Pelo menos sete municípios no entorno de Curitiba estão sofrendo com baixa de estoque ou irregularidade no abastecimento da vacina BCG, um imunizante que é aplicado imediatamente após o nascimento e que previne a tuberculose — principalmente as formas graves, como meningite tuberculosa e tuberculose miliar (espalhada pelo corpo). De preferência, ela deve ser aplicada no primeiro mês de vida e também é recomendada para contato de hanseníase.
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Segundo levantamento divulgado no Bom Dia Paraná, da RPC, nesta quinta-feira (2), Quatro Barras, Colombo, Pinhais, São José dos Pinhais, Araucária, Almirante Tamandaré e Campo Largo confirmaram irregularidades nos estoques. Curitiba não atravessa problemas com o imunizante, segundo consulta feita pela Gazeta do Povo.
A causa dessa situação está na dificuldade de aquisição do imunizante, o que fez o Ministério da Saúde reduzir o quantitativo de doses de BCG de cerca de 1 milhão para 500 mil mensais para cada estado, como informado no dia 29 de abril pela Secretaria de Vigilância em Saúde, através de um ofício. “Há previsão de manter esta readequação pelos próximos sete meses”, informou à época a secretaria.
No Paraná, até o fim do mês de maio, foram aplicadas 22,5 mil vacinas da BCG, pouco mais da metade do realizado no período no ano passado (54 mil). Em 2015, no ano anterior à interdição pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) da única fábrica brasileira do imunizante, uma das causas da carência atual, foram aplicadas 76 mil doses no mesmo período, mais de três vezes a quantidade deste ano. Em 2019, pelo menos 12 estados precisaram racionar o imunizante para garantir a vacinação.
O pediatra Juarez Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), diz que o racionamento não pode significar priorização de um paciente em relação a outro, visto que a vacina é indicada para todas as crianças. “São frascos de múltiplas doses, então talvez tenha que fazer uma logística para aproveitar ao máximo, para não desperdiçar”, opina ele, assinalando que no sistema privado também tem havido, com frequência, relatos de falta do imunizante.
Curitiba garante estoque
Se as cidades no entorno têm sofrido com a falta da BCG, a capital paranaense tem a vacina da BCG em estoque e em quantitativos dentro da demanda, segundo a Secretaria Municipal da Saúde (SMS), consultada pela Gazeta do Povo. “A cobertura vacinal na cidade para este imunizante está em 88,8% do público-alvo”, diz a secretaria em nota.
A SMS afirma que, mesmo antes da notificação da diminuição do repasse de doses feito pelo Ministério da Saúde aos estados e, consequentemente, aos municípios, Curitiba já adotava um sistema de máximo aproveitamento das doses para este imunizante. “A aplicação da vacina da BCG é feita dentro de um cronograma nas unidades de saúde. Nesse sistema escalonado, crianças que precisam receber a dose da BCG têm agendada a data da aplicação, permitindo que as dez doses de cada frasco tenham o melhor uso, com vistas a evitar que o município sofra com a falta do imunizante”, explica a pasta.
Riscos do racionamento
No último domingo (29), a Sociedade Brasileira de Imunizações publicou um informe técnico com mais cinco instituições científicas e encaminhado ao Ministério da Saúde, alertando para as consequências do racionamento da vacina BCG, que vem ocorrendo há seis anos e fez com que a vacinação deste público não alcançasse a meta durante esse tempo. Entre janeiro e outubro de 2020, somente 63,8% dos brasileiros receberam a vacina BCG.
Causas da falta da BCG
O fornecimento da vacina BCG diminuiu por questões logísticas e de importação do Ministério da Saúde, que tenta remediar os efeitos da interdição, desde 2016, da única fábrica nacional, pelo não cumprimento de exigências feitas pela Anvisa. As instalações pertencem à Fundação Ataulpho de Paiva, localizada no Rio de Janeiro.
Segundo o informe da SBIm, “em um momento de baixas coberturas, quando os esforços deveriam ser para ampliação dos estoques e da busca ativa das crianças para aumentar a cobertura vacinal, a orientação do Ministério da Saúde vai em via contrária. A aplicação precoce do imunizante, imediatamente após o nascimento, é uma recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS)”, diz, assinalando que o baixo número de vacinados colabora para que o Brasil continue fora da lista de países que alcançam a meta de imunização infantil, o que ocorre há pelo menos seis anos.
Desperdício imenso
No ano de 2021, de janeiro a maio o Paraná aplicou em torno de 54,6 mil doses, ou seja, pouco mais de 10% das doses que o estado passará a receber em um único mês após essa adaptação do Ministério da Saúde.
O disparate entre esses números, segundo o pediatra e infectologista Renato Kfouri, diretor da SBIm, ocorre pelo número de doses nos frascos. “Chegam muito mais doses do que o número de nascidos no país, em torno de 3 milhões, porque o frasco vem com 10 doses. Uma vez aberto ele vale por 6 horas, então as perdas são muito grandes. Por isso tem essa diferença de distribuir milhões de frascos e a aplicação de bem menos doses, pois a perda chega a 90%, dependendo do município”, explica ele. “Tem município em que nascem 10 crianças por mês e se abre 10 frascos e só faz uma para cada um que chega”, explica.
Cobertura vacinal está abaixo do índice ideal
Os números de doses aplicadas anualmente no estado vêm caindo consistentemente, de 168 mil em 2015 para 119 mil doses no ano passado. De acordo com o Datasus, este ano a cobertura vacinal da BCG no Paraná está em 32,79%, abaixo do índice nacional, de 41,3%. Nos doze meses de 2021, o Paraná alcançou cobertura de 79%, ainda abaixo do considerado ideal, de no mínimo 90% (índice atingido pela última vez em 2019).
Em consulta à Secretaria de Estado da Saúde do Paraná, a Gazeta do Povo foi informada que o comunicado do Ministério da Saúde foi disparado, à época, para as 22 Regionais de Saúde, quando houve a orientação para “que os municípios agendassem a imunização ainda na maternidade, definissem quais unidades disponibilizariam a vacina e instruíssem a população sobre a importância do agendamento, devido ao estoque limitado”. Essa medida, diz a secretaria, otimiza as doses, diminui o risco de descarte e garante maior cobertura do imunizante.
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