O ex-presidente, ex-presidiário, ex-condenado e candidato à Presidência da República Lula continua empenhado em reescrever o passado recente do Brasil no grito. Duas afirmações recentes são a mais nova tentativa de recontar a história da Operação Lava Jato e do impeachment de Dilma Rousseff. No primeiro caso, Lula quer transformar a mais bem sucedida operação de combate à corrupção já ocorrida no país – ao menos até os processos chegarem ao Supremo Tribunal Federal – em uma trama de juízes e procuradores para prejudicar o PT e a indústria nacional; no segundo caso, o petista quer transformar uma justa punição a uma presidente que brincou com o orçamento em uma vingança de ricos inconformados.
“Eu sonhava que o Brasil tivesse a terceira maior indústria petroquímica do mundo e queria que a Braskem fosse essa grande empresa. Apareceu a Lava Jato para destruir a Braskem. Em nome de quem? De um fedelho chamado Dallagnol, que encheu a cabeça de vocês de mentira, que conseguiu criar um mundo de mentiras”, afirmou Lula na Fiesp, em 9 de agosto, pretendo encher de mentiras a cabeça daqueles que o ouviam na ocasião. Afinal, as delações premiadas de executivos da Odebrecht e da Braskem, o acordo de leniência assinado pela petroquímica e o conjunto probatório levantado pela Lava Jato mostrou bem como é que Lula quis fazer da Braskem uma “grande empresa”.
As histórias da “Lava Jato destruidora de empresas” e do “impeachment como vingança da elite” não resistem à exposição pura e simples da verdade, mas Lula e o petismo insistem nelas, na esperança de fazer colar a mentira à base da repetição incessante
Os próprios Emílio Odebrecht e Pedro Novis – que comandaram a Odebrecht, dona da Braskem, entre 1991 e 2009 – explicaram detalhadamente à Lava Jato como Lula, uma vez eleito presidente, passou a tomar várias decisões favoráveis à Braskem como “agradecimento” pelo apoio financeiro dado às campanhas de 2002 e 2006, a ponto de os interesses da empresa terem sido colocados à frente dos da estatal Petrobras. A petroquímica, em seu acordo de leniência com a Advocacia-Geral da União e a Controladoria-Geral da União (CGU), concordou em devolver R$ 2,8 bilhões referentes a “pagamentos de dano, enriquecimento ilícito e multa no âmbito de contratos fraudulentos envolvendo recursos públicos federais e de edição de atos normativos produzidos a partir de pagamentos de vantagens indevidas”. José Carlos Grubisch, ex-presidente da Braskem, se declarou culpado diante de um tribunal norte-americano e foi condenado a prisão e multa em outubro do ano passado; ele admitiu ter desviado US$ 250 milhões para pagar suborno a partidos políticos e funcionários públicos no Brasil. Mas tudo isso, para Lula, não passa de “mentiras” produzidas por Dallagnol.
A arrogância de quem depredou o Brasil e jamais terá de pagar por isso novamente teve sua sequência no primeiro comício de Lula, uma vez aberto o prazo para a campanha eleitoral de 2022. Em Belo Horizonte, nesta quinta-feira, dia 18, o petista disse que “Vocês deram o golpe na Dilma porque a empregada doméstica tinha carteira assinada, porque os adolescentes [pobres] estavam nas universidades”, em referência à PEC das Domésticas, aprovada pela Câmara em 2012 e pelo Senado em 2013, e ao ProUni, criado em 2005. O petista, obviamente, não menciona que a PEC das Domésticas nem foi proposta pelo seu partido, mas por um parlamentar do então PMDB, e passou pelo Congresso com apoio de todos os partidos, inclusive os de oposição ao governo Dilma.
E o principal: Lula esconde que Dilma sofreu o impeachment por ter cometido uma série de crimes de responsabilidade, maquiando o orçamento, atrasando repasses e retendo valores destinados à Caixa, ao FGTS e ao BNDES, editando decretos de abertura de crédito suplementar sem autorização – todos atos que violavam a lei orçamentária e se encaixavam à perfeição na legislação que define as práticas que devem ser punidas com a cassação do mandato. Que Dilma tenha levado o Brasil à pior recessão da história e fosse conhecida por sua dificuldade em trabalhar com o Congresso pouco importa: o impeachment não foi uma orquestração política destinada a remover uma gestora inocente, mas a correta aplicação da Constituição contra quem transformou orçamentos em peças de ficção, enganando todo um país sobre a situação das contas públicas.
Nenhum dos temas de Lula é novo: a Lava Jato ainda estava em curso quando o petismo começou a afirmar que as investigações estavam “destruindo a indústria nacional”, e houve até quem tivesse responsabilizado a operação pelas quedas no PIB. Da mesma forma, praticamente desde o início de seu governo o ex-presidente dizia ser perseguido pela elite por “feitos” como permitir aos pobres viajar de avião – como se empresários não vissem com bons olhos a ascensão social de dezenas de milhões de brasileiros, que se tornariam consumidores dos bens e serviços que oferecem. Ambas as histórias não resistem à exposição pura e simples da verdade, mas Lula e o petismo insistem nelas, na esperança de fazer colar a mentira à base da repetição incessante – e o fato de infelizmente tais narrativas serem aceitas por parte da sociedade deixaria Joseph Goebbels orgulhoso.
O que Lula segue espalhando é uma total inversão de valores, na qual quem “destrói” empresas não são os corruptores e corruptos, mas aqueles que investigam os crimes cometidos; e na qual uma presidente perde seu mandato não por irregularidades reais, mas por mera sede de vingança. Bandidos e maquiadores de orçamento se transformam em vítimas inocentes, enquanto aqueles que fizeram justiça, seja investigando e punindo os ladrões do petrolão, seja aplicando a Constituição e cassando Dilma, se tornam os vilões. É o império da mentira, que o petismo pretende elevar a política de Estado caso tenha sucesso em outubro.
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