas vezes nos colocamos o rótulo de “empoderadas”, damos uma contribuição ou levantamos uma situação em uma mesa de reunião e somos ignoradas. Aí, poucos minutos depois, um homem repete o que a mulher acabou de dizer e é ouvido.
Cruzei o mundo para participar de uma agenda de negócios bilaterais sabendo que seria uma das poucas mulheres no evento. No Brasil, a presença das mulheres nos ambientes empresariais ainda é restrita, mesmo com todos os avanços que tivemos nas últimas décadas. Cheguei preparada para respeitar os costumes locais, me policiar para não olhar nos olhos dos homens, não sorrir, muito menos ter qualquer gesto que possa ser encarado como uma afronta moral, como um cumprimento, por exemplo.
Mas já na chegada no aeroporto, com minhas malas extraviadas, tive atenção e vi a disposição dos sauditas em me ajudar. Na primeira agenda de trabalho no dia seguinte, na Câmara de Comércio da Arábia Saudita, me deparo com simpáticos e acolhedores senhores, muito receptivos, trocando cartões e me tratando de igual para igual com os colegas homens que participavam da comitiva. Confesso que fiquei emocionada ao ver mulheres participando dos painéis, representando o mercado financeiro e investidores.
Dali em diante, todo o meu preconceito foi embora. A agenda seguiu por dias de ótimas relações, receptivos olhares e uma disposição enorme em aprender e cooperar com o Ocidente. Em todos os ambientes de negócio, desde fundos de investimento até o Ministério Saudita, muitas mulheres trabalhando. E ouvi muitas vezes que, por aqui, elas trabalham e se dedicam muitas vezes mais que os homens, pois precisam provar e comprovar sua capacidade e o espaço que estão conquistando; nada muito diferente do Brasil também.
Além, da dificuldade da língua, o abismo cultural não é obstáculo quando vislumbro todas as oportunidades de negócio que iniciei aqui nesses dias de imersão no Oriente Médio. São mais de 40 países que compõem este bloco econômico e veem o Brasil como o principal player mundial na segurança alimentar, uma vez que 86% de todo alimento consumido aqui é importado. Além das oportunidades em energia renovável, ouvi em muitos momentos se referirem ao nosso país como a “nova Arábia Saudita” da energia limpa, graças à abundância das nossas riquezas naturais e extensão continental.
O desafio de ser mulher deste lado do mundo não é tão diferente daquele que enfrentei quando assumi a presidência de uma entidade empresarial, o LIDE Paraná. Há alguns anos, me perguntavam quem era meu pai ou de quem eu era esposa. Sempre com olhares julgadores, muitos e muitas me perguntavam com quem meus filhos ficavam enquanto a mãe viajava o Brasil e o mundo para promover novos negócios para as empresas do meu Estado. Com certeza, os meus colegas homens não são questionados sobre suas funções paternas.
Meu desejo é que neste mês de março, quando se celebra o Dia Internacional da Mulher com tantas ações de marketing, eventos e discussões, é que as mulheres que protagonizam suas histórias, como eu, incentivem outras mulheres de todas as nacionalidades a fazerem o mesmo, especialmente as árabes, buscando o seu espaço para vencer no caminho que acreditam. Creio que começar o mês com esta missão desafiadora teve um propósito.
Não gosto da palavra empoderamento, que se tornou tão passiva nos últimos anos. Ela me dá a impressão de disputa de poder entre homens e mulheres. Eu prefiro dizer e pensar que nós, mulheres, estamos avançando na conquista da equidade, onde podemos de igual para igual não disputar, mas somar para um mundo mais humano, para negócios mais éticos e em um caminho de prosperidade, independente de gênero.
Heloísa Garrett é empresária e presidente do LIDE Paraná.
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