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Desaprovação de Lula

Alta de preços deteriora popularidade de Lula no Nordeste e impõe desafio para o PT na região

Desaprovação a Lula dispara por frustração com a economia. (Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República)

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A alta nos preços dos alimentos e o abalo na popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) colocam o Partido dos Trabalhadores em uma situação delicada na região Nordeste, principal reduto eleitoral do mandatário. Com a preferência pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste - segundo o cenário eleitoral de 2022 - o petista corre o risco de reduzir sua influência para as eleições de 2026.

Além disso, o desempenho da legenda nas eleições municipais é avaliado por analistas como um fator de alerta para Lula e o PT. Apesar de eleger 135 prefeitos na região, a sigla só conquistou uma das nove capitais: Fortaleza (CE).

O resultado desses pontos citados pôde ser verificado, por exemplo, no levantamento feito pelo PoderData*, divulgado nesta quarta-feira (29), segundo o qual a aprovação de Lula caiu de 53% em dezembro para 51% em janeiro entre eleitores nordestinos, enquanto a desaprovação subiu de 41% para 43%. Já entre os lulistas como um todo, a desaprovação aumentou de 18% para 23%, enquanto a aprovação caiu de 78% para 73%. No cenário geral, Lula atingiu 51% de desaprovação, enquanto 42% aprovam seu governo.

A variação de longo prazo também demonstra a deterioração do apoio ao presidente na região. No início do mandato, a margem entre aprovação e desaprovação no Nordeste era de 20 pontos percentuais. Agora, caiu para apenas 8 pontos, refletindo o impacto do cenário econômico e político sobre a popularidade de Lula em seu principal reduto eleitoral.

A percepção de que o governo precisa se movimentar para mudar esse cenário já foi externada por aliados mais próximos do presidente. Na avaliação da governadora Fátima Bezerra (PT), do Rio Grande do Norte, Lula deveria “intensificar a presença no Nordeste este ano”. Ela também afirmou que os ministros do governo deveriam fazer o mesmo.

“Tem que intensificar a presença no Nordeste este ano e cada vez mais. A coisa boa é que agora o presidente Lula vai poder voltar a viajar pelo Brasil. Ele está ansioso para isso. É o tempo da colheita, de entregar essas obras. Não podemos baixar a guarda. O governo tem que se fazer mais presente exatamente aqui no Nordeste. Não só Lula, mas também os ministros. A gente tem que ter muita atenção para os investimentos previstos para corresponder às expectativas da população”, disse a governadora em entrevista ao jornal O Globo nesta terça-feira (28).

O levantamento feito pela Genial/Quaest** também demonstrou a percepção de que Lula tem perdido apoio entre os nordestinos. Segundo a pesquisa, a aprovação do petista caiu de 67% para 59%. Já a desaprovação subiu, saindo de 32% para 37%. Na leitura do ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, o cenário pode ser revertido com “medidas” do governo.

“Não tem truque. Quem pensa em truques sobre isso, quem pensa em bala de prata, em geral colhe um resultado negativo. Não é a primeira vez que a gente governa o país. Não é a primeira vez que a gente vê situações de crescimento, por exemplo, do preço de determinados alimentos”, disse o ministro em entrevista à Folha de S. Paulo nesta terça-feira.

Desaprovação pode ser explicada pelos dados econômicos do Nordeste

Os números também encontram eco na inflação que abateu a região em 2024. Usando os dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste (Etene), ligado ao Banco do Nordeste (BNB), informou à Gazeta do Povo que a região fechou dezembro com o índice em 0,67%, superando os 0,52% da média nacional.

No acumulado do ano passado, a região apresentou IPCA de 4,85%, levemente superior à média do Brasil, de 4,83%. Ainda de acordo com o Etene, os grupos Alimentação e Bebidas, Saúde e Transportes foram responsáveis por puxar esse índice, já que registraram variações de +6,5%, +6,5% e +4,4%, respectivamente.

Para chegar a esses números, o banco analisou os dados de cinco capitais do Nordeste que são avaliadas pelo IBGE no cálculo da inflação: Recife (PE), Fortaleza (CE), Aracaju (SE), Salvador (BA) e São Luís (MA). Em relação à última, a capital do Maranhão chegou a registrar a maior inflação dentre as 16 capitais analisadas pela instituição, atingindo 6,51% em 2024.

O cientista político Adriano Cerqueira, do Ibmec de Belo Horizonte, afirma que a piora das condições econômicas da população de baixa renda tem enfraquecido a base eleitoral do petista na região.

“O Nordeste sempre foi favorável ao PT, principalmente a Lula, porque tem índices de pobreza relativamente maiores que em outras regiões, como Sudeste e Sul. Mas agora, à medida que a situação da população mais pobre se agrava e Lula está no governo, isso naturalmente resulta em perda de apoio”, avalia.

O especialista aponta que a base eleitoral do presidente já não demonstra a mesma solidez que teve nas eleições de 2022. “Lula já perdeu aquele apoio que resultou na diferença entre o primeiro e o segundo turno contra Bolsonaro. Hoje, ele não tem mais esse respaldo. E o que é pior: as pesquisas indicam que sua base eleitoral pode ter encolhido ainda mais”, destaca.

No último pleito presidencial, a diferença entre o então candidato do PT e o do PL foi de pouco mais de 2 milhões de votos. Em número de votos, Lula conseguiu 60,1 milhões (50,88%) e Bolsonaro alcançou 58 milhões (49,12%).

Eleições municipais reforçaram alerta para o PT

Os resultados das eleições municipais de 2024 demonstraram que o antipetismo continua a ser uma força política relevante no Brasil, mesmo com Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na Presidência da República. No primeiro turno, partidos de esquerda sofreram derrotas importantes, especialmente em redutos estratégicos do Nordeste.

Embora o PT tenha conquistado 135 prefeituras na região, seu desempenho nas capitais foi tímido: elegeu apenas um prefeito entre as nove capitais nordestinas, em Fortaleza (CE).

No segundo turno, a direita e o Centrão consolidaram avanços, confirmando uma tendência observada nos últimos anos. Das nove capitais nordestinas, sete passaram a ser comandadas por siglas que orbitam esses espectros políticos.

O União Brasil saiu vitorioso em três capitais – Teresina (PI), Natal (RN) e Salvador (BA) –, enquanto o PL garantiu duas prefeituras, Maceió (AL) e Aracaju (SE). Já o PSD venceu em São Luís (MA) e o PP, em João Pessoa (PB).

Já a esquerda ficou com duas capitais nordestinas. O PT venceu em Fortaleza (CE). E o PSB - que faz parte da base do governo no Congresso, mas afirma manter independência em relação ao PT - levou Recife (PE). O PSB é o partido do vice-presidente, Geraldo Alckmin.

A distribuição das prefeituras evidencia um fortalecimento da direita e do Centrão no Nordeste, com o PL, União Brasil e PP garantindo espaço na região. Esse resultado reforça o desafio do PT em manter o que era considerado uma "hegemonia" em 2026, diante do avanço de partidos de oposição e do desgaste do governo federal na região.

Mudança no perfil do eleitorado nordestino desafia Lula

Para o cientista político Elton Gomes, professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI), as pesquisas de opinião e o resultado das eleições municipais representam uma mudança no perfil de apoio ao lulopetismo, impulsionada por transformações econômicas, culturais e tecnológicas.

"Não podemos ter a visão caricata, como vemos em novelas, que o nordestino de hoje é o mesmo de décadas passadas. A eleição em Fortaleza, por exemplo, evidenciou que o lulopetismo, apesar ter saído vitorioso, agora possui um adversário à altura. Levando em conta a vantagem que a oposição possui nas redes, é natural que o debate sobre pautas de direita, por exemplo, como a liberdade econômica e redução do Estado, também sejam debatidas por nordestinos. Isso permite que o eleitorado, com o tempo, mude sua percepção sobre a política e tome decisões diferentes", disse o cientista político

Gomes avalia que tanto o governo quanto a oposição precisarão agir estrategicamente diante desse cenário. “O grande ponto que a gente precisa levar em consideração é até que ponto isso de alguma maneira pode ser revertido pelo governo até 2026, dando um freio de arrumação. E até que ponto também a oposição vai saber explorar esse momento estratégico?”, questiona.

Para ele, a direita brasileira historicamente tem dificuldades em capitalizar os erros do adversário e, caso não saiba articular alianças na região, pode perder a oportunidade de avançar ainda mais no Nordeste nas próximas eleições.

“Acho que falta para a gente um pouco mais de tempo para compreender quais são os limites e possibilidades dessas duas movimentações. Agora, a concertação [negociação] política é decisiva do ponto de vista de conseguir implementar um projeto”, opina.

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*Metodologia: O instituto PoderData ouviu 2,5 mil pessoas, em 219 municípios dos 26 estados e Distrito Federal, entre os dias 25 e 27 de janeiro. A margem de erro é de 2 pontos percentuais, com 95% de grau de confiança.

**Metodologia: A pesquisa da Quaest foi encomendada pela Genial Investimentos. Foram entrevistados 4.500 eleitores em todo o Brasil, de 23 e 26 de janeiro. A margem de erro é de 1 p.p. (ponto percentual), para mais ou para menos. O nível de confiança é de 95%.

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