O recenseamento feito em 2010 pelo IBGE recebeu bastante atenção: por ter utilizado modernas tecnologias de informação, por se referir à primeira década do século 21, pelo rico banco de dados produzido e por ser o último ano do segundo mandato de Lula como presidente da República. Com base nos dados obtidos, os economistas Fabio Giambiagi e Claudio Porto, profissionais tecnicamente preparados, coordenaram a elaboração do livro 2022 – Propostas para um Brasil melhor no ano do Bicentenário, publicado em 2011, que se tornou um documento importante e rico em informações, análises e previsões sobre o país no aniversário de 200 anos desde a independência, em 2022.
Algumas previsões feitas no livro chamaram a atenção e passaram a servir de base para a tomada de decisões pelo governo na elaboração de políticas públicas, além de ser um guia para as decisões de investimento no setor privado. Destacava-se naquele momento a previsão sobre a mudança radical, e até certo ponto surpreendente, na pirâmide demográfica brasileira, principalmente a redução de 6,5 milhões de crianças na faixa dos 5 aos 14 anos, que passaria de 34,1 milhões em 2010 para 27,6 milhões em 2022. Também chamava a atenção a projeção da população com idade de 60 anos ou mais, que deveria aumentar em 11,4 milhões de pessoas, passando de 19,3 milhões em 2010 para 30,7 milhões em 2022.
O mundo não tem experiência de ver um país que era pobre e enriqueceu depois de envelhecer; parece razoável concluir que o Brasil não será o primeiro a realizar tal proeza
O ano de 2022 chegou no momento em que o país começava a sentir algum alívio, com a pandemia da Covid-19 caminhando para o fim, após dois anos de isolamento social duríssimo. A pandemia inviabilizou a realização do Censo 2020, que acabou sendo feito em 2022, justamente no ano do bicentenário da independência. Com alguma variação, confirmou-se a tendência projetada sobre a composição da população, principalmente o número de brasileiros entre 5 e 14 anos e acima de 60 anos. Neste início de segundo semestre de 2023, um dado surpreendente foi divulgado pelo IBGE em relação à população total do país, abrindo espaço para alguma confusão. O IBGE vinha estimando que a população já havia atingido 214 milhões no fim de 2021 e, após revisões a partir de dados do Censo 2022, o IBGE anunciou que a população era de 203,1 milhões no fim de 2022 – portanto, bem menor do que a estimativa anterior.
De qualquer forma, seja pela redução da taxa de crescimento da população total ou pela redução da população de crianças e aumento de idosos, a pirâmide etária brasileira impõe modificações expressivas na vida econômica e social do país, fazendo que os responsáveis pela condução do governo na União, nos estados e nos municípios se obriguem a lidar com tal fenômeno e adequar as políticas públicas em todos os níveis. O Brasil tem sérios problemas econômicos e políticos de curto prazo e não tem conseguido crescimento sustentável capaz de tirar o país do subdesenvolvimento e reduzir a pobreza. Porém, os recursos naturais abundantes, a autossuficiência alimentar, a autossuficiência energética, a maior reserva per capita de água limpa do mundo, o território imenso e as terras férteis fazem que os fundamentos estruturais sejam positivos e com capacidade para propiciar crescimento econômico, desenvolvimento social, eliminação da miséria, redução da pobreza e saída do clube dos países subdesenvolvidos.
Em 2010, já se sabia que entre os principais fatores impeditivos do crescimento estavam a infraestrutura física (insuficiente, envelhecida e atrasada em termos tecnológicos) e o baixo nível educacional médio da população. O Brasil é uma prova eloquente de que o nível educacional de um povo e sua qualificação para o trabalho na moderna economia não têm conexão nenhuma com a quantidade de títulos e diplomas outorgados, pois a quantidade de diplomas e certificados emitidos é enorme, mas não elevou o nível educacional (que continua sofrível) nem a qualificação profissional (que continua insuficiente). Vale ressaltar que o baixo nível da educação está presente mesmo entre os portadores de títulos e certificados em todos os graus, inclusive na pós-graduação. Isto é, o país tornou-se grande fabricante de títulos e pequeno gerador de educação de qualidade.
Quem consultar o que foi escrito uma década atrás em Brasil 2022 confirmará que, por aqui, não há deficiência de diagnóstico nem falta de compreensão dos problemas e dos gargalos econômicos, políticos, institucionais e funcionais. O que falta é a capacidade para enfrentar os males e as deficiências, de forma que, já caminhando para encerrar 2023 como mais um ano de progresso irrisório ou inexistente, o país corre o risco de, pelas mudanças na pirâmide etária, diminuir ainda mais as perspectivas de sair do atraso.
Se seguir desperdiçando oportunidades e consumindo tempo precioso sem progresso significativo, o Brasil será um caso de nação premiada com fatores e recursos favoráveis ao enriquecimento, mas que não conseguiu atingir o desenvolvimento
Tais mudanças etárias, como previstas naquele livro-relatório, estão inexoravelmente levando o país a jogar fora o bônus demográfico (uma população em idade de trabalhar bastante superior à população de idosos) e perdendo a chance de crescer e se desenvolver. O mundo não tem experiência de ver um país que era pobre e enriqueceu depois de envelhecer; parece razoável concluir que o Brasil não será o primeiro a realizar tal proeza. O provável é que, se seguir desperdiçando oportunidades e consumindo tempo precioso sem progresso significativo, o Brasil será um caso de nação premiada com fatores e recursos favoráveis ao enriquecimento, mas que não conseguiu atingir o desenvolvimento.
Não se trata aqui de determinismo derrotista, mas de alertar a sociedade e o governo que o Brasil precisa fazer uma reflexão e tentar não jogar fora a terceira década deste século, começando pela melhoria das leis, das instituições, dos poderes políticos e do ambiente jurídico. O papel principal da população é não dar trégua aos governantes e demais homens do poder, pois a mediocridade política nacional somente pode ser vencida se a população for firme em, dentro da lei e pacificamente, pressionar, fiscalizar e não reeleger aqueles que não correspondam às demandas do crescimento econômico e do desenvolvimento social.
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