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Encontro de diplomatas

Brasil escanteia moeda dos Brics após ameaças de Trump, mas estuda outras formas de desdolarização 

Lula - Xi Jinping - China - Brasil - PT
O presidente do Brasil, Lula, e o ditador da China, Xi Jinping, se encontraram neste mês em Brasília (Foto: EFE/EPA/KEN ISHII)

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O Brasil vai sediar nesta terça (26) e quarta-feira (27) a primeira reunião dos Brics sob sua presidência e, de acordo com o Itamaraty, discussões para a criação de uma moeda dos Brics estão descartadas. O tema já havia sido alvo de ameaças de Donald Trump, que ameaçou taxar e retaliar os países do bloco que aderissem à moeda. Apesar da escalada de tom do republicano, o grupo não deve abandonar estratégias de diminuir a utilização do dólar, como um sistema de pagamentos alternativo para operar com moedas já existentes de países do bloco.

O encontro dos Brics não vai reunir chefes de Estado e governo. Ele é uma preparação que envolve apenas diplomatas para um encontro maior envolvendo as lideranças dos países do bloco ainda neste ano.

“A moeda, nesse momento, não está sendo discutida, porque não há acordo sobre o tema. O fato de que o presidente brasileiro defenda isso, é a visão de um governo sobre o tema e não quer dizer que, nesse momento, ele vai ser discutido [...] Mas nada impede que os presidentes discutam a possibilidade [de criar uma moeda dos Brics] em um horizonte mais distante”, informou Maurício Lyrio, diplomata brasileiro nos Brics, o bloco originalmente formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, e que atualmente agrupa mais de 20 nações emergentes como Irã, Indonésia e Cuba.

De acordo com a imprensa russa, a criação de uma moeda do grupo foi discutida entre os líderes do bloco no ano passado, durante a Cúpula de Líderes dos Brics que ocorreu em Kazan, na Rússia. Após o encontro, o ditador russo, Vladimir Putin, que presidiu o grupo ao longo de 2024, chegou a mostrar uma cédula simbólica da moeda. 

Apesar do governo brasileiro descartar a possibilidade de criar uma moeda dos Brics neste momento, sua criação já vinha sendo debatida dentro do bloco. “A criação de uma nova moeda única dentro da estrutura da associação é o que a Rússia e o Irã estão trabalhando”, disse o embaixador iraniano na Rússia, Kazem Jalali, em maio do ano passado.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também chegou a defender tal criação. Em declaração feita em 2023, após a Cúpula dos Brics realizada na África do Sul, o petista afirmou que a moeda facilitaria a vida das pessoas. “O que nós queremos é criar uma moeda que permita que a gente faça negócio sem precisar comprar dólar [...] Nós resolvemos criar uma moeda, porque isso facilita a vida das pessoas, mas nós não queremos pressa porque não é uma coisa simples de fazer”, declarou. 

Antes mesmo de tomar posse, o presidente Donald Trump havia ameaçado taxar os países dos Brics que levassem adiante a criação de uma moeda do bloco ou meios de reduzir o uso do dólar. “Exigimos que esses países se comprometam a não criar uma nova moeda do Brics nem apoiar qualquer outra moeda que substitua o poderoso dólar americano ou eles enfrentarão 100% de tarifas e deverão dizer adeus às vendas para a maravilhosa economia norte-americana", escreveu Trump em uma rede social.

Até o momento, o líder americano não implementou taxas direcionadas aos Brics, mas já cumpriu promessas de taxações. Neste mês, Trump oficializou a aplicação de uma tarifa de 25% às importações de aço e de alumínio aos Estados Unidos, que entrará em vigor em 12 de março. Ainda que a medida tenha como um de seus principais alvos a China, que atualmente produz mais aço e alumínio que todo o restante do mundo, as novas alíquotas também vão atingir a indústria brasileira e outros países.

Brasil vai insistir em iniciativas como o Brics Pay 

O Brasil sedia os Brics neste ano e conduz as discussões do bloco, que tem avançado em discussões sobre o uso de moedas locais para transações comerciais entre seus membros.

A iniciativa tem o intuito de minimizar a dependência do dólar e questionar a hegemonia norte-americana no comércio internacional. Nesse sentido, o Brasil pretende avançar com a implementação de iniciativas como o Brics Pay, uma plataforma de pagamentos desenvolvida pelo grupo nos últimos anos e que faz transações comerciais sem o dólar.

A ideia do sistema Brics Pay é substituir o SWIFT, um sistema de mensagens de pagamentos bancários que viabiliza a maioria das transações de comércio internacional do planeta. Analistas entendem que esse sistema de pagamentos também é uma das ferramentas que Trump ameaçou com taxações, embora o presidente americano não tenha citado o Brics Pay nominalmente.

Nesta semana, durante a reunião de sherpas dos Brics, o tema vai ser colocado na mesa pelo governo brasileiro para ser discutido com os negociadores do grupo. Conforme informou o embaixador Maurício Lyrio, diplomata brasileiro nos Brics e secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros do Itamaraty, a presidência brasileira deseja definir formas de reduzir os custos do comércio entre os países que formam o bloco a fim de intensificar a transação entre eles.

"O que está sendo discutido são formas reduzir os custos de operações comerciais e financeiras dos países dos Brics, que é uma coisa fundamental [...] para o comércio intra-Brics, que ainda há um potencial grande, mas está aquém do potencial dos próprios produtos desses países. Uma das formas de intensificar essas relações comerciais e financeiras, é justamente reduzir o custo de operações", pontuou Lyrio. Para analistas, contudo, a iniciativa pode voltar a colocar esses países na mira de Donald Trump.

Presidência brasileira nos Brics não quer priorizar diálogos geopolíticos 

Em meio a um cenário geopolítico conturbado, com a guerra entre Rússia e Ucrânia completando três anos e no contexto do conflito no Oriente Médio entre Israel e Hamas, o governo brasileiro não planeja priorizar discussões geopolíticas durante a presidência brasileira nos Brics.

“A intenção do Brasil é chamar a atenção da comunidade internacional para as questões sociais, econômicas e ambientais, não geopolíticas”, disse Lyrio. De acordo com o sherpa brasileiro nos Brics, a determinação do presidente Lula é de que os grupos avancem em temas sociais e que os embates geopolíticos não travem o avanço desses temas.

Como exemplo, o embaixador citou a Cúpula de Líderes do G20 que o Brasil sediou no Rio de Janeiro no ano passado. O Brasil presidiu o grupo ao longo de 2024 e, apesar das posições antagônicas de membros do bloco sobre as guerras em curso no mundo, o governo brasileiro obteve unanimidade das nações em temas considerados caros para Lula.

Durante a cúpula, o Brasil lançou a Aliança Global Contra a Fome e todos os países aderiram à iniciativa. Os 20 países, a União Europeia e a União Africana, também concordaram com os termos da declaração final do encontro e assinaram o documento. O governo brasileiro espera conquistar o mesmo objetivo na Cúpula de Líderes dos Brics.

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