
Desde abril deste ano, o presidente norte-americano, Donald Trump, tem causado confusão no comércio global com a imposição de tarifas sobre as importações de produtos estrangeiros para os Estados Unidos. Ele alega que outros países, ao importar produtos dos EUA, cobram tarifas maiores que as impostas pelos Estados Unidos sobre importações feitas pelos norte-americanos, e que pretendia diminuir as importações, reduzindo o déficit na balança comercial, e recuperar o parque industrial norte-americano, para evitar novos casos como o de Detroit, símbolo da indústria automobilística norte-americana, mas que se tornou uma “cidade fantasma” com o fechamento de fábricas, incapazes de competir com os carros japoneses, menores, mais econômicos e mais baratos.
O caso brasileiro, no entanto, foi peculiar, pois não envolveu apenas questões econômicas. Em 9 de julho, Trump enviou uma carta pública ao presidente Lula informando a imposição de uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros, e que começaria a vigorar em agosto. Como razões para a elevação, Trump alegava o processo e julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro, que Trump diz ser uma vergonha internacional e uma “caça às bruxas”; o que ele chamou de “ataques insidiosos do Brasil contra eleições livres e a violação fundamental da liberdade de expressão dos americanos, como demonstrado pelo Supremo Tribunal Federal do Brasil ao emitir centenas de ordens de censura secretas e ilegais a plataformas de mídia social dos Estados Unidos”; violações de direitos humanos; e perseguição a adversários políticos.
No campo da economia, Trump fez uma afirmação falsa – a de que os Estados Unidos tinham déficit na balança comercial com o Brasil –, alegou que o relacionamento comercial entre EUA e Brasil está longe de ser recíproco, e que os 50% de tarifa são menos do que seria necessário para haver igualdade de condições no comércio entre os dois países. A carta de Trump ainda avisava que, se o Brasil decidisse aumentar tarifas sobre importação oriundas dos Estados Unidos, o valor da elevação brasileira seria adicionado aos 50% que eles cobrarão sobre compras oriundas do Brasil. A carta terminava dizendo que, se o Brasil desejar abrir seus mercados comerciais para os Estados Unidos e eliminar as tarifas, políticas não tarifárias e barreiras comerciais, o governo norte-americano poderia considerar um ajuste na carta.
Adotar a reciprocidade quando todas as outras alternativas se esgotaram, sem sucesso, é uma coisa; partir para o revide com negociações ainda em curso, e sem disposição alguma para conversas bilaterais, é outra
Igualmente peculiar foi a reação brasileira. Enquanto praticamente todos os demais países e blocos econômicos procuraram Trump para negociar reduções nas tarifas – até mesmo a China, que inicialmente entrou em uma guerra tarifária intensa, com sobretaxas que ultrapassavam 100%, estabeleceu entendimentos provisórios com os EUA –, Lula usou o período decorrido entre 9 de julho e 1.º de agosto para fazer chacotas e assacar críticas ao presidente Trump, em vez de adotar a saudável postura política de distensionar o ambiente e estabelecer conversações em bases civilizadas com o governo norte-americano. O comportamento de Lula, seu governo e seu partido, o PT, foi desprezível especialmente porque o Brasil vem acumulando uma sucessão de posturas negativas e ofensivas à nação americana: defesa do abandono do dólar como moeda de comércio exterior, posição crítica a Israel e favorável ao Hamas, ao Irã e a Nicolás Maduro, além de outros atos significativos de afastamento da aliança entre Brasil e Estados Unidos.
Em vez de estabelecer um diálogo conciliador e uma postura de negociação pacífica, Lula resolveu contra-atacar, e tornou o ambiente negocial mais tenso ao aprovar o início de um processo de aplicação da Lei de Reciprocidade. A finalidade de uma lei como essa é estabelecer condições iguais e paridade de armas no jogo do comércio internacional, mas trata-se de um instrumento que, quando estabelecido em ambiente conflitivo por falta de entendimento, pode provocar uma sequência de ação e reação que acaba por prejudicar a todas as partes. As medidas em estudo incluem critérios para a suspensão de concessões comerciais, de investimentos e de obrigações relativas a direitos de propriedade intelectual, em resposta a medidas unilaterais por país ou bloco econômico.
O conflito entre os dois países tem tudo para se intensificar. Lula não quer negociar com Trump; o conflito lhe dá oportunidade para discursos vazios sobre “soberania”, mas que servem para estancar a sangria em seus índices de popularidade. Tudo o que o Brasil tem conseguido em termos de exceções se deve à pressão de setores da própria economia norte-americana ou da iniciativa de grupos atingidos – agronegócio, indústria e mineração já enviaram representantes aos Estados Unidos para apresentar seus argumentos. Além disso, o Brasil acionou a Organização Mundial do Comércio contra o tarifaço, e o processo ainda está em suas fases iniciais. Adotar a reciprocidade quando todas as outras alternativas se esgotaram, sem sucesso, é uma coisa; partir para o revide com negociações ainda em curso, e sem disposição alguma para conversas bilaterais, é outra, um erro gravíssimo que custará caro ao país.
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No mundo moderno, onde a tecnologia e as inovações se desenvolvem de forma acelerada, a melhor política para um país pobre e atrasado é a adoção dos princípios liberais nas relações com o mundo desenvolvido, não o conflito. O liberalismo tem como base a defesa da liberdade de empreender, investir, contratar, comprar e vender sob leis gerais que sejam normas de conduta justa, impessoais, prospectivas (no sentido de serem aplicáveis a número desconhecido de casos futuros) e iguais para todos. A economia livre de mercado tem como base a submissão dos negócios à lei da oferta e da procura, ao sistema livre de preços, à organização empresarial da produção, ao livre mercado de trabalho e ao direito de propriedade privada.
Incurso na filosofia liberal está o livre comércio nas relações internacionais, no sentido de que as nações devem ser livres para realizar trocas comerciais de bens e serviços, incluindo trocas de tecnologias, inventos, inovações patentes e sistemas em geral, sob um regime de normas tributárias, barreiras não tarifárias, direitos autorais e compromissos vinculados às regras de comércio exterior. Assim, o funcionamento desse sistema requer que as nações parceiras não recorram ao protecionismo em forma de barreiras tributárias, alfandegárias e sanitárias fora de acordos válidos, como tem acontecido em muitos casos, pois a competição deve se dar no campo da eficiência e da produtividade, sob regras pactuadas.
Em matéria econômica, nações têm interesses por vezes conflitantes, cuja compatibilização deve se dar no âmbito de acordos bilaterais negociados pacificamente. Quando no curso de divergências surgem conflitos de interesses, as agressões verbais direcionadas aos países parceiros e seus governantes servem para agravar a situação e se voltam contra o povo e a economia nacional, cujas perdas são maiores para os países atrasados e com baixo nível de desenvolvimento tecnológico. Essa é a situação do Brasil.



