No dia 4, o governo brasileiro anunciou o adiamento, para abril, da volta da exigência de vistos para turistas norte-americanos, canadenses e australianos, revertendo decisão do início do governo de Jair Bolsonaro, em 2019, e que também incluía os japoneses – no entanto, como o Japão acabou abolindo a exigência para os brasileiros em setembro do ano passado, vale a reciprocidade, ao menos até o fim de setembro de 2026. O fim da isenção de vistos foi definido por Lula em março de 2023 e deveria ter ocorrido em 1.º de outubro, mas havia sido remarcado para 10 de janeiro deste ano; neste novo adiamento, o governo alegou que não seria conveniente efetuar uma mudança dessa ordem no meio da alta temporada turística, e que ainda é preciso concluir o sistema de vistos.
O setor de turismo é um dos que pressionam o governo a seguir isentando da necessidade de visto os visitantes de países ricos, enquanto o Itamaraty defende a reciprocidade – exigir o visto de quem faz o mesmo com os brasileiros, e dispensá-lo no caso dos países que não nos impõem esta regra. Há argumentos bons de ambos os lados. Em defesa da isenção hoje em vigor, pode-se alegar que a reciprocidade não faria sentido, já que as políticas migratórias de Estados Unidos, Canadá e Austrália em relação aos brasileiros são pautadas pela questão da imigração ilegal, enquanto não se vê norte-americanos, canadenses e australianos ambicionando uma vida como imigrantes ilegais no Brasil. Além disso, o número de visitantes desses três países em 2023 de fato cresceu na comparação com 2018, o último ano em que vigorou a exigência do visto e a melhor comparação possível, já que os números de 2020 a 2022 foram distorcidos pela pandemia de Covid-19.
Por que o Brasil, um país com inúmeras belezas naturais, históricas e culturais, e um povo com fama de alegre e acolhedor, é tão pouco visitado por estrangeiros – inclusive os de países europeus, que já não precisam de visto há muito tempo?
No entanto, em defesa da reciprocidade, pode-se dizer que ela ainda é a prática corrente nas relações internacionais – não apenas no setor de turismo, mas em vários outros, como no caso de tarifas de comércio exterior –, e que abrir mão dela deixaria o Brasil sem arma alguma na tentativa de convencer os governos dos demais países a abolir o visto para brasileiros. O fato de o Japão ter concordado em retirar sua exigência de visto para brasileiros, quando já estava definido que Lula revogaria as isenções decretadas por Bolsonaro, pode ser invocado em defesa da política de reciprocidade como forma de conseguir os resultados desejados.
No entanto, a discussão sobre o visto apenas arranha o verdadeiro problema: por que o Brasil, um país com inúmeras belezas naturais, históricas e culturais, e um povo com fama de alegre e acolhedor, é tão pouco visitado por estrangeiros – inclusive os de países europeus, que já não precisam de visto há muito tempo. A mera distância não explica tudo; países do Sudeste Asiático, tão ou mais distantes de Europa e América do Norte, superam o Brasil tranquilamente em número de visitantes estrangeiros: enquanto o Brasil recebeu 6,4 milhões de visitantes em 2019, segundo a Organização Mundial do Turismo (os dados de 2023 ainda não estão fechados), a Tailândia recebeu 39,8 milhões; a Malásia, 26,1 milhões; o Vietnã, 18 milhões. Caso alguém observe que estes países estão próximos de um gigante como a China, podemos responder que em 2019 também a Argentina teve mais visitantes estrangeiros que o Brasil, com 7,4 milhões.
Um país que, além de cheio de riquezas, ainda oferece um ótimo custo-benefício para quem vive em países com moedas fortes como o dólar e o euro deveria receber muito mais visitantes; em vez disso, mantém seu potencial turístico subaproveitado, desperdiçando as oportunidades de uma indústria trilionária – em 2022, ainda um ano de pandemia, o turismo movimentou US$ 7,7 trilhões, ou 7,6% do PIB global. Com ou sem visto, o turista estrangeiro que desembarca por aqui acaba obrigado a conviver com uma infraestrutura de transporte ainda precária – mesmo cidades norte-americanas que não são grandes centros turísticos têm aeroportos que rivalizam com Guarulhos ou Galeão –, a pouca proficiência dos brasileiros em outros idiomas e problemas crônicos de segurança pública. Sem atacar esses problemas, o mundo inteiro poderá ficar isento de visto para entrar no Brasil, e ainda assim seguiremos muito abaixo daquilo que o país poderia ser, uma potência turística capaz de rivalizar com qualquer nação do planeta.
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