A Itaipu pode, “a qualquer momento”, ter sua nota de risco rebaixada, e ficar negativa, pela agência de classificação S&P Global Ratings. Na prática, a avaliação indica a capacidade que um país ou empresa tem para cumprir com seus compromissos financeiros. Isso estaria sob ameaça na hidrelétrica binacional e não é por falta de dinheiro.
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A situação é decorrente de um bloqueio definido pelo governo paraguaio para o caixa da binacional, travando o orçamento no início deste ano. O governo vizinho pretende forçar uma revisão dos valores pagos pelo Brasil para a aquisição do excedente de energia elétrica da margem paraguaia da usina. Como não utiliza tudo que produz, o Paraguai pode comerciar o excedente, mas exclusivamente com o Brasil por força do Tratado de Itaipu, fixado há 50 anos.
O valor praticado é de US$ 16,71 por kilowatt (kW), mas o presidente Santiago Peña quer superar a marca dos US$ 20. Ele e o presidente Lula (PT) se reuniram na na semana passada para tratar do tema. A reunião foi demorada, mas não houve avanço nas negociações.
O aumento no valor da energia vendida ao Brasil tem sido uma bandeira de Peña desde a campanha eleitoral. Em relatório enviado à usina na semana passada, a agência S&P Global Ratings destaca que “o creditwatch (observação de crédito) negativo reflete a possibilidade de rebaixamento do rating (avaliação) devido aos riscos de atraso na conclusão das negociações entre Brasil e Paraguai, o que, em última instância, poderia prejudicar as operações da empresa”.
Itaipu confirma recebimento do relatório e diz que classificação de risco é provisória e pontual
A Itaipu confirmou o recebimento do relatório da agência de risco e disse entender que a classificação se trata de uma condição momentânea. “A Itaipu confirma a informação. Recebemos o relatório da S&P referente ao rebaixamento e entendemos que este será provisório e pontual devido ao histórico da empresa. Os diretores e conselheiros brasileiros estão buscando todas as medidas possíveis para reduzir os prazos de pagamento e solucionar a questão o mais breve possível”, destaca em nota.
Desde o início do ano, pagamentos a prestadores de serviços, terceirizados e benefícios a colaboradores estão atrasados nas duas margens da hidrelétrica.
O alerta feito pela S&P Global Ratings em relatório enviado à usina considera que o problema não está no caixa em si, já que no fim do terceiro trimestre do ano passado a hidrelétrica tinha US$ 686 milhões. O relatório considera, no entanto, “preocupação”, pois as operações da empresa são vulneráveis às interferências políticas, em referência à decisão de travar o caixa da usina.
Negociações em andamento e desconforto diplomático
As negociações entre Brasil e Paraguai estão sendo coordenadas por representantes dos Ministérios de Relações Exteriores dos dois países. Na semana passada, o Itamaraty afirmou à Gazeta do Povo que mantêm as tratativas bilaterais entre os governos do Brasil e do Paraguai para definição da tarifa, o Custo Unitário dos Serviços de Eletricidade (Cuse) da Usina de Itaipu para 2024.
“O calendário de encontros bilaterais é igualmente objeto das tratativas. Os dois governos têm interesse que se possa alcançar solução mutuamente aceitável no menor prazo possível, em linha com o excelente momento das relações entre Brasil e Paraguai e a importância da usina para a parceria bilateral”, destaca.
O clima diplomático entre os dois países, no entanto, não está entre os mais amistosos. Esta foi a primeira vez que um dos governos bloqueou caixa e orçamento da hidrelétrica, desde a assinatura do tratado há cinco décadas.
A hidrelétrica está sem orçamento aprovado para o ano e com os procedimentos provisórios travados. Isso tem provocado, segundo interlocutores, “desconforto a apreensão”.
A situação se potencializaria porque os dois países discutem a revisão do chamado Anexo C do Tratado de Itaipu, que define, além dos pontos de operação da hidrelétrica, questões financeiras e orçamentárias. Como a dívida para construção da hidrelétrica foi quitada em 2023, ficarão em caixa cerca de US$ 2 bilhões por ano e será pelo Anexo C que se definirá a destinação desses recursos.
Os dois países também têm discordâncias sobre a utilização dessa verba, que precisa ser definida em comum acordo. O Brasil cogita utilização das verbas na redução de tarifas e em projetos sociais, enquanto o governo Peña deve reivindicar investimento em grandes obras de infraestrutura e logística.
Outro ponto elencado pelo governo paraguaio é o de livre comércio de sua energia excedente, sem a obrigatoriedade de venda ao Brasil - e sim a quem pagar mais. A margem paraguaia da hidrelétrica não tem se manifestado sobre o bloqueio no caixa e orçamento nem sobre as medidas adotadas para avanço nas negociações.
Já o presidente do país vizinho disse, após encontro com Lula na semana passada, que a “conversa foi sincera, aberta e construtiva", apesar de não se encontrar soluções. O preço da energia elétrica já foi tema de ao menos quatro reuniões entre os dois países nos últimos seis meses.
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