Desde sempre, nas relações internacionais e na diplomacia é importante compreender as ações e os comportamentos de outros países, tanto presentes como futuros. Durante a Primeira Guerra Mundial, não foi diferente, e obter informações sobre as linhas inimigas era vital, sendo a espionagem uma das melhores formas de fazê-lo. Com isso em mente, dois meses após entrar na Grande Guerra em 1917, os Estados Unidos reconheceram a necessidade de criar uma lei que puniria aqueles que traíssem ou causassem danos à nação a partir da divulgação ou vazamento de informações que expusessem alguma vulnerabilidade do Estado, para beneficiar o inimigo. Essa lei foi nomeada de Espionage Act.
A Lei de Espionagem ainda é utilizada pelo governo americano devido à sua descrição ampla e abstrata do que se configura uma violação da lei. A primeira vez que a Lei de Espionagem foi usada além de seu propósito original foi durante a presidência de Richard Nixon, com a condenação de Daniel Ellsberg, responsável por vazar informações cruciais sobre a atuação brutal dos EUA no Vietnã, conhecidas como Pentagon Papers.
Os Estados Unidos seguem se valendo da prática de espionagem, embora não concordem quando é contra eles.
Um dos casos mais recentes de um indivíduo acusado por essa lei é o caso de Julian Assange. O site WikiLeaks, fundado por ele, tinha o objetivo de publicar documentos confidenciais vazados por whistleblowers que fossem relevantes para o público. Em 2010, a primeira publicação que impactou o cenário global foi o vazamento de documentos oficiais sobre a atuação das forças norte-americanas no Iraque e Afeganistão. Esses documentos revelaram a brutalidade e o uso imoral da força contra civis iraquianos e afegãos, resultando na morte de pessoas inocentes, muitas delas vítimas de tortura.
Além dessa publicação, também se tornaram públicos os e-mails de Hillary Clinton durante a campanha eleitoral de 2016 para a presidência. Esse caso teve um grande impacto no resultado das eleições, sendo um dos fatores que contribuíram para a vitória de Donald Trump. Em 2017, foram vazados documentos sobre os métodos de hacking utilizados pela CIA, conhecidos como Vault 7. Esses vazamentos causaram um embaraço ao governo americano ao expor a vulnerabilidade de seu sistema de segurança nacional. Em 2018, durante a administração Trump, Assange foi indiciado por dezoito acusações criminais, sendo dezessete delas referentes ao descumprimento do Espionage Act. A grande controvérsia em torno do indiciamento de Assange é o fato de que o jornalista somente tornou públicas as informações que foram vazadas por terceiros, o que entra em conflito com a primeira emenda da Constituição dos Estados Unidos, que defende a liberdade de imprensa como um dos principais pilares do país.
Neste ano, Donald Trump foi indiciado pelo sistema judicial sob a acusação de violação da Lei de Espionagem. No entanto, diferentemente de Assange, essa acusação foi devido ao ex-presidente não ter devolvido documentos governamentais confidenciais dentro do prazo estipulado. Em uma operação realizada em agosto de 2022, treze mil documentos foram encontrados na casa de férias de Trump em Mar-a-Lago, onde mais de 325 desses arquivos foram identificados como confidenciais. De acordo com a Lei de Espionagem, manter em sua posse documentos confidenciais que possam comprometer a segurança nacional e se recusar a entregá-los é considerado um crime federal. Mais do que isso, foi confirmado que, durante os anos de 2021 e 2022, o ex-presidente discutiu abertamente o conteúdo confidencial desses documentos com terceiros, o que pode ser visto como uma ameaça direta.
Por outro lado, os Estados Unidos seguem se valendo da prática de espionagem, embora não concordem quando é contra eles. Documentos vazados do Pentágono mostram a capacidade abrangente de Washington em alertar a Ucrânia, com grande precisão, sobre os ataques planejados por Moscou. Mais recentemente, os EUA revelaram como o general russo Sergei Surovikin, vice-comandante das operações militares russas na Ucrânia, soube de antemão da tentativa de golpe de Yevgeny Prigozhin e do grupo Wagner contra Putin. A questão agora é saber se os EUA agirão contra Trump com o mesmo rigor que agem contra a Rússia ou contra Assange.
Giulia Sayuri Barros Sumizawa é acadêmica do curso de Relações Internacionais da Universidade Positivo (UP) e membro do Observatório Global; João Alfredo Lopes Nyegray é doutor e mestre em Internacionalização e Estratégia. Especialista em Negócios Internacionais. Advogado, graduado em Relações Internacionais. Coordenador do curso de Comércio Exterior e do Observatório Global da Universidade Positivo (UP).
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