O Exército vem lançando mantimentos, água potável e combustível de paraquedas para atender aos indígenas Yanomami, em Roraima, em uma ação similar à ajuda humanitária que os Estados Unidos e seus aliados estão fazendo na guerra na Faixa de Gaza. Aproximadamente 1.700 lançamentos já foram realizados desde 17 de janeiro. A diferença em relação à guerra no Oriente Médio é que no Brasil são os militares e não os indígenas que recuperam as cargas lançadas dos aviões em uma área específica e depois as distribuem em cerca de 350 aldeias.
Na Faixa de Gaza, os Estados Unidos se uniram na semana passada a um esforço internacional, protagonizado principalmente pela Jordânia, para lançar alimentos de paraquedas para a população civil. Por causa da guerra contra o terrorismo do Hamas, a quantidade de ajuda humanitária que entra no território pelas estradas é insuficiente. Segundo a Organização Mundial da Saúde, há muitos casos de desnutrição e pode haver fome generalizada no norte de Gaza se a situação não for revertida.
Em Roraima, o Exército e a Força Aérea conduzem uma operação similar. Desde 17 de janeiro, a Operação Catrimani tenta cumprir a missão de entregar 15 mil cestas básicas para membros da etnia Yanomami que, segundo o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), estão sofrendo de desnutrição. A área é habitada por cerca de 27 mil indígenas (não apenas yanomamis). Até o dia 6 de março, 11.200 cestas haviam sido entregues.
"Essa é a maior operação de lançamento de cargas já realizada na América Latina. É maior até que as operações de lançamento de cargas que eram realizadas na Segunda Guerra", afirmou o general André Luís Novaes Miranda, comandante do Comando de Operações Terrestres do Exército.
Cargas não atingem indígenas porque lançamentos são em área isolada pelos militares
Nesta sexta-feira, na Faixa de Gaza, a operação humanitária conduzida pelos Estados Unidos e pela Jordânia foi alvo de críticas, pois resultou nas mortes de cinco pessoas. O paraquedas de uma das caixas de comida lançadas de um avião não abriu e a carga atingiu civis em solo.
Na região do conflito em Gaza não há forças militares controlando a aterrissagem da carga, os fardos de comida pousam de forma praticamente descontrolada em áreas repletas de pessoas à espera do alimento.
Em Roraima, o que obrigou as Forças Armadas a usarem o recurso do paraquedas é a geografia de selva da região onde estão os indígenas. As pistas de pouso locais permitem apenas o tráfego de pequenos aviões que transportam poucos passageiros e têm capacidade mínima de transporte de carga. A pista de pouso tem só 400 metros de extensão.
Por isso, aviões C-105 Amazonas, com maior capacidade de carga estão lançando a comida de paraquedas em uma área da base do Pelotão Especial de Fronteira de Surucucu (a 330 quilômetros de Boa Vista). Como a área é isolada antes dos lançamentos, o risco de acidentes com indígenas e ribeirinhos é muito mais baixo.
Os militares recolhem então as cargas e as embarcam em helicópteros militares que têm capacidade para pousar em clareiras na selva em aldeias isoladas. Porém, essa operação é extremamente perigosa, mas para os militares. Na quarta-feira, um helicóptero Pantera HM-1A acabou inutilizado em um acidente. A tripulação teve apenas escoriações.
Ao todo, sete helicópteros das Forças Armadas estão participando da operação e já realizaram cerca de 360 horas de voo.
Distribuição de cestas básicas deve passar a ser atribuição da Funai
Um dos primeiros atos políticos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao chegar ao poder em janeiro de 2023 foi apontar uma crise grave de desnutrição na Terra Indígena Yanomami, em Roraima.
Na época, Lula atribuiu a situação aguda a políticas do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). A culpa seria dos garimpeiros ilegais, que teriam poluído os rios dos indígenas, sem que Bolsonaro tomasse providências. Contudo, mais integrantes dessa etnia morreram durante o governo Lula em 2023 do que durante a gestão Bolsonaro em 2022. Segundo dados do Ministério da Saúde, foram 363 mortes em 2023 contra 343 em 2022.
Um levantamento da Gazeta do Povo mostrou que os dados desfavoráveis da saúde dos yanomami não são particularidade nem do governo de Bolsonaro nem de Lula. O problema de desnutrição é recorrente pelo menos desde os anos 2000.
Uma das primeiras medidas de Lula foi recorrer ao Ministério da Defesa para começar a distribuir cestas básicas, em uma operação que ocorreu entre 23 janeiro e 5 de junho de 2023, a Operação Yanomami.
Embora a desnutrição tenha sido remediada, o governo não conseguiu elaborar políticas duradouras de apoio aos indígenas. No final de 2023, fiscais da Funai fizeram uma paralisação e deixaram ir a campo para expulsar garimpeiros ilegais e dar assistência aos Yanomami.
Em janeiro deste ano, a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, reconheceu que o governo Lula falhou em resolver a crise yanomami. A solução encontrada pelo Executivo foi recorrer novamente às Forças Armadas para resolver o problema e a maior operação de lançamento de suprimentos da América Latina foi posta em marcha pelo Ministério da Defesa.
Entre 2023 e 2024, aproximadamente 707 toneladas de mantimentos foram levados pelos militares para a Terra Indígena Yanomami. Foram 29 mil cestas básicas, água potável e combustível, segundo o Exército.
Além disso, os militares estão construindo dois Destacamentos Especiais de Fronteira na região para dar condições de operação para agências civis operarem na região, que é inóspita.
A ideia é que a Funai tente assumir a partir de abril a tarefa de fornecer o alimento necessário aos Yanomami, contratando helicópteros da iniciativa privada para fazer o transporte. Há anos existem aeronaves privadas operando na região, mas para resgatar indígenas doentes e levá-los para hospitais na cidade, mas elas não levam mantimentos.
Os militares, por sua vez, devem permanecer na região, mas oferecendo apoio para órgãos civis fazerem fiscalização contra garimpeiros e madeireiros ilegais.
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