Estado que é o segundo maior produtor de trigo do Brasil, o Paraná quer dar um passo importante na consolidação da cultura nos cultivos de inverno. Na expectativa de conquistar a melhor safra da história, o Paraná espera colher 4,5 milhões de toneladas no atual ciclo.
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A produtividade média do ano deve ficar em torno de 3,2 toneladas por hectare, mas o avanço genético das sementes, além de tecnologia, pesquisa, escolha de solo e assistência técnica adequadas, pode render nos próximos ciclos lavouras com produtividade de 10 toneladas por hectare. É o triplo do que se colhe hoje.
O projeto é possível e em pouco tempo. Luiz Tarcísio Behm, da Fundação Meridional, que opera como uma parceira da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) na área de melhoramento genético, afirma que já existe variedade que rende cerca de 10 toneladas por hectare. Ele reforça que o potencial produtivo vai muito além do que se tem visto no campo, mas que, como qualquer outra cultura, é suscetível às condições climáticas e aos tratos culturais.
O segredo está, segundo ele, no melhoramento genético que tem permitido plantas muito mais resistentes, cultivares que produzem muito e que se adaptam ao clima e solo de todo o território nacional. “Hoje não se produz mais trigo só no Sul do Brasil. Quem quiser plantar no Centro-Oeste, por exemplo, tem variedades específicas e com ótimas produtividades”, reforça ele.
Esse avanço de cultivo pode levar à autossuficiência nacional, com produção do grão em larga escala com qualidade e rentabilidade, focando inclusive nas exportações.
Neste ano, o Brasil espera colher 10,4 milhões de toneladas, mais de 90% disso cultivado por dois estados: Rio Grande do Sul (5,6 milhões de toneladas) e Paraná (4,5 milhões de toneladas). “Existe potencial genético para produtividade de 10 toneladas opor hectare. A pesquisa evoluiu muito e a Embrapa nem lança mais um material que não tenha potencial genético para menos de 5 toneladas por hectare em produtividade. Para passar na avaliação e ser lançado como material para o mercado, é preciso que tenha no mínimo esse volume produtivo”, afirma Behm.
Cultivo de trigo oferece várias fontes alternativas de renda ao produtor
O especialista lembrou que há dezenas de variedades e aplicações do trigo, que vão desde a panificação e alimentação humana, passando pela ração animal, até a produção de bebidas. E esse mercado está de olho tanto no consumo interno como nas exportações.
“Além disso, a cultura é uma ótima alternativa para o período de inverno e oferece possibilidade de várias fontes alternativas de renda. Pode servir para o consumo humano, como uma ótima forrageira, para o pastejo, agregando muito valor em proteína animal. E aparece como utilidade interessante a pequenos e médios produtores com alimentação animal de custo baixo”, completa Behm.
Além do aumento de produtividade, o trigo conta com uma vasta área ainda a ser explorada durante os meses de frio no Paraná. O estado se utiliza de apenas 10% das lavouras que são destinadas à soja no verão. Isso significa que, no atual ciclo, o Paraná destinou apenas 1,5 milhão de hectares à triticultura e, mesmo assim, uma parte importante dessas lavouras não foi cultivada como uma primeira opção dos produtores.
Muitos só semearam o cereal porque o ciclo da soja em 2022/23 atrasou, fazendo com que houvesse perda na janela de cultivo para a segunda safra do milho. Sem ter como semear a safrinha, a opção para não deixar a área em pousio, que é quando o solo descansa das atividades agrícolas, foi plantar trigo.
“Antes de termos o milho safrinha, o Paraná já era o líder isolado na produção de trigo no Brasil. Desta vez aumentou a área porque atrasou o plantio do milho, mas temos área e capacidade com aumento de produtividade e podemos ter produção muito maior da que teremos neste ano”, avalia o secretário de Agricultura do Paraná, Norberto Ortigara.
Como conquistar o produtor?
Ao longo dos anos, um desafio tem sido o de conquistar o produtor e incentivá-lo a plantar trigo. “Temos, com tranquilidade, capacidade de sermos autossuficientes e termos produção inclusive para exportar. Temos genética e tecnologia, mas precisamos entender o produtor de forma clara, fazer de forma correta para que o produtor goste da cultura e não desista do cultivo nos anos seguintes”, pondera Luiz Tarcísio Behm, da Fundação Meridional.
Nas últimas décadas, a preferência do mercado brasileiro foi pelo produto importado por dois motivos: preço e qualidade. Na ponta, o produtor desestimulado acabou desistindo da cultura. “Precisamos reverter isso. Temos variedades que já superam a qualidade do trigo importado e, para tornar competitivo financeiramente, é preciso incentivo e estímulo ao bom uso das tecnologias e do melhoramento genético”, explica.
Ele destaca que há possibilidade de aplicação de lavouras de baixo custo, mas para isso é preciso colocar em prática o conhecimento agronômico. “Como pesquisador, precisamos de tempo para o convencimento. Se estivéssemos fazendo isso nos últimos anos já poderíamos ser autossuficientes”, avalia.
Para Behm, o que não se pode fazer ao incentivar o plantio da cultura é “matar o produtor” do pronto de vista econômico e financeiro. “Ele precisa ter viabilidade e retorno, se não tiver, ele não vai plantar. A Embrapa aponta alternativas para isso com resistência genética a muitas doenças e tratos”, explica.
Regiões que podem expandir cultivo
Incentivador do cultivo do trigo, o diretor-presidente da Coopavel, Dilvo Grolli, avalia que, de imediato, é possível investir em cultivares com produtividade de seis toneladas por hectare em duas das principais regiões produtoras do Paraná, o oeste e o sudoeste. Com sede em Cascavel (PR), a cooperativa mantém um importante moinho.
Grolli lembra ainda que existe a possibilidade de ampliação das áreas semeadas no oeste e sudoeste paranaenses. As regiões destinam 434,4 mil hectares ao trigo. “Num primeiro passo, as regiões poderiam mais que dobrar suas áreas produtivas destinadas ao grão. Somente o sudoeste poderia chegar a 447,6 mil hectares que hoje são destinadas à aveia, outras forrageiras de inverno ou mesmo sem cultivo algum”, exemplifica.
Nestas regiões, a produtividade que se espera neste ano é de 3,8 toneladas por hectare, superior à média estadual, que é de 3,2 toneladas por hectare. Se comparado à média brasileira, o salto produtivo é ainda maior. No Brasil espera-se colher 2,9 toneladas/hectare.
A decisão para fazer do estado um grande canteiro produtor de trigo, avalia Grolli, depende da decisão do produtor, agregada à necessidade de acompanhamento técnico especializado, de um bom manejo e adequação do solo e de aplicação das tecnologias.
Rumo à autossuficiência nos próximos anos
Grolli pondera que, entre a produção nacional (cerca de 10,5 milhões de toneladas neste ano) e o consumo (perto de 12,4 milhões), o Brasil seguirá comprando trigo. "É uma oportunidade de mercado, mas acredito que a autossuficiência possa vir em dois ou três anos, considerando o aumento produtivo e a média crescente de consumo de 2% a 3% ao ano”, opina.
Para chegar nessa projeção, Grolli lembra que nos últimos três anos a produção brasileira do cereal cresceu 67%, saindo de pouco mais de 6 milhões de toneladas para chegar às 10,5 milhões de toneladas. “Outras culturas avançaram em produção média, no mesmo período, em 28%”, compara.
Conhecedor das técnicas produtivas, Grolli relembrou que existem trigos produzidos no Brasil com qualidade superior a muitas categorias importadas e que atendem perfeitamente a demanda brasileira e suas necessidades, em 95% dos casos. “Existem demandas especiais de alguns segmentos que aí importam esse trigo de regiões específicas do mundo, mas é uma pequena parcela”, pontua ele.
Produção nacional pode ser maior que a projetada
Para o secretário de Agricultura do Paraná, a projeção da produção nacional no ano, pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), pode estar subestimada. Na relação, o Paraná aparece com uma produção de 4 milhões de toneladas. “Devemos chegar às 4,5 milhões”, projeta.
O secretário destacou que o Brasil ainda importa de 40% a 42% do que consome porque parte da produção nacional é exportada. Foi o que ocorreu com o Rio Grande do Sul, em 2022, que acabou exportando cerca de 2,6 milhões de toneladas para a Europa para produção de suplemento alimentar animal.
Na avaliação de Ortigara, a cultura vive bons momentos em pesquisa, tanto pelas empresas privadas quanto pelas públicas, como a Embrapa, empenhadas em novas variedades com melhoramento genético e aperfeiçoamento constante, o que deve implicar em um novo aumento no cultivo de trigo na safra de 2024.
Mas há receio dos produtores pelo chamado enfezamento do milho, infecção por microrganismos que foi muito comum no último ciclo, além do desajuste de calendário do cultivo da soja, que pode tornar o plantio da oleaginosa inviável em parte do Paraná.
“Acredito que até o fim da década, até antes disso, tenhamos não só autossuficiência como trigo para exportar. Temos variedades especializadas para diversos usos: panificação, cerveja, ração. Estamos evoluindo bem e as próprias projeções revelam que vamos continuar crescendo em área e com produção maior pela produtividade”, comemora Ortigara, lembrando que outras regiões brasileiras não tradicionais ao cultivo estão investindo na cultura irrigada e atingindo bons desempenhos. “E aí, quem sabe, logo a gente pare de gastar dinheiro importando tanto trigo”, completa.
O produtor Leonir Antônio Feline cultiva trigo há três anos, influenciado pelos vizinhos e pela assistência técnica. Terá neste ano o que chama de safra surpreendente em uma área de 73 hectares em Quedas do Iguaçu (PR). “As lavouras estão lindas e é uma excelente cobertura de inverno porque a erosão (da estação) é pior que a da chuva. Então essa cobertura verde segura melhor umidade no solo, além de ter o cereal em si”, avalia.
Nem tudo são flores. O que tem impactado é o preço pago pelo produto, variando entre R$ 60 e R$ 70 a saca. Há um ano, aproximava-se dos R$ 100. “Hoje cada hectare cultivado está mal cobrindo o custo de produção. O que está ruim é o preço, mas sou teimoso e vou continuar plantando trigo nos próximos anos”, destaca o produtor.
O trigo na cerveja
O chamado Biotrigo Weiss foi lançado em julho pela Fapa (Fundação Agrária de Pesquisa Agropecuária) e pela Biotrigo Genética. É a primeira cultivar de trigo desenvolvida no Brasil para fabricação de malte.
A cultivar foi apresentada oficialmente em um evento da Comissão Brasileira de Pesquisa de Trigo e Triticale em Guarapuava (PR). A solenidade contou com a abertura de um barril da bebida produzido com malte de trigo que foi estudado por seis anos até chegar no ponto certo para agradar a indústria cervejeira.
“Estamos caminhando bem em diversos segmentos com o nosso trigo, inclusive para a produção de cerveja”, considera Ortigara. A Biotrigo Weiss ainda não tem produção do malte de trigo destinado ao mercado. O cultivo para atender a demanda em escala comercial deve ocorrer em 2025. “Além do pão, dos bolos, da ração, da forrageira, é o trigo do Paraná sendo destinado a diversas outras finalidades”, celebra o secretário da Agricultura.
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