Quando o mercado e a sociedade se alarmam com a demissão de um executivo de estatal que nem deveria ter assumido o cargo e nunca foi exatamente pró-mercado, isso é um sinal nada animador. Jean Paul Prates, que comandava a Petrobras desde o início do terceiro mandato de Lula, foi demitido pelo presidente da República na noite de terça-feira, surpreendendo os analistas – mais pelo momento que pela decisão em si. Mas, ainda que houvesse bons motivos que pudessem justificar sua saída, eles não tiveram relação alguma com a decisão de Lula; as razões pelas quais a cabeça de Prates rolou têm tudo para fazer com que sua passagem pela Petrobras acabe lembrada pela expressão “ruim com ele, pior sem ele”.
Prates, verdade seja dita, nem poderia ter sido nomeado para a Petrobras. No início de 2023, ele ainda detinha mandato de senador, e por isso estava sujeito às vedações previstas na Lei das Estatais – vedações estas derrubadas liminarmente por Ricardo Lewandowski em março do ano passado e restabelecidas agora pelo plenário do STF, com direito a uma gambiarra jurídica que validou as nomeações contra legem feitas por Lula enquanto vigorou a liminar. À frente da petrolífera, Prates se empenhou em desfazer boa parte do esforço saneador que antecessores seus haviam levado a cabo para recuperar a estatal da depredação moral e financeira provocada pelo petismo e desvendada pela Operação Lava Jato.
A única razão para que analistas lamentem a saída de um presidente da Petrobras que acabou com a PPI e determinou o retorno de políticas nocivas para a companhia é o fato de Prates ter se tornado um “mal menor” em comparação com quem deve sucedê-lo
Em maio de 2023, Prates anunciou o fim da política de Preço de Paridade de Importação (PPI), substituída por uma combinação obscura entre preços do petróleo no mercado internacional e outros critérios vagamente definidos e que poderiam dar margem a intervencionismos. Sob a batuta de Prates, a Petrobras reverteu as políticas de desinvestimento pelas quais a empresa priorizaria a exploração e a produção de petróleo, atividades mais lucrativas e nas quais a estatal se destaca; a venda de refinarias foi interrompida ou anulada, e até mesmo a Abreu e Lima, um sorvedouro de dinheiro nascido de uma camaradagem entre Lula e o regime chavista venezuelano, teve suas obras retomadas. Além disso, a estatal ressuscitou políticas protecionistas de conteúdo local para privilegiar a indústria naval brasileira.
Tudo isso estava alinhado com os planos do Planalto para a Petrobras, mas não foi suficiente. Prates divergiu de Lula e do ministro Alexandre Silveira, de Minas e Energia, em temas como a distribuição de dividendos extraordinários, a intervenção em preços de querosene de aviação para ajudar empresas aéreas e o aproveitamento de gás natural extraído no pré-sal; o próprio Prates atribuiu sua demissão à pressão de Silveira e de outro ministro, Rui Costa, da Casa Civil. E a única razão para que analistas sejam quase unânimes em lamentar a saída de um presidente da Petrobras que acabou com a PPI e determinou o retorno de políticas nocivas para a companhia é o fato de Prates ter se tornado, subitamente, um “mal menor”, como o barítono desafinado da piada que, vaiado pela plateia, diz “se estão me achando ruim, esperem só pelo tenor”.
Magda Chambriard, engenheira e ex-funcionária de carreira da Petrobras, foi escolhida para suceder Prates e deve ter seu nome aprovado em breve pelo Conselho de Administração. Ela foi diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP) entre 2012 e 2016, no governo de Dilma Rousseff – a ex-presidente endossou o nome, que também teve o apoio do ministro Rui Costa e do ex-presidente da Petrobras Sérgio Gabrielli. Seu perfil é bem mais alinhado com os objetivos que Lula e Silveira têm para a estatal, dentro do chamado “desenvolvimentismo”, que enxerga a empresa como subordinada a um plano maior de desenvolvimento nacional determinado pelo governo, como descreveu Lula recentemente.
A perspectiva, portanto, é de que o intervencionismo estatal na administração da Petrobras, que já existia na gestão de Prates, seja intensificado com Magda Chambriard; ela inclusive assume ciente de que, se não cumprir à risca a vontade do chefe, terminará como seu antecessor. Mas, a julgar por suas declarações e textos, seguir fielmente a vontade de Lula não será um problema para a escolhida, que topará ser a CEO no papel para que, na prática, o dono da Petrobras esteja no terceiro andar do Palácio do Planalto.
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