Arthur Lira (PP-AL), o presidente da Câmara dos Deputados, emergiu como grande vencedor da aprovação da reforma tributária pela Casa na noite de quinta-feira (6), que ocorreu com rapidez e ampla margem de votos: 382 a favor, bem acima dos 308 necessários e além das expectativas.
Após 11 horas de debates, a sessão que varou a madrugada também registrou placar folgado na aprovação dos ajustes ao texto (379 votos favoráveis) e no segundo turno (375 votos favoráveis).
Para analistas e políticos consultados pela Gazeta do Povo, Lira consolidou o seu poder ao obter êxito como principal articulador da reforma tributária, superando as resistências de governadores, setores produtivos e líderes partidários.
“Neste sentido, Lira se torna uma figura de importância simbólica equivalente à de Lula na República”, afirmou o cientista político Leandro Gabiati, da Dominium Consultoria.
A aprovação da reforma foi atribuída em parte às alterações feitas na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) pelo relator Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) nos últimos dias. Mas pesou muito a liberação por parte do governo de R$ 5,3 bilhões em emendas parlamentares horas antes da votação.
Lira conquistou apoios importantes para a PEC, deixando políticos de peso temerosos de sofrer isolamento. Ele se destacou ao mediar as discussões e ao moldar desfechos. Sua atuação levou muitos a ceder e negociar, reconhecendo o risco iminente da aprovação da reforma. Além disso, Lira foi à tribuna do plenário para enfatizar a importância do debate técnico, pedindo aos deputados que abandonassem posições ideológicas e a disputa entre oposição e situação.
Nesta sexta, falando após a aprovação da reforma em dois turnos, Lira disse: “Neste esforço legislativo, na noite de ontem (7/7), num fato histórico, na primeira grande reforma estruturante tributária no país depois da redemocratização, a Câmara dos Deputados cumpriu o seu papel”.
Reforma rende ganho político para Haddad superior ao de Lula
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi beneficiado com o avanço de uma pauta complexa e estratégica para sua gestão. Dentro do governo, contudo, o maior vitorioso foi o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que liderou ao lado de Lira as negociações pela PEC 45/2019, proposta que agora está a caminho do Senado. Lá, o debate se centrará no tema federativo, até a aprovação final neste semestre com possíveis ajustes.
Chefe da equipe econômica de Lula e apontado como potencial candidato à Presidência, Haddad tem na aprovação da reforma tributária um trunfo pessoal. Isso porque ele a tratou como prioridade do governo neste ano e se empenhou em sua articulação. Nesse processo, o ministro procurou colocar-se como conciliador, deixando o Legislativo como o responsável pela PEC.
Essa postura lhe rendeu ganhos de reputação no mercado e facilitou o consenso com atores envolvidos. “Após décadas, aprovamos uma reforma tributária democraticamente. Parecia impossível. Valeu lutar”, disse.
Apoio de Tarcísio de Freitas à PEC irrita Bolsonaro
Por insistir em tentar barrar a reforma, Jair Bolsonaro e a bancada de seu partido, o PL, ficaram isolados e politicamente derrotados. Ao final, 20 dos 99 deputados da bancada, a maior dentre as legendas na Câmara, votaram a favor da proposta, contrariando a orientação do ex-presidente. Os que votaram contra a PEC demarcam até onde vai a influência dele.
Arthur Lira tentou contatar Bolsonaro para buscar um recuo, mas não teve resposta. “Parabéns aos 20 deputados do PL que votaram como eu a favor da reforma, que não é do governo, mas dos Brasil”, disse o deputado Luciano Alves (PSD-PR) durante o segundo turno da votação.
A PEC aprovada na Câmara cria o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) para unificar o ICMS (estadual) e o ISS (municipal) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) para reunir os impostos federais PIS, PIS-Importação, Cofins e Cofins-Importação.
Pelo modelo proposto, caberá ao Conselho Federativo fazer a gestão do IBS. O relator atendeu às demandas de governadores, liderados pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), para aprimorar a composição e a rotina do colegiado e a gestão do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR), que terá como recursos até R$ 40 bilhões.
A abertura de Tarcísio em favor da reforma, sinalizada ao lado do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, com quem se reuniu na quarta-feira (5), serviu para deslanchar a votação. Ao sair do encontro, Tarcísio disse que concordava com 95% da proposta e não seria um obstáculo à aprovação. Seu gesto gerou grave desconforto com Bolsonaro e com os parlamentares de oposição mais ligados a ele.
Essa tensão ficou explícita durante reunião do PL na manhã da quinta-feira (6), com as falas de desentendimento entre Tarcísio e o ex-presidente se espalhando em vídeos pelas redes sociais. Na véspera, o partido do governador de São Paulo fechou questão pela PEC. O relator Aguinaldo Ribeiro considerou o apoio de Tarcísio uma “posição serena e democrática”.
Ao se posicionar de forma crítica, mas não intransigente, o governador de São Paulo mirou ganhos da reforma e ampliou a sua independência política em relação à parcela da direita mais ligada a Bolsonaro.
O ex-presidente, por sua vez, ao se colocar 100% contra a reforma, ficou dependente de questionamentos jurídicos e improváveis repercussões negativas no mercado após a sua aprovação. A bancada do PL terá de digerir internamente a dissidência. Os líderes do Centrão, grupo majoritário da Câmara, conseguiram, por sua vez, mostrar de novo força e seu peso para votações de interesse do governo.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) afirmou que não houve briga entre seu pai e o governador Tarcísio. "É um clima obviamente amistoso e de se buscar uma unidade do discurso. Isso é comum dentro de partidos aliados. Obviamente que a partir do momento em que algumas pessoas fazem filmagem de uma coisa que está sendo debatida ali com franqueza, cada um colocando seu ponto de vista, isso acabou sendo explorado como uma forma de divisão na direita e eu quero aqui em público dizer que não existe isso", ponderou.
Especialistas veem erros na estratégia de Bolsonaro
Segundo o cientista político Leandro Gabiati, a avaliação da aprovação da reforma tributária vai além do simples embate entre governo e oposição. “Isso ficou evidente quando importante grupo de governadores oposicionistas apoiou o texto aprovado”, disse. Ele observou que a parcela da oposição mais ideológica e alinhada a Bolsonaro tentou rotular a PEC como algo meramente governista, mas saiu desgastada.
Por outro lado, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), se envolveu profundamente nas negociações e colheu benefícios políticos. “Tarcísio se apresentou como nova referência da oposição, disposto a buscar soluções e a negociar em nome de outros governadores, o que também o coloca como uma grande liderança nacional”, disse.
No entanto, Gabiati destacou que o principal destaque da aprovação da reforma foi mesmo Arthur Lira, pois ele liderou o processo com coragem, enfrentando embates diretos e deixando a sua marca pessoal nele. O especialista argumentou que Lula perdeu a chance de aproveitar politicamente a aprovação da reforma ao escolher não liderar o processo, deixando os méritos para Lira e Haddad, nesta ordem de importância. “De qualquer forma, Lula encerra bem o primeiro semestre e pode explorar a ideia de que conseguiu aprovar uma reforma muito mais desafiadora do que as questões que terá que lidar pelo restante do ano”.
Agenda econômica traz menos chance de desgastar o Planalto
Arthur Wittenberg, professor de relações governamentais e políticas públicas do Ibmec-DF, considerou que Bolsonaro foi o principal perdedor político na aprovação da reforma, devido a um erro estratégico primário. “Mesmo sabendo que o PT tem tido mais chances de obter consenso em questões econômicas que visam o avanço da competitividade do país, Bolsonaro optou por se opor a algo com grande probabilidade de ser aprovado, ignorando até mesmo qual era o tema em discussão”, disse.
O resultado foi, então, as derrotas em ambos os aspectos. Além de presenciar a aprovação da proposta com ampla margem de votos, ele causou um abalo dentro da bancada do PL e na aliança com o governador de São Paulo, seu ex-ministro Tarcísio de Freitas. Seu partido, que tem o maior número de deputados, não conseguiu impedir a votação na Câmara e ainda expôs divergências internas.
“O ex-presidente não deveria ter iniciado uma briga num momento como esse e poderia até mesmo se apropriar do processo, lembrando que a discussão da reforma já havia avançado durante sua gestão e que gostaria de contribuir para melhorar a proposta”, comentou.
Segundo Wittenberg, ao adotar uma postura de oposição extrema, Bolsonaro tentou mostrar seu capital político para bloquear iniciativas, enquanto sua liderança deveria estar direcionada para outras áreas, como questões de costumes e não econômicas, a menos que envolvam temas estatizantes.
Defensor histórico da reforma tributária, o deputado Luiz Carlos Hauly (Podemos-PR) lembrou que o tema vinha sendo discutido pela Câmara há mais de 30 anos. Ele ressaltou que o sistema atual pune o consumidor e sua alteração vai “tirar o Brasil do capitalismo selvagem na direção de uma real e civilizada economia de mercado, com atração de investimentos”, disse. Ele disse esperar que, num primeiro momento, a avaliação de risco da dívida do país deve cair e o produto interno bruto (PIB) dobrar em 15 anos.
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