As Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) e as Centrais Geradoras de Energia (CGHs), com capacidade de geração que variam de 1 a 30 megawatts por hora (MWh), não precisam mais de aprovação do Poder Legislativo para serem instaladas no Paraná. O Supremo Tribunal Federal (STF) julgou inconstitucional o artigo 209 da Constituição do Estado do Paraná, que há 33 anos vinculava a instalação desses empreendimentos à autorização da Assembleia Legislativa (Alep).
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O julgamento foi encerrado em 17 de fevereiro e, no último mês, houve a certificação do trânsito em julgado. A decisão, por unanimidade, é definitiva, não cabendo mais recurso. O entendimento da Corte é que o artigo 209 da Constituição paranaense viola a Constituição Federal, segundo a qual a competência de legislar sobre matéria relativa à energia elétrica é privativa da União. O STF apreciou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) proposta pelas entidades representativas do setor - a Associação Brasileira de PCHs e CGHs (Abrapch) e a Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa (Abragel).
A decisão do Supremo divide opiniões. De um lado, entidades do setor comemoram por avaliarem que a medida vem para desburocratizar os processos de instalação dos empreendimentos. Na outra ponta, ambientalistas alertam que uma etapa importante de avaliação mais criteriosa sobre os impactos das centrais foi excluída.
“Além do devido estudo ambiental e depois de liberada a licença prévia, o empreendimento tinha ainda que ser objeto de um Projeto de Lei de autoria do Executivo estadual para ser encaminhado à Assembleia Legislativa para a aprovação dos deputados”, explica a diretora de assuntos ambientais da Abrapch, Gleyse Gulin.
Ela observa que “o processo de licenciamento ambiental já é um grande gargalo porque demora” e essa outra exigência demandava mais uma etapa a ser cumprida. “Por isso, nos juntamos à Abragel para propor a ação”, informa.
De acordo com informações da Abrapch e da Abragel, o Paraná era o único estado que ainda vinculava a autorização dos empreendimentos ao Legislativo. “A Abragel vem atuando intensamente contra essas leis e vem tendo êxito como a declaração de inconstitucionalidade das leis de Macaé e Bom Jesus do Itabapoana, municípios do estado do Rio de Janeiro”, diz o presidente da Abragel, Charles Lenzi. Ele cita ainda os casos de Ponte Nova (MG) e Cuiabá (MT), que proibiram a instalação de hidrelétricas, contrariando a legislação.
Nos dois casos, a Abragel atuou em ação de inconstitucionalidade proposta pelo governo federal, como amicus curiae (amigo da corte, em tradução livre, um terceiro que ingressa no processo com a função de fornecer subsídios ao órgão julgador). As decisões foram favoráveis, garantindo o poder à União.
Paraná foi estado que mais licenciou centrais hidrelétricas
De acordo com a Associação Brasileira de PCHs e CGHs (Abrapch), o Paraná, ao lado de Goiás, foi o estado que mais licenciou pequenas usinas nos últimos quatro anos, com um aumento de 37% no número de empreendimentos instalados. Entre os anos de 2019 e 2022, foram emitidas 127 licenças ambientais (entre licença prévia, licença de instalação e licença de operação) e 191 renovações de licenças pelo Instituto Água e Terra (IAT) - vinculado à Secretaria de Estado do Desenvolvimento Sustentável e do Turismo - para construção de 33 empreendimentos que representam investimentos de R$ 2 bilhões. Em contrapartida, em 15 anos - entre 2003 a 2018 - foram aprovadas a instalação de apenas 12 empreendimentos.
Segundo a Abrapch, por serem menores, essas centrais de energia são mais baratas de construir e causam um dano ambiental menor, pois não alagam grandes áreas. Além disso, podem ser construídas em rios com menor vazão, proporcionando a descentralização da geração de eletricidade no país.
Ambientalistas divergem de decisão do STF
Para os ambientalistas, a decisão do STF tira uma etapa importante do processo, que era a oportunidade de um debate mais detalhado com todos os interessados no tema, de forma transparente. O deputado estadual Goura (PDT), coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista na Alep, vê com preocupação a decisão da Corte. Segundo ele, o parlamento era praticamente o único lugar em que esses projetos ganhavam um olhar público coletivo. Ao contrário do que informa a Abrapch, Goura diz que “as Pequenas Centrais Hidrelétricas só são pequenas no nome, porque causam grandes impactos ambientais e socais: alagam grandes áreas de florestas e de terras férteis usadas pela agricultura familiar”. Ele observa que, por isso, precisam de uma análise criteriosa e sistêmica.
O parlamentar acrescenta que a pauta ambiental, com a defesa de políticas de conservação dos poucos remanescentes de floretas que o Paraná ainda tem, não é objeto de preocupação dessas entidades. Para Goura, a decisão é prejudicial na medida em que tira o mínimo controle de fiscalização que ainda existia. “O Paraná é superavitário em energia, esses empreendimentos só atendem a interesses econômicos e não têm função social”, opina.
O coordenador do Núcleo de Recursos Hídricos do Ministério Público do Paraná (MP-PR), promotor Leandro Garcia Algarte Assunção, observa que a preocupação dos ambientalistas é legítima porque são empreendimentos com potencial de degradação ambiental. “Antes, havia uma instância a mais para se debater, quando os projetos tinham que passar pela Assembleia Legislativa”, considera. Para o promotor, a nova realidade “vai forçar o órgão ambiental estadual a ser mais criterioso e a sociedade civil e o Ministério Público a ficarem mais atentos”.
Assunção esclarece que a população poderá continuar acompanhando e fiscalizando. “A nova realidade traz ainda mais importância para esse acompanhamento da sociedade que se dará por meio de consultas e audiência públicas, da mesma forma a atuação do Ministério Público ganha ainda mais relevância", destaca.
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