
Quem acompanhou o pronunciamento oficial de Lula exibido em cadeia nacional na noite de 23 de dezembro pôde comprovar que o presidente realmente está em boa forma. Ao menos quando se trata de enumerar mentiras e tentar a todo custo incutir em seus interlocutores a visão fantasiosa de que o Brasil navega em águas calmas e paradisíacas, e que não há qualquer problema no horizonte. No mundo da imaginação – ou cinismo – do presidente petista, estamos em meio a uma economia que só cresce, uma democracia cada vez mais consolidada e um governo “eficiente”, que “cuida de todos” e governa com base no diálogo e harmonia entre os poderes.
Difícil imaginar que os brasileiros que assistem ao dólar disparar e sentem na pele os efeitos da inaptidão completa do governo federal em manter uma política fiscal séria vão concordar com o otimismo de Lula durante o pronunciamento. O fracasso do pacote de corte de gastos – composto muito mais por marketing do que por medidas para frear a gastança sem fim do governo – foi apenas uma amostra do total descompromisso da administração petista com a economia nacional – e, em consequência, com o bolso dos trabalhadores. Não foi sem motivo que o anúncio do desastroso pacote fez o dólar disparar no mercado – o que, claro, na visão do petismo, aconteceu por qualquer outro motivo, menos a incompetência do governo Lula.
No encerramento de seu pronunciamento de três minutos, Lula disse que “estamos colhendo os frutos” da administração petista. Nada mais correto: a ingerência nas contas públicas, a gastança desenfreada, o ambiente de divisionismo político são frutos amargos do petismo
Desde o início do terceiro mandato de Lula, a gastança sem limites foi a norma dentro do governo petista, que sempre empurrou a responsabilidade dos problemas na economia para os outros – Roberto Campos Neto, os empresários, a “Faria Lima”, as fake news. Mais recentemente, até o Google foi interpelado pela Advocacia-Geral da União (AGU) sobre uma suposta "desordem informacional econômica", depois de divulgar a cotação do dólar a R$ 6,38 no feriado de Natal, dia em que não há operações de câmbio no Brasil. Para o governo, o erro do Google poderia “comprometer a eficácia da política pública federal de estabilização cambial” – como se realmente houvesse uma política séria de estabilização cambial em andamento.
Se a economia ainda caminha, é por conta da insistência do setor produtivo, aquele mesmo que frequentemente é alvo de ataques do presidente petista e seus ministros, e que encontra, desde o início do governo petista, muito mais entraves do que estímulos. Segundo o Índice Firjan de Competitividade Global, no primeiro ano do terceiro mandato de Lula, o Brasil regrediu em termos de eficiência do Estado, infraestrutura e ambiente de negócios. Entre 66 países pesquisados, o Brasil ficou na 46ª posição. No quesito “eficiência do Estado”, que avalia controle da corrupção, qualidade dos serviços públicos, respeito aos contratos e funcionamento do Judiciário, o Brasil é ainda pior, amargando o 52º lugar.
Tão falso como o Brasil estável economicamente graças à administração petista é o “governo para todos” mencionado por Lula durante o pronunciamento. Evocando o Natal e os ensinamentos de Cristo, como “a compaixão, a fraternidade, o respeito e o amor ao próximo", Lula fez questão de pregar reconciliação: “Que cada um de nós reconheça no outro o seu semelhante. Que o irmão se reconcilie com o irmão. Que as famílias possam celebrar em comunhão", foram as palavras do petista. Uma mensagem condizente com o espírito natalino, e que certamente poderia render bons frutos se fossem colocadas em prática pelo próprio Lula.
A “reconciliação” petista só existe nos slogans e peças publicitárias. A perseguição desenfreada aos críticos, que inclui o uso da máquina pública para descobrir possíveis opositores, a sanha por controlar o que pode ou não ser dito nas redes sociais, o ódio escancarado contra qualquer um que ousa não compactuar com o petismo, tem sido a regra da administração lulista. Infelizmente, ao contrário do discurso de que “governar é cuidar de todos”, no Brasil sob o petismo parecem existir duas classes de brasileiros: a dos apoiadores e aliados, e todos os demais, a quem nem mesmo as prerrogativas constitucionais são garantidas, como se vê com frequência cada vez mais assustadora.
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Se tivesse realmente alguma vontade de trabalhar pela reconciliação do país, Lula poderia ter incluído no indulto presidencial de Natal os condenados pelos atos de vandalismo às sedes dos Três Poderes. Mas, desde o ano passado, quando concedeu o primeiro indulto de Natal de seu terceiro mandato, o governo petista fez questão de proibir expressamente o perdão presidencial aos presos por crimes contra o Estado Democrático de Direito. Já comentamos neste espaço sobre as inúmeras arbitrariedades nos processos envolvendo os presos do 8 de janeiro, muitos condenados sem individualização das condutas, a penas desproporcionais aos atos que realmente cometeram. A extensão do indulto natalino a essas pessoas seria uma prova de que o governo realmente trabalha pela reconciliação e superação e não pela manutenção do ódio e do divisionismo. Mas, mais uma vez, prevaleceu o ódio e o espírito de vingança petista.
Em meio a tantas inverdades, porém, Lula mencionou pelo menos um fato. No encerramento de seu pronunciamento de três minutos, Lula disse que “estamos colhendo os frutos” da administração petista. Nada mais correto: a ingerência nas contas públicas, a gastança desenfreada, a alta do dólar, a falta de respeito ao Estado Democrático de Direito, o ambiente de divisionismo político são alguns dos frutos amargos do petismo a que os brasileiros são obrigados a desfrutar – e que, se depender de Lula, vão continuar no próximo ano.



