Com um IPCA ligeiramente acima das estimativas de mercado em julho, a inflação acumulada nos últimos 12 meses já voltou ao limite máximo de tolerância da meta atual, que é de 3%, podendo variar até 1,5 ponto porcentual para cima ou para baixo. O 0,38% do mês passado deixou o IPCA acumulado em exatos 4,50% - apenas três meses atrás, em abril, o indicador estava em 3,69%, voltando a crescer a partir de maio. A julgar pela mais recente Pesquisa Focus, o mercado financeiro ainda espera que a inflação feche o ano ligeiramente mais comportada que hoje, em 4,20%; no entanto, a mesma sondagem mostra que há uma deterioração das expectativas: a mediana das previsões na semana anterior era de 4,12%, e de 4% quatro semanas atrás.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, minimizou o IPCA acumulado no limite máximo do atual regime de metas, afirmando que o resultado era esperado “em função do que está acontecendo no mundo”, mas que era preciso “acompanhar com calma” porque “tem muita coisa para acontecer neste ano ainda sobretudo no cenário internacional” – como se o verdadeiro problema não fosse doméstico, causado pelo governo de que Haddad faz parte e que não se mostra capaz de controlar seus gastos. “Tivemos boas notícias em relação à cesta básica, preço de alimentos”, afirmou o ministro – de fato, o grupo Alimentação e Bebidas teve deflação de 1% em julho, e o IPCA do mês foi puxado especialmente pela gasolina e pelas passagens aéreas, que responderam por 0,16 e 0,11 ponto porcentual respectivamente. Mesmo assim, o grupo ainda tem inflação acumulada em 12 meses acima do índice cheio, assim como os serviços e os preços monitorados – estes últimos acumulam alta de 7,04% em um ano.
O discurso de Galípolo envia bons sinais, mas não garante que essa será a prática do BC quando seu presidente e a maioria dos seus diretores tiverem sido indicados por Lula
Haddad ainda aproveitou para lançar farpas em direção ao Banco Central, que tem mantido a Selic em 10,5% ao ano, afirmando que a autoridade monetária “não vai corrigir a inflação de 2024 aumentando os juros” – se a forma é mais diplomática que aquela normalmente adotada por seu chefe, o presidente Lula, o conteúdo é o mesmo. Alguém poderia lembrar ao ministro que o governo também não vai ajudar a controlar a inflação de 2024 gastando como agora, mas uma resposta bem mais eloquente veio do antigo “número 2” do ministério de Haddad. No dia 8, Gabriel Galípolo, diretor de Política Monetária do BC indicado por Lula e favorito a suceder Roberto Campos Neto, falou da necessidade de os novos diretores “conquistarem credibilidade perante a sociedade”, manifestou desconforto com o nível atual da inflação e disse que um diretor do BC não pode ter medo de elevar os juros se julgar necessário.
A fala foi vista como dura – “hawkish”, no jargão dos investidores – e levou a uma elevação nos juros futuros, havendo inclusive quem creia que a Selic terminará o ano acima do patamar atual. Na outra ponta, a sinalização de postura firme no combate à inflação ajudou a puxar o dólar para baixo, depois do salto recente causado por números preocupantes nos Estados Unidos; a cotação pode recuar ainda mais depois dos dados da inflação norte-americana, que vieram abaixo do esperado e abriram perspectivas para uma redução nos juros pelo Fed.
O discurso de Galípolo envia bons sinais, mas não garante que essa será a prática do BC quando seu presidente e a maioria dos seus diretores tiverem sido indicados por Lula, até porque há nomes ainda a escolher e o petista pode estar à procura de seu Alexandre Tombini, que conduziu um ciclo artificial e insustentável de redução voluntarista de juros no governo Dilma Rousseff. Se o governo continuar a não fazer sua parte na política fiscal, só restará o BC para controlar a inflação; uma política monetária leniente, ao gosto de Lula, doerá no bolso de todos os brasileiros, especialmente dos mais pobres.
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