No balanço de seu primeiro ano de mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode colocar mais uma “conquista”: o Brasil conseguiu piorar ainda mais a posição no Índice de Percepção da Corrupção (IPC), divulgado pela ONG Transparência Internacional. De acordo com o levantamento, o Brasil está em 104º lugar entre 180 países avaliados, empatado com Argélia, Sérvia e Ucrânia – que está em guerra com a Rússia. Numa escala de 0 a 100, o país alcançou apenas 36 pontos, abaixo da média global (43 pontos), da média regional para as Américas (43 pontos), da média dos BRICS (40 pontos) e ainda mais distante da média dos países do G20 (53 pontos) e da OCDE (66 pontos).
A reação petista não tardou. A presidente do PT, Gleisi Hoffmann foi às redes sociais para rebater o relatório, ou melhor, tentar desmerecer a Transparência Internacional. Segundo Gleisi, a ONG “passou dos limites” e o relatório “revela apenas a má vontade e a oposição política da ONG a Lula e ao PT”. Mas o que o documento mostra mesmo é a má vontade do lulopetismo em combater a corrupção.
O relatório da Transparência Internacional apenas sintetiza aquilo que boa parte dos brasileiros já percebe e sente na pele.
O relatório alerta que durante 2023, o governo Lula foi incapaz de reconstruir mecanismos de controle da corrupção e, junto deles, do sistema de freios e contrapesos democráticos. Segundo o documento, o governo manteve práticas espúrias já existentes, como o sistema de barganha com o Congresso, através das emendas de relator, e retomou outras, como o loteamento das empresas estatais como a Petrobras, em troca de apoio político.
Tais estratagemas, lembremos, são velhos conhecidos do lulopetismo. Ainda durante o primeiro mandato de Lula, entre 2003 e 2006, a compra pura e simples de votos do Congresso, o mensalão, era prática corrente. Após o esquema ser descoberto, os petistas buscaram outras formas de angariar aliados e as estatais, principalmente a Petrobras, passaram a ser saqueadas em conluio com empreiteiras e partidos da base aliada, por meio da indicação de diretores e gerentes e também das propinas em contratos.
O documento cita ainda a fragilização da independência do Poder Judiciário, com a nomeação do advogado pessoal de Lula, Cristiano Zanin, para a primeira vaga aberta no Supremo Tribunal Federal (STF), que, mesmo sendo indefensável do ponto de vista moral, acabou chancelada pelo Senado, e a escolha de um novo procurador-geral da República, Paulo Gonet, fora da lista tríplice. Ainda no âmbito judiciário, o relatório comenta sobre os problemas de conflitos de interesses e a falta de mecanismos contra a influência do lobby advocatício que trabalha pela “anulação de multas de acordos de leniência de empresas notoriamente condenadas por suas práticas de corrupção”.
A Transparência Internacional não é a primeira a alertar que o Brasil está despencando em relação à integridade de seus poderes e instituições. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) já tinha se mostrado preocupada com os retrocessos no combate à corrupção no país, em especial com o desmonte da Operação Lava Jato. Em outubro do ano passado, a OCDE divulgou um relatório, onde menciona uma decisão monocromática do ministro do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, que anulou todos os atos relacionados com acordos de leniência firmados pela Odebrecht em 2017. A organização afirmou que a decisão deixava dúvidas quando à capacidade de o Brasil atuar em casos de suborno e corrupção que envolvesse também governos e empresas estrangeiras.
Os retrocessos do Brasil em relação ao combate à corrupção e a construção de instituições independentes e fortes é mais do que evidente. O relatório da Transparência Internacional apenas sintetiza aquilo que boa parte dos brasileiros já percebe e sente na pele: a sensação de que o Brasil é o país onde a corrupção compensa é mais forte do que nunca. Mas essa percepção pode ser positiva. Um dos primeiros passos para se mudar uma realidade negativa é reconhecer a existência de um problema. Apenas quando se consegue identificar que algo está errado – no caso brasileiro, “muito errado – torna-se possível encontrar soluções. Mas se o objetivo é manter o mesmo estado de coisas, pode-se simplesmente ignorar aquilo que está sob nossos olhos, e não fazer nada. Ou então fazer como Gleisi Hoffmann, e esbravejar que tudo não passa de “má vontade”.
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