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Foz do Amazonas

Exploração de petróleo na Margem Equatorial vira alvo de barganha entre Lula e Alcolumbre

Alcolumbre e Lula
Presidente Lula e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil)

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A possibilidade de explorar petróleo na bacia da foz do rio Amazonas, na Margem Equatorial, entrou na negociação entre Davi Alcolumbre (União-AP) e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O petista desembarca nesta quinta-feira (13), em Macapá (AP), para um série de agendas no reduto eleitoral do parlamentar amapanese.

A expectativa no entorno de Alcolumbre é de que ele e o seu grupo político consigam explorar politicamente, junto aos seus eleitores, o início das pesquisas que podem levar à prospeção de petróleo na região. Lula tem objetivo similar.

O presidente precisa criar um fato positivo para seu governo, mas vinha enfrentando resistência dentro do PT em relação ao risco ambiental da exploração de petróleo na Margem Equatorial. A construção de uma aliança com Alcolumbre - tendo como moeda de troca a exploração petrolífera - pode facilitar a tramitação de pautas importantes para o partido no Senado e assim destravar resistências.

Nesta semana, por exemplo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, buscou Alcolumbre para apresentar a agenda prioritária da equipe econômica e que depende de aprovação no Senado.

"É um movimento calculado, em um momento que o presidente busca essa aproximação com Alcolumbre, justamente para tentar ter uma maior facilidade na aprovação da pauta prioritária nesses dois anos finais do governo Lula", explicou Érico Oyama, consultor político da BMJ Consultores Associados.

Segundo estimativas da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), o volume de recursos na área é de cerca de 30 bilhões de barris.

"É uma viagem que é um aceno dos dois lados. Por parte do presidente, porque essa ida ao estado ajuda a fortalecê-lo politicamente, traz visibilidade. E também não deixa de ser um aceno do Alcolumbre, que traz essa abertura para uma aproximação com o Lula", afirmou Oyama.

A exploração de petróleo na costa brasileira figura entre os principais planos da Petrobras. No planejamento estratégico, a companhia prevê investimento de US$ 3,1 bilhões para a perfuração de 16 poços na Margem Equatorial – área que se estende pela costa do Amapá, Pará, Maranhão, Piauí, Ceará e Rio Grande do Norte – no período de 2024 a 2028. Uma vez que a possível extração de petróleo comece, esses estados devem se beneficiar com recursos financeiros em royalties (direito de exploração) e suas economias devem ser diretamente beneficiadas.

Essa autorização para o início das pesquisas, no entanto, vem enfrentando resistências do Ministério do Meio Ambiente, chefiado por Marina Silva, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Na semana passada, o presidente do Senado levou a demanda ao presidente Lula, e o petista sinalizou que pretende resolver "pessoalmente" a questão e que o Brasil precisa da riqueza desses royalties.

Paralelamente ao alinhamento com Lula, Alcolumbre busca um acordo com o Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar manter a influência do Congresso sobre as emendas parlamentares. O senador foi um dos principais operadores das emendas de relator, apelidadas posteriormente de "orçamento secreto", entre 2019 e 2021, quando presidiu o Senado pela primeira vez.

De volta ao comando do Congresso Nacional, o senador já sinalizou que não pretende abrir mão dessa influência sobre a destinação dos recursos da União. Desde o ano passado, esse tem sido o principal tema de embate entre o Legislativo e o Judiciário.

"Essa é a grande questão do momento. Enquanto esse imbróglio das emendas parlamentares não for resolvido, outras agendas também ficam paralisadas, como a votação do Orçamento deste ano e a instalação de comissões permanentes no Senado e na Câmara, que são negociações todas elas interligadas", destacou o analista Érico Oyama.

Liberação da exploração pode amarrar aliança de Alcolumbre e Lula

Oficialmente, a agenda de Lula no Amapá tem como foco a inauguração de um campus do Instituto Federal, a entrega de cerca de 200 unidades do Minha Casa, Minha Vida e a transferência ao estado de terrenos que, atualmente, pertencem à União. Lula e Alcolumbre pretendem viajar no mesmo avião e desembarcar em Macapá juntos para esses atos políticos.

"Tem um detalhe que não é tão um detalhe assim, que é bem importante, é que os dois vão viajar na mesma aeronave. Então serão algumas horas ali onde eles vão poder conversar e alinhar várias pautas", salientou o analista político.

Uma dessas pautas é justamente a defesa de Alcolumbre e de outros parlamentares dos estados do Norte sobre a liberação das pesquisas para a exploração de petróleo na Margem Equatorial. A medida é defendida por diferentes grupos políticos, já que é vista como forma de desenvolvimento econômico e social daquela região.

"Esse é um tema muito mais de interesse do Davi Alcolumbre, pois pode beneficiar economicamente o estado dele. O Lula vive um momento delicado de relacionamento com o Congresso e, mesmo com um eventual desgaste com a Marina Silva [ministra do Meio Ambiente], ele prefere se manifestar a favor dessa exploração em prol de um bom relacionamento com o presidente do Senado", afirmou Oyama.

Nessa estratégia, Lula aproveitou uma entrevista nesta quarta-feira (12), à rádio Diário FM, de Macapá, para defender o tema e sinalizar que vai se reunir com representares do governo para que o Ibama acabe com esse "lenga-lenga".

"É isso que queremos [pesquisar se há petróleo na bacia da Foz do Rio Amazonas]. Se depois vamos explorar, é outra discussão. O que não dá é ficar nesse lenga-lenga", disse Lula.

Uma das alternativas discutidas dentro do Palácio do Planalto para tentar acelerar a liberação das pesquisas seria a troca do atual presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, aliado de Marina Silva. Um dos cotados para o cargo é o atual ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Márcio Macêdo. 

"O Ibama é um órgão do governo, parecendo que é um órgão contra o governo. Não é que eu vou mandar explorar o petróleo no Amapá, eu quero explorar. Mas, antes de explorar, nós precisamos pesquisar", completou Lula.

Além disso, o presidente aproveitou para fazer acenos a Alcolumbre e ao grupo político do amapaense. "Estou muito feliz de ter o Alcolumbre como presidente do Senado, acho que ele vai ajudar a gente a dinamizar as políticas que precisam ser feitas nesse país. Ele compreende bem o Brasil, ele é de um estado pequeno do Norte do país, ele sabe das dificuldades", afirmou o petista.

Autor do pedido de instalação da Frente Parlamentar em Defesa da Exploração de Petróleo na Margem Equatorial do Brasil, o senador Zequinha Marinho (Podemos-PA) defende que a chegada de Alcolumbre ao comando do Congresso vai fortalecer a pressão para que essa autorização aconteça por parte do governo.

"A bancada da Amazônia estará mais fortalecida para defender os interesses da região e romper com os desafios postos há décadas", afirmou Marinho ao destacar o peso do presidente do Senado nas negociações.

Segundo o parlamentar, a expectativa é de que a região Norte se desenvolva assim como a Guiana Francesa, que pertence à França e faz fronteira como o Amapá.

"Desde que eles descobriram petróleo em seu território, o país tem vivido um acelerado processo de crescimento econômico. De acordo com o Banco Mundial, no ano de 2023, a Guiana registrou o maior crescimento de PIB no mundo, de 44% e um valor de US$ 40 bilhões. Isso pode ocorrer numa escala ainda maior aqui na Margem Equatorial brasileira", ressaltou Zequinha Marinho à Gazeta do Povo.

Integrante da oposição, a deputada Silvia Waiãpi (PL-AP) defende a exploração, mas crítica a tentativa do governo de faturar politicamente neste momento, tendo em vista que a pesquisa já poderia ter sido liberada há anos.

"O governo brasileiro vai liberar. Não pelo Davi [Alcolumbre], não por mim, mas pela sua própria economia. Em 2027, nós não teremos mais reserva alguma [de petróleo] e o Brasil vai precisar continuar buscas por novas reservas. Neste momento eles preservam a árvore, preservam o possível ecossistema, mas condenam o ser humano à morte, à pobreza, à subserviência e crianças são condenados a exploração sexual [na região]", argumentou Silvia Waiãpi à Gazeta do Povo.

Presidente do Senado pretende manter influência sobre as emendas parlamentares

Além de ampliar o capital político em seu reduto eleitoral por meio da exploração de petróleo, Alcolumbre pretende ainda se colocar à frente das negociações do Congresso com o STF no embate sobre as emendas parlamentares. Ele e o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), vão se reunir com o ministro Flávio Dino no próximo dia 27 justamente para tentar uma conciliação sobre o tema.

As emendas são um dos principais instrumentos de poder no cenário político atual. Por meio delas, parlamentares disputam com o Executivo a capacidade de determinar a destinação do Orçamento da União. Elas são usadas por deputados e senadores para mandar recursos para suas bases eleitorais.

Alcolumbre, no entanto, volta ao comando do Congresso em meio ao impasse com o STF sobre a falta de transparência na destinação desses recursos durante os últimos anos.

Além de determinar o bloqueio das emendas no ano passado e cobrar mais regras de transparência, o ministro Flávio Dino ordenou a abertura de um inquérito para apurar supostas irregularidades nos últimos anos.

Como mostrou a Gazeta do Povo, a Polícia Federal apura as suspeitas de ilegalidades que podem envolver membros de até 13 partidos em 17 estados brasileiros, incluindo o União Brasil, sigla de Davi Alcolumbre. A expectativa agora é de que tanto o senador quanto o presidente da Câmara busquem um acordo sobre o tema.

“O controle da execução de toda e qualquer transferência de recursos da União sempre seguiu critérios técnicos e orçamentários exigidos pela nossa legislação, que pode e deve sempre passar por um processo de aperfeiçoamento caso seja necessário”, defendeu Alcolumbre, nesta terça-feira (11), durante encontro de novos prefeitos em Brasília.

A estratégia de acordo passa por atender aos critérios de transparência cobrados pelo Judiciário, sem abrir mão do montante no Orçamento. O total de emendas parlamentares em 2024 foi de R$ 44,67 bilhões, por exemplo.

“No plano federal, ninguém é mais qualificado para atender às particularidades de cada canto deste país do que os deputados e os senadores, que são, diariamente, os interlocutores e representantes da nossa população no Poder Legislativo brasileiro”, opinou Alcolumbre.

Em dezembro do ano passado, um relatório da Controladoria-Geral da União (CGU) apontou que o Amapá tem cinco das dez cidades mais beneficiadas com emendas parlamentares, proporcionalmente ao seu número de habitantes. A cidade campeã foi Tartarugalzinho (AP), que tem 12,9 mil pessoas e recebeu R$ 87 milhões entre 2020 e 2023.

Em seguida, aparecem Pracuúba e Cutias, também no Amapá, que tem 3,8 mil e 4,4 mil habitantes, respectivamente, e receberam R$ 24 milhões e R$ 27 milhões. Do total de municípios que integram a lista no estado, quatro são administrados por prefeitos do União Brasil, legenda comandada regionalmente por Alcolumbre.

Em 2024, o senador repassou diretamente aos municípios do interior do Amapá R$ 71,1 milhões, segundo dados do Siga Brasil, sistema de acompanhamento do orçamento federal mantido pelo Senado.

Apesar disso, a capital - Macapá -, que concentra mais da metade da população do estado, não recebeu nenhuma parte desse montante. A cidade é administrada por um desafeto de Alcolumbre na região, o prefeito Antônio Furlan (MDB).

"O Alcolumbre já mandou o recado que considera esse tema importante ao citar nominalmente a questão das emendas. Por ser um tópico muito importante, justamente por tratar de destinação de verba para suas bases, ele é tratado como prioridade. Enquanto não houver uma solução, o Congresso tem paralisado outras outras negociações que são tão importantes quanto", explicou Oyama.

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