Após um "longo inverno", a Câmara dos Deputados reinstalou, em abril deste ano, a comissão especial que debate a PEC da prisão em segunda instância. A proposta de emenda nº 199/19 altera a Constituição para definir que o trânsito em julgado de uma ação — quando não há mais possibilidade de recurso — se dá após a condenação em duplo grau judicial. Assim, a execução imediata da pena aplicada pelo juiz de primeira instância e confirmada por um colegiado de segunda instância passaria a ser obrigatória.
A comissão especial havia interrompido suas atividades em função da pandemia do novo coronavírus. Com a reabertura, o deputado Aliel Machado (PSB-PR) assumiu a presidência, no lugar de Marcelo Ramos (PL-AM), que foi eleito vice-presidente da Câmara e precisou se afastar dos trabalhos.
“Com a mudança nos quadros da comissão, estamos esperando a recomposição da formação. Talvez ocorram ajustes pontuais, mas o texto está praticamente pronto para ser lido e votado na comissão”, diz Machado, sobre o parecer do deputado Fábio Trad (PSD-MS), apresentado em setembro de 2020.
Machado informa que, neste momento, por uma questão estratégica, não tem pressa em acelerar a tramitação. “A PEC já passou pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, o que é muito importante. Mas, para chegar ao plenário com força, precisa de apoio popular. E neste momento o assunto não está na pauta, em função da segunda onda de Covid e da CPI da Pandemia. Preferimos aguardar dois ou três meses para garantir que o tema esteja em voga”, explica.
Enquanto isso não ocorre, a comissão realizou uma audiência pública no mês passado com advogados e juristas para discutir a PEC da prisão em segunda instância. A expectativa é que o relatório seja lido e votado no segundo semestre.
A PEC 199/19 foi apresentada em novembro de 2019, logo depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que um condenado só poderia começar a cumprir pena depois do trânsito em julgado do processo. A decisão, na época, possibilitou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula de Silva (PT) deixasse a prisão. A prisão em segunda instância foi um dos motores da Operação Lava Jato e levou para cadeia diversos condenados pelos tribunais revisores.
PEC da prisão em segunda instância faz mudança expressiva na Constituição
O artigo 5º, inciso LVII, da Constituição diz que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória". Uma proposta anterior, a PEC 410/2018, queria mudar justamente esse ponto, mas ela acabou apensada à PEC 199/19, que adota outra estratégia: modificar os artigos 102 e 105 da Carta Magna. Ambos os projetos são de autoria do deputado Alex Manente (Cidadania-SP).
O texto original da PEC 199 acabava com o recurso extraordinário apresentado ao STF e o recurso especial no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Mas o parecer do relator propôs outro caminho: os recursos extraordinários e especiais são mantidos, mas com a redação expressa de que o trânsito em julgado termina após a confirmação da condenação em segundo grau.
Hoje, os tribunais de segunda instância, como os Tribunais Regionais Federais (TRFs) e os Tribunais de Justiça (TJs) estaduais, revisam as decisões de juízes de primeira instância. A possibilidade de estes recursos seguirem até o STJ e o STF pode adiar o trânsito em julgado por muitos anos — há, inclusive, casos de prescrição. A PEC mudaria essa situação.
Na prática, a PEC antecipa os efeitos do chamado trânsito em julgado, ou seja, a sentença da qual não se pode mais recorrer. No lugar de aguardar o julgamento de possíveis recursos nas instâncias superiores, a proposta define que o cumprimento da pena (que pode ser de prisão) começa após a condenação em primeira instância ser confirmada pelos TJs dos estados e pelos TRFs.
"O que se propõe no texto é dispor que o recurso extraordinário e o recurso especial não obstam o trânsito em julgado da decisão recorrida. Dessa forma, esgotados os recursos nas instâncias ordinárias, a sentença penal condenatória transitará em julgado", explica ele no parecer.
"A possibilidade de execução da pena após o esgotamento das instâncias ordinárias, portanto, decorreria do próprio trânsito em julgado da condenação. Não haveria qualquer afronta, destarte, à regra constitucional de que 'ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória'”, completa.
Trad incluiu no relatório ainda a informação de que a emenda só terá valor para os processos iniciados após a promulgação da PEC da prisão em segunda instância. Caso os fatos que deram início à acusação tenham ocorrido antes, a alteração não será aplicada. O relator também ampliou o alcance da emenda para além das ações penais: ele sugere deixa expresso no texto constitucional que também devem seguir essa mesma lógica ações trabalhistas e eleitorais.
Insegurança jurídica
O Supremo Tribunal Federal já modificou quatro vezes seu entendimento sobre o tema. A aprovação de uma alteração na Constituição poderia encerrar essas mudanças de interpretação da lei.
“Atualmente, a pessoa pode postergar as suas condenações até o trâmite em julgado na quarta instância. Infelizmente, só ricos e poderosos conseguem postergar as suas condenações. O cidadão comum não consegue chegar às terceira e quarta instâncias. E sempre são instrumentos apenas postergatórios”, diz Manente.
Um dos deputados que se manifestou contrário à PEC foi Paulo Teixeira (PT-SP). “Defendemos o sistema atual, isto é, que a pessoa condenada em segunda instância possa recorrer no STJ ou no Supremo para corrigir eventuais equívocos de sua condenação. O fato é que hoje as correções são muito grandes, principalmente quando são feitas a favor dos pobres pela Defensoria Pública. Por isso, somos contra mudar o princípio constitucional da presunção de inocência", disse.
Para o presidente da comissão que avalia a PEC da Câmara, o Congresso falhou sobre esse assunto. “O STF muitas vezes tem uma atuação política e gerou insegurança jurídica com as mudanças de posição sobre o tema. Mas o Legislativo tem sua parcela de responsabilidade por não ter votado antes essa lei”, avalia Aliel Machado.
O que explica o rombo histórico das estatais no governo Lula
Governo Lula corre para tentar aprovar mercado de carbono antes da COP-29
Sleeping Giants e Felipe Neto beneficiados por dinheiro americano; assista ao Sem Rodeios
Flávio Dino manda retirar livros jurídicos de circulação por conteúdo homofóbico
Triângulo Mineiro investe na prospecção de talentos para impulsionar polo de inovação
Investimentos no Vale do Lítio estimulam economia da região mais pobre de Minas Gerais
Conheça o município paranaense que impulsiona a produção de mel no Brasil
Decisões de Toffoli sobre Odebrecht duram meses sem previsão de julgamento no STF
Deixe sua opinião