Com a popularidade em queda – queda livre, alguns haverão de dizer – e a inflação devorando o poder aquisitivo do brasileiro mais pobre, aquele que não tem os meios de se proteger da elevação nos preços, o presidente Lula dá mostras de que fará exatamente aquilo que mais se temia: apostar em mais irresponsabilidade econômica para tentar conseguir resultados de curto prazo enquanto sacrifica de vez o médio e longo prazo. Empurrado pelo ministro-marqueteiro Sidônio Palmeira, e contando até com a ajuda do ministro Fernando Haddad, Lula promete mais gastos, planeja mais incentivo ao consumo, e garante que as leis da economia são balela.
Na noite de segunda-feira, no primeiro de uma série de pronunciamentos em cadeia nacional de rádio e televisão que devem se tornar periódicos – ao menos é o que sugeriu Palmeira –, Lula requentou anúncios sobre dois programas sociais, o Farmácia Popular e o Pé-de-Meia. No primeiro caso, o presidente só repetiu o que a (agora ex-)ministra da Saúde, Nísia Trindade, já havia anunciado: “a gratuidade de 100% dos remédios” e “a oferta de fraldas geriátricas. Tudo de graça”. Já em relação ao Pé-de-Meia, o programa que tinha tudo para render a Lula um processo por crime de responsabilidade até que o Tribunal de Contas da União propusesse um “jeitinho”, Lula disse que um primeiro depósito de R$ 1 mil na conta dos estudantes aprovados em 2024 ocorreria nesta terça-feira.
Colocar dinheiro na mão das pessoas para que elas, consumindo, façam a economia girar é algo que adianta pouco se o dinheiro perde valor constantemente
Enquanto isso, o governo planeja uma medida provisória que pode, de imediato, colocar mais alguns bilhões de reais na economia, destravando o FGTS de trabalhadores que optaram pelo saque-aniversário e que, na demissão sem justa causa, não puderam sacar o saldo restante, recebendo apenas os 40% de multa – uma regra que estava prevista e da qual o trabalhador era avisado quando da adesão ao saque-aniversário. Pode-se discutir se a própria ideia do saque-aniversário, criado em 2020, durante o governo de Jair Bolsonaro, já não era uma forma de injetar na economia recursos que de outra forma ficariam parados, em meio à crise econômica da pandemia; também se pode discutir se era justo tirar de quem escolheu essa modalidade o direito ao saque-rescisão no momento da demissão, quando o trabalhador mais precisa de dinheiro – é possível argumentar que o fato de o demitido receber um FGTS menor na rescisão, por ter feito saques anteriores, já seria “castigo” suficiente. Fato é que um dos defensores da mudança, o presidente da CUT, afirmou que o objetivo é mesmo permitir ao trabalhador “usar esse recurso para pagar contas, consumir e, assim, injetar mais dinheiro na economia”.
Que mais dinheiro circulando sem um respectivo aumento na produção provoca inflação é algo conhecido ao menos desde um surto de hiperinflação observado no Império Romano, em fins do século 3.º d.C. – ou, mais recentemente, aos processos inflacionários observados na Europa das Grandes Navegações, com a abundância de metais preciosos da América. Mas, para Lula, isso não passa de “bobagem da macroeconomia”, na qual não devemos acreditar, como disse o presidente nesta segunda-feira, em Rio Grande (RS), prometendo para este ano um crescimento maior que o previsto até agora. O petista voltou a repetir a falácia do “pobre não consome dólar” e, basicamente, defendeu que basta colocar dinheiro na mão das pessoas para que elas, consumindo, façam a economia girar. Ele só se esqueceu de que isso adianta pouco se o dinheiro perde valor constantemente e se a economia está superaquecida, rodando muito acima de sua capacidade, como vem alertando constantemente o Banco Central.
No mesmo dia, o ministro da Fazenda fazia coro com Lula, afirmando que, “se o Brasil não crescer, não existe ajuste fiscal possível”, praticamente invertendo o bom preceito segundo o qual uma economia em ordem do ponto de vista fiscal é meio caminho andado para um crescimento sólido e duradouro. E, aqui, o produto depende diretamente da ordem dos fatores. Forçar um crescimento artificial baseado em expansionismo fiscal é contratar uma crise futura que exigirá um ajuste fiscal muito mais forte, como bem estão descobrindo os argentinos. Que um ministro capaz de dizer algo assim seja considerado o “mais responsável” dos integrantes do atual governo só confirma que o país está na mão de verdadeiros terraplanistas econômicos.