O enfrentamento do crime organizado ao Estado brasileiro deve ter mais um desfecho no banco dos réus nesta semana, no Paraná. O último suspeito de envolvimento direto na morte da policial penal e psicóloga Melissa Almeida está sendo julgado desde essa segunda-feira (14), em Curitiba. O réu é considerado pelas investigações como o principal articulador e mandante do crime. A vítima trabalhava na Penitenciária Federal de Catanduvas (PR).
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Roberto Soriano foi apontado pela Polícia Federal (PF), durante as investigações, como o mentor da execução da agente, morta com tiros de pistola e de fuzil no rosto no fim da tarde de 25 de maio de 2017, quando chegava em casa com o filho, de apenas um ano. No carro também estava o marido dela, o policial civil Rogério Ferrarezzi. Ele revidou, acabou atingindo um dos atiradores e também foi alvejado, mas sobreviveu. A criança não foi ferida e, durante as investigações, a PF identificou mensagens trocadas pelos criminosos reforçando o “cuidado” para não atingirem o bebê, reforçando conhecerem bem a rotina da família.
Isso ficou evidenciado pelo longo planejamento e escolha da vítima, descobertos nas investigações. De acordo com a PF, Melissa foi monitorada por 40 dias e considerada um “alvo fácil” pelos criminosos que cercaram o condomínio onde a família dela morava, no município de Cascavel (PR), a cerca de 55 quilômetros de distância para a penitenciária. Os atiradores chegaram a subir em telhados de residências próximas para não a perderem de vista.
O crime foi o terceiro de uma série de ataques que tiraram a vida de policiais penais no Brasil em 2016 e 2017, planejados pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) como enfrentamentos às forças de segurança do estado.
Segundo a PF, ao menos dois dos ataques contra agentes haviam sido orquestrados por Soriano, que estava preso na Penitenciária Federal de Segurança Máxima em Porto Velho (RO).
Logo após o assassinato de Melissa, diversas forças de segurança fecharam as saídas da cidade paranaense e conseguiram prender quatro suspeitos de envolvimento no crime. Na época, identificou-se que ao menos metade deles tinha ligação direta com o PCC.
Julgamento de membro do PCC deve se estender por dias
O julgamento de Roberto Soriano é presidido pelo juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba. Apenas pessoas diretamente envolvidas no julgamento ou autorizadas pela Justiça Federal acompanham a sessão, que pode levar dias até um veredito.
Outras quatro pessoas que teriam envolvimento com o crime já foram julgadas, em janeiro deste ano. Uma delas foi absolvida e outras três foram condenadas. Ainda em janeiro, no segundo dia do julgamento, “foi determinado o desmembramento do processo em relação ao acusado Roberto Soriano, pois a banca de advogados que atua em sua defesa deixou o plenário durante o julgamento”, lembrou a Justiça Federal.
No início do ano, o julgamento dos outros acusados levou uma semana. Foram ouvidos o policial civil marido da Melissa e outras nove testemunhas de acusação, além de uma testemunha de defesa e duas testemunhas do juízo. “Ao todo, 13 pessoas prestaram depoimentos durante o julgamento. A soma das condenações ultrapassou 139 anos”, informou a Justiça Federal.
Como foi o primeiro dia do julgamento
Desta vez, o primeiro dia do julgamento foi marcado pelo pedido da defesa de uma série de nulidades processuais.
O Conselho de Sentença é composto por seis homens e uma mulher. Segundo o juízo responsável pelo Tribunal do Júri, ouvir todas as partes do processo deve demorar alguns dias até a deliberação da sentença. Ao todo, 21 testemunhas, tanto de acusação quanto de defesa, devem ser ouvidas.
Por volta das 15h30 desta segunda-feira (14) foi ouvida por videoconferência a vítima sobrevivente, o policial civil marido de Melissa de Almeida Araújo. Alguns dos depoimentos aguardados, como o do delegado da PF que conduziu as investigações, foram transferidos para esta terça-feira (15).
Lotação em presídio federal foi decisiva para a escolha da vítima pelos criminosos
“Não houve outro motivo para a escolha da Melissa por ser uma policial penal lotada no presídio federal de Catanduvas. Existe método, a execução com tiro no rosto é um recado bastante claro dos criminosos ao Estado, às forças de segurança, aos profissionais que atuam na segurança pública”, afirmou o delegado do Sindicato dos Policiais Penais Federais, Carlos Machado.
Ele acompanhou de perto as investigações da morte de Melissa e de outro colega, o policial penal Alex Belarmino, executado em Cascavel por determinação do PCC em setembro de 2016. Soriano também era apontado como mandante deste crime, mas foi absolvido. “Temos adotado uma série de medidas de prevenção, de segurança. Se vai acontecer de novo? Não sabemos, pode ser que sim, mas não sabemos como nem onde. Precisamos estar sempre preparados”, completou.
Segundo a PF, os motivos para o assassinato de Melissa e de Belarmino não foram outros se não as “represálias à atuação regular do Estado brasileiro no controle da disciplina interna nas unidades do sistema carcerário federal”.
Presídios federais e a fúria dos criminosos
O Brasil conta com cinco penitenciárias federais de segurança máxima. Catanduvas (PR) foi a primeira delas, inaugurada em 2006. As demais estruturas de segurança máxima estão em Mossoró (RN), onde um policial penal federal foi assassinado de maneira semelhante aos casos do Paraná, também em 2016; Porto Velho (RO); Campo Grande (MS); e mais recentemente Brasília (DF), onde está preso Marcos Camaxo, o Marcola, principal nome da facção.
Foi a transferência de Marcola de um presídio estadual de São Paulo para o presídio federal de Brasília, em 2019, que motivou o planejamento do PCC em sequestrar e matar o senador e ex-juiz Sergio Moro (União-PR). Na época, foi Moro quem autorizou a transferência do líder da facção, no período em que era ministro da Justiça e Segurança Pública do governo de Jair Bolsonaro (PL).
Nos cinco presídios federais estão cerca de 700 presos considerados de altíssima periculosidade.
Todos ficam em celas individuais e sem visitas íntimas com contato físico. Segundo investigações da PF, a determinação para a morte de Melissa foi dada pelo faccionado que estava preso na Penitenciária Federal de Segurança Máxima em Porto Velho, durante uma visita íntima. Este foi um dos principais motivos pelos quais, em 2017, foi publicada a primeira portaria determinando que as visitas nesses presídios ocorreriam exclusivamente por parlatório ou por videoconferência, condição mantida até hoje e criticada por advogados criminalistas.
“Os réus foram acusados de agir no interesse da maior facção criminosa que atua em todo território nacional, motivados pelo propósito de vingança a funcionários e autoridades do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) e pela ideia de intimidação de toda a categoria de agentes penitenciários federais”, apontaram as investigações.
Por se tratar de crime contra a vida de servidor público federal no exercício de suas funções, a competência para julgamento é do Tribunal do Júri da Justiça Federal. O processo também envolvia outras duas pessoas acusadas de participação no crime, mas elas já morreram.
A defesa de Soriano nega que ele tenha sido o articulador e mandante da morte de Melissa Almeida.
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