O vice-presidente da CPI da Covid do Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), e o relator da comissão, Renan Calheiros (MDB-AL), avaliam que a série de depoimentos feitos ao colegiado até o momento, o que inclui a fala do ex-ministro Ernesto Araújo (Relações Exteriores) nesta terça-feira (18), deixa o ex-ministro Eduardo Pazuello, que comandou a Saúde até março, na situação de "bode expiatório" do governo federal. Os parlamentares também acreditam que o pedido de silêncio que Pazuello fez ao Judiciário pode trazer efeitos prejudiciais ao próprio ex-integrante do governo de Jair Bolsonaro.
"O que está sendo feito com ele [Pazuello] é um ato de covardia", disse Randolfe. O senador declarou que pretende perguntar ao ex-ministro se ele "foi o responsável por tudo isso", em referência ao que considera equívocos do governo federal no combate à pandemia de coronavírus. Calheiros chamou Pazuello de "testemunha principal" da comissão e disse ver o governo "transferir responsabilidade" para o ex-ministro — algo que, para o emedebista, deveria estimulá-lo a falar ainda mais aos senadores.
O depoimento de Pazuello à CPI está previsto para esta quarta-feira (19). A fala estava inicialmente agendada para o dia 5 e seria a terceira da comissão, após os depoimentos dos também ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich. Pazuello pediu o adiamento naquela semana sob a alegação de que havia estado em contato com pessoas que contraíram o novo coronavírus. Mas, na última sexta-feira (14), teve um habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que deu a ele o direito de ficar em silêncio diante de algumas perguntas feitas pelos membros da CPI e também a garantia de que ele não será preso em virtude do depoimento.
A avaliação de Calheiros de qualificar Pazuello como "testemunha principal" da CPI se deu por, entre outros fatores, posicionamentos apresentados pelo ex-ministro Ernesto Araújo. O antigo titular das Relações Exteriores afirmou, em mais de um momento de sua fala nesta terça, que suas ações ligadas à pandemia representavam o cumprimento de decisões estabelecidas pelo Ministério da Saúde.
Neste conjunto estão algumas decisões criticadas pelos senadores, como o estímulo à compra de cloroquina, medicamento sem eficácia comprovada contra a Covid-19, e a adesão mínima do Brasil ao consórcio Covax Facility, que possibilitou ao país ter uma quantidade de vacinas inferior ao que poderia ter sido alcançado.
Araújo foi confrontado por ignorar ajuda da Venezuela e gastar R$ 500 mil em viagem a Israel
A fala de Ernesto Araújo, porém, não se restringiu a casos que comprometeram Eduardo Pazuello. O ex-chanceler apresentou respostas que, na avaliação de senadores, prejudicaram sua própria reputação na luta contra a pandemia.
Um episódio bastante explorado pelos senadores foi o imbróglio com a Venezuela para a busca de oxigênio oferecido pelo país comandado por Nicolás Maduro em janeiro, quando o Amazonas viveu sua pior crise durante a pandemia. Na ocasião, o país vizinho ofereceu a doação de cilindros de oxigênio — suprimento que estava em falta em Manaus — e houve um impasse sobre o modo como os insumos chegariam ao Brasil. Senadores disseram que Araújo poderia ter acionado um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) para buscar o oxigênio, mas não o fez. A carga veio transportada por um caminhão, o que atrasou a entrega e, na avaliação do presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), levou a mortes que poderiam ter sido evitadas. "Uma simples ligação de vossa excelência poderia ter salvo muitas vidas", disse o senador.
O governo da Venezuela tem viés de esquerda e é tratado como inimigo pelo governo Bolsonaro. Senadores acusaram Araújo de ter se recusado a conversar com autoridades venezuelanas por "questões ideológicas". O ex-chanceler confirmou que não empenhou esforços para o envio de um avião e também que não agradeceu a Venezuela pelo material.
Araújo foi também confrontado sobre a viagem que fez a Israel em março, com objetivo de coletar mais informações sobre o spray nasal contra a Covid-19 que estava sendo desenvolvido por cientistas israelenses. A delegação contou com a presença de membros do governo não relacionados à área da saúde e também com a dos deputados Hélio Lopes (PSL-RJ) e Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), respectivamente amigo e filho do presidente da República.
Senadores questionaram Araújo sobre a eficácia da viagem, visto que o spray se encontra ainda em caráter experimental e os custos do deslocamento foram estimados em mais de R$ 500 mil. O senador Renan Calheiros disse não compreender o motivo de ter sido "difícil" enviar um avião para a Venezuela, mas "fácil" remeter a aeronave ao Oriente Médio.
Próximos passos da CPI
A CPI aprovou nesta terça-feira a convocação de Elcio Franco, ex-secretário executivo do Ministério da Saúde. Ele ocupou o cargo durante a gestão de Eduardo Pazuello e foi o principal interlocutor da pasta com a farmacêutica Pfizer, segundo o executivo da empresa Carlos Murillo, que falou à CPI na semana passada. Franco deve falar à comissão na semana que vem.
Outra presença aprovada pela CPI foi a do secretário de Saúde do Amazonas, Marcellus Campelo. A crise da falta de oxigênio no estado foi um dos fatores que levou à instalação da comissão.
Em entrevista à imprensa, Randolfe e Calheiros foram questionados sobre a presença de governadores de estado no colegiado — requerimentos pedem a coleta de depoimentos de João Doria (PSDB-SP), Helder Barbalho (MDB-PA) e Wilson Lima (PSC-AM), entre outros nomes. O relator disse não descartar a ida dos gestores estaduais à CPI, mas afirmou que a comissão trabalha com uma "ordem de prioridade", e que a investigação sobre eventuais falhas do governo federal estaria na frente.
Randolfe expôs que o objetivo principal da CPI é investigar o que ainda não está sob apuração, e que desvios de recursos nos estados e municípios encontram-se no radar de entidades como Ministério Público e Polícia Federal.
Randolfe declarou ainda que a CPI ainda não tomou uma decisão sobre a convocação do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos). A presença do filho do presidente foi requerida pelos senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Humberto Costa (PT-PE). Carlos foi citado em depoimentos como membro de uma "assessoria paralela" que operaria no Palácio do Planalto para passar ao presidente informações sobre a pandemia que contrariariam o determinado pelo Ministério da Saúde. Aí se incluem exemplos como o estímulo ao tratamento precoce e o boicote ao isolamento social e ao uso de máscaras.
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