A decisão unânime do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em favor do senador Sergio Moro (União Brasil-PR) na noite desta terça-feira (21) não coloca apenas um ponto final no longo processo que pedia a cassação de seu mandato. O placar de sete a zero, que rejeitou as acusações de abuso econômico na campanha e absolveu o ex-juiz da Operação Lava Jato e ex-ministro da Justiça, também indica um aceno do presidente da Corte, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), em favor de eventual alívio da tensão entre o Judiciário e Congresso.
A atitude de Moraes é especialmente relevante para os senadores. Muitos deles estavam incomodados com a percepção de cerco judicial à oposição mais próxima do ex-presidente Jair Bolsonaro. Os inquéritos presididos pelo ministro resultaram em diversas ações da Polícia Federal (PF) contra congressistas em pleno exercício de suas atividades, sobretudo no contexto da suposta trama de golpe de Estado em 8 de janeiro de 2023.
O Senado é o principal órgão que pode se opor a desmandos do STF, promovendo por exemplo a derrubada de ministros. Uma eventual cassação de Moro poderia aumentar o número de senadores dispostos a confrontar o STF.
Em meio a essa insatisfação com o ativismo judicial, havia a expectativa inicial de que Moro seguiria o mesmo destino do outro nome emblemático da Lava Jato, o ex-procurador Deltan Dallagnol, que há um ano perdeu seu mandato de deputado por decisão unânime e acelerada do TSE, enquadrado na Lei da Ficha Limpa. Dallagnol congratulou Moro em uma publicação no X por ter "alcançado uma ilha de justiça no mar de injustiças, pressões, perseguições, retaliações e vinganças que tem sofrido desde que Lula foi eleito".
No Tribunal Regional Eleitoral no Paraná, a vitória de Moro foi por cinco votos a dois, no fim de abril. No TSE, a decisão unânime representou uma guinada na postura de Moraes e no clima da Corte em relação a casos de parlamentares de direita, sobretudo os ligados a Bolsonaro.
Moro vinha trafegando em campo minado, pois enfrentava a rejeição de membros do Judiciário, boa parte fomentada por uma crítica à atuação da Lava Jato, e de parlamentares da direita e da esquerda, ressentidos pelos posicionamentos do senador tanto contra Lula quanto Bolsonaro. Apesar da tentativa do ex-presidente de pacificar a relação com seu ex-ministro, seu partido manteve o recurso no TSE contra Moro, se juntando ao do PT.
A maioria dos parlamentares de oposição preferiu não comentar publicamente a absolvição de Moro. Muitos deles temem ser envolvidos em uma onda de críticas provocada por apoiadores da direita e do PL. A senadora Damares Alves (Republicanos-DF) foi uma das únicas a celebrar a absolvição, dizendo estar muito feliz, e sofreu grande quantidade de críticas na rede social X.O relator da ação contra Moro no TSE, ministro Floriano Marques, deixou uma dica para os autores da ação pela cassação, que ainda podem recorrer da absolvição, segundo o qual o Ministério Público ainda pode se debruçar sobre indícios de crime de improbidade na campanha do senador.
Conversa entre Pacheco e Moraes reverteu a expectativa de cassação
Ao final, o julgamento se sobressaiu em um contexto político amplo, que extrapola o caso em si e alcança esforços para evitar a ruptura entre Judiciário e Legislativo. Um sinal claro dessa concertação foi dado na semana passada, dias antes do início do julgamento de Moro. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), fez uma manifestação pública sobre o mandato de Moro e adotou uma abordagem direta ao tratar do assunto diretamente com Moraes.
Na conversa "institucional", Pacheco defendeu prerrogativas e representatividade dos senadores e alertou Moraes sobre a necessidade da Corte eleitoral julgar o senador dentro do “devido processo legal" --- considerando o peso da influência do presidente do TSE sobre a maioria do colegiado.
O apelo de Pacheco teve o tom de advertência para o risco de que se elevassem as pressões para que o Senado desse início a um processo de impeachment contra Moraes, dentre as dezenas que se acumulam na gaveta da Mesa Diretora da Casa, boa parte deles solicitada por senadores.
Nas últimas semanas, os bastidores do poder dão conta de uma série de decisões do ministro do STF no sentido contrário à ideia de perseguição a Bolsonaro e seus aliados, numa fase tida como “recuo tático”. Entre elas estão o entendimento de que Bolsonaro não violou medidas cautelares durante sua estadia na embaixada da Hungria, a autorização para o senador Marcos Do Val (Podemos-ES) voltar a a utilizar suas redes sociais, e o relaxamento da prisão de um policial investigado pelos atos de 8 de janeiro.
Absolvição renova a esperança de Seif para seguir no mandato
Essa aparente trégua pode beneficiar o senador Jorge Seif (PL-SC), alvo de processo de cassação no TSE também por suposto abuso de poder econômico. Seu julgamento foi interrompido e pode voltar quando Moraes já estiver fora do tribunal com o término de seu mandato em junho. A advogada do senador catarinense, Maria Claudia Bucchianeri, disse que o processo é baseado em “narrativas”, sem evidências concretas de abuso.
O temor está na repetição da decisão do TSE no ano passado referente às eleições de 2020, que cassou o mandato do então prefeito de Brusque (SC), José Ari Vequi, por abuso de poder econômico. A alegação foi a mesma apresentada contra Seif, de uso da estrutura da empresa Havan, de Luciano Hang, para alegadamente promover campanha eleitoral.
Mas a esperança de Seif pode também ganhar reforço no voto de Alexndre de Moraes no julgamento de Moro, quando ele afirmou não ser possível cassar o mandato do senador paranaense porque faltaram “provas cabais” de irregularidades. “Para a cassação de mandatos, a Justiça Eleitoral exige provas cabais. São decisões graves que afastam pessoas dos mandatos concedidos pelo eleitorado”, disse. “O tribunal vem sendo extremamente rigoroso em todas as análises, seja indeferindo ou deferindo cassação de registro, cassação de mandato, inelegibilidade, exigindo provas cabais. E aqui não há essas provas”, concluiu.
O TSE é composto por sete integrantes: Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Nunes Marques, Raul Araújo Filho, Maria Isabel Diniz Gallotti Rodrigues, André Ramos Tavares e Floriano Peixoto de Azevedo Marques Neto (relator). Assim como no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-PR), era necessária maioria simples de votos para condenar ou absolver o senador.
A derrota das legendas extremamente opostas, PT e PL, garantiu mais seis anos de mandato ao senador eleito pelo Paraná, em 2022, com 1,9 milhão de votos. O desfecho da batalha na corte eleitoral ainda deu alento a outras situações envolvendo oposicionistas. Rodrigo Pacheco também defendeu o mandato de Seif na reunião que teve com Alexandre de Moraes.
Em dia de derrotas no STF, Lava Jato conquista sofrida vitória no TSE
Para a Lava Jato, que completou melancolicamente em maio o seu décimo aniversário, o julgamento de Moro estava cercado de valores simbólicos, sobretudo ao ocorrer no mesmo dia que o STF anulou uma condenação do ex-deputado e ex-ministro da Casa Civil do primeiro mandato de Lula, José Dirceu (PT), no âmbito da operação. Dirceu ainda precisa se livrar de uma última condenação da Lava Jato, que está sob análise do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Se isso ocorrer, estará livre para disputar eleições em 2026.
Também nesta terça-feira (21), o ministro Dias Toffoli, do STF, anulou todos os atos da Lava Jato contra Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht (agora Novonor). Segundo a decisão de Toffoli, procuradores da Lava Jato “ignoraram o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa e a própria institucionalidade para garantir seus objetivos”. “O que poderia e deveria ter sido feito na forma da lei para combater a corrupção foi realizado de maneira clandestina e ilegal”, anotou o ministro.
Mas a absolvição de Moro pode ainda ter mais repercussões. O relator da ação contra no TSE, ministro Floriano Marques, deixou uma dica para os autores da ação pela cassação do PT e do PL, que ainda podem recorrer da absolvição. Ele disse que o Ministério Público ainda pode se debruçar sobre indícios de crime de improbidade na campanha do senador. É improvável que a decisão seja revertida no TSE ou no STF por meio de recursos, mas a perseguição política do governo e da oposição a Moro ainda deve continuar.
A senadora Damares Alves pertence ao partido Republicanos e não ao PL como citado inicialmente.
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