Mais do que limitar o acesso, o novo decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) aumenta as restrições à potência das armas que podem ser compradas pela população. De acordo com o texto, armas cuja munição comum tenha, na saída do cano, energia acima de 407 joules são consideradas restritas. Com isso, o calibre 38 especial entra na restrição e, em tese, pode tornar o revólver mais popular do Brasil uma arma de uso restrito a agentes de segurança pública e Forças Armadas.
De acordo com a Portaria 1.1222/2019, editada pelo Exército, o calibre 38 especial (SLP) possui 437,88 joules, 30 joules acima do permitido pelo novo decreto. A categoria desse 38 também é a mais comum entre forças de segurança pública e empresas de segurança privada.
O promotor de Justiça Criminal e autor de livros sobre armamento, Luciano Lara, explica que o governo tem potencial para colapsar o sistema de segurança privada no Brasil com o novo decreto.
“Por conta dessa definição, desde sexta-feira, todas as empresas de segurança privada que usam o 38 estão irregulares. E todos os seguranças e agentes patrimoniais que usam esse revólver estão incidindo em porte ilegal de armas de uso restrito. A pena prevista do artigo 16 (Lei das Armas – 10.826/2003) para esse tipo de crime é de três a seis anos de reclusão, inafiançável. E ainda é crime hediondo. O governo conseguiu colapsar todo o sistema de defesa patrimonial do Brasil”.
O decreto não estipula especificamente quais calibres são permitidos e quais passam a ser restritos. O Ministério da Justiça foi procurado mas não respondeu à reportagem.
Na opinião de Luciano Lara, o decreto também afeta a segurança do próprio governo.
“Eu participei das reuniões do grupo de trabalho que discutiu o decreto. Em nenhuma delas foi colocada a restrição de calibre", afirmou. Segundo ele, a Receita Federal, que também tem agentes armados, teria dito que sairia prejudicada. Isso porque o órgão não é classificado como uma força de segurança, nem como força policial, e ficaria impedido de usar seu próprio armamento, de calibre 9mm.
Em comunicado interno que foi vazado para fontes do setor, a Polícia Federal divulgou algumas medidas que já deve começar a tomar. Entre elas estão: indeferir novos pedidos de aquisição de armas de fogo de uso restrito e continuar renovando licenças antigas e regulares de armas de calibre 9 mm. Outra orientação é que policiais não podem comprar mais que duas armas e elas não podem ser de uso restrito.
Questionada pela reportagem se já começou a assumir as responsabilidades que eram do Exército, a PF respondeu que só o Ministério da Justiça poderia responder sobre o assunto. A pasta não respondeu ao questionamento.
Oposição quer mudar decreto de Lula
Em vídeo para as redes sociais, nesta terça-feira (25), o presidente da Frente Parlamentar da Segurança Pública, Alberto Fraga (PL-DF) anunciou que protocolou um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) que pode anular os artigos 11 e 12 do decreto assinado por Lula. Ambos tratam das restrições de calibres e munições.
“Negociamos esse texto com o Ministério da Justiça. Porém o texto faz um retrocesso ao proibir a venda de pistolas 9 mm, isso vai asfixiar os comerciantes e provocar demissões em massa. Cerca de 90% da comercialização é de calibre 9mm. Fizemos um projeto de decreto legislativo para suprir esse artigo que restringe a 9mm. Não adianta tentar derrubar o projeto todo, temos que tentar negociar o que é possível. Não faz sentido ir para uma briga que não vai resolver nada”, disse o deputado.
Outros projetos de decreto legislativo protocolados pela oposição tentam derrubar o decreto por completo. Um exemplo é o texto proposto pelo senador Luis Carlos Heinze (PP/RS) na segunda-feira (24/7), que diz que o decreto extrapola a competência do governo ao se sobrepor a uma lei.
Fraga diz não acreditar ser possível derrubar todo o decreto de Lula. O parlamentar cita a força do governo no Senado para barrar qualquer iniciativa contrária ao Programa de Ação na Segurança.
“Alguns colegas entraram com projeto de decreto legislativo para suspender todo o decreto do governo. Temos que ser conscientes, não temos votos suficientes para derrotar o governo e mesmo que passe na Câmara, acabaria engavetado no Senado”, disse o deputado.
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