A vitória de Donald Trump nas eleições americanas, nesta terça-feira (5), voltou a animar a oposição brasileira sobre as possibilidades políticas e jurídicas que o grupo pode obter com o apoio do novo presidente americano. Com uma maioria republicana se formando no Congresso americano, parlamentares desejam fazer novas visitas ao Capitólio para dialogar com congressistas sobre medidas contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e em defesa dos presos de 8 de janeiro.
A nova rodada de viagens ainda não foi discutida formalmente na oposição, mas a presença do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) no comitê de campanha de Trump, durante a apuração dos votos, indica que a cúpula da oposição deve agir rapidamente. De acordo com o deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO), os congressistas de direita já estão planejando ir à posse do novo presidente americano, marcada para janeiro de 2025.
“Donald Trump de volta à Casa Branca é mais que uma vitória. É um sopro de alívio para todos que entendem que nossas liberdades correm sério risco em todo o mundo e, de modo especial, no Brasil, onde ela respira com ajuda de aparelhos”, disse Gayer.
Entre os objetivos do grupo ao intensificar as articulações internacionais, a suspensão de vistos dos ministros do Supremo seria a prioridade dos parlamentares. Em setembro, parlamentares republicanos encaminharam ao secretário de Estado americano, Antony Blinken, uma solicitação de revogação das permissões de entrada no país de todos os magistrados do STF.
O documento foi assinado pelos deputados María Elvira Salazar, Carlos A. Giménez, Rich McCormick e Chris Smith, além do senador Rick Scott. Todos foram reeleitos nesta terça-feira.
Ao comemorar o resultado nos Estados Unidos, o senador Eduardo Girão (Novo-CE) afirmou que a eleição de Trump põe um alerta nas ações do STF. “A vitória da livre opinião, no país que é a maior potência mundial, alerta para a ditadura imposta pela juristocracia brasileira, que tem levado nossa nação tanto a uma insegurança jurídica quanto a violações de direitos fundamentais sem precedentes na história”, disse o senador.
Em termos práticos, no entanto, ainda não está claro qual é o grau de comprometimento do governo Trump com as demandas da oposição brasileira. Com o discurso de “America First” (América Primeiro), analistas avaliam que os opositores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não devem ver resultados logo de início.
Pelo lado da oposição, a expectativa é de que a presença do empresário Elon Musk no entorno de Trump possa ser um ativo importante para as pautas brasileiras, visto que o dono do X sofreu sanções do ministro Alexandre de Moraes.
Direita brasileira vê na vitória de Trump janela de oportunidade para 2026
Assim como ocorreu em 2016, a direita brasileira enxerga na vitória de Trump uma nova janela de oportunidade para as próximas eleições presidenciais. Na época, quando o republicano assumiu a presidência pela primeira vez, congressistas de direita se animaram com as possibilidades de vitória de Jair Bolsonaro em 2018 no Brasil.
Somada à eleição de Javier Milei, na Argentina, a direita entende que está se criando uma "nova onda" favorável a candidatos conservadores nos costumes e liberais em relação ao Estado. Nesta quarta-feira (6), o presidente do Partido Liberal, Valdemar Costa Neto, afirmou que trabalhará pela candidatura de Bolsonaro em 2026.
“O momento é histórico, revela ascensão e permanência da direita no mundo”, disse ele em entrevista à CNN Brasil. “Vamos trabalhar com determinação para eleger o presidente Jair Bolsonaro nas eleições de 2026”, emendou Costa Neto.
O senador Rogério Marinho (PL-RN), secretário-geral do PL e líder da oposição no Senado, também avaliou que "a vitória de Trump representa a derrota da política woke" e dos que "defendem a regulação e o controle da mídia, assim como das redes sociais". Ele também citou Bolsonaro como presidenciável para 2026, apesar da atual situação de inelegibilidade.
"É uma derrota para aqueles que desejam atacar e subverter os valores democráticos que sempre inspiraram e conduziram o Ocidente. Que essa vitória nos inspire, para que, em 2026, possamos fazer o Brasil voltar a sorrir com Jair Bolsonaro como presidente", disse o parlamentar na rede social X.
Apesar da declaração do cacique, a candidatura do ex-presidente Jair Bolsonaro ainda é incerta, já que ele se encontra inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e pode sofrer outras condenações em processos judiciais. No entanto, existe a expectativa de que o PL, assim como o Republicanos, forme uma ampla bancada no Legislativo Federal.
Trump na Casa Branca pode esvaziar discurso de "direita sem Bolsonaro"
Além dos assuntos envolvendo o Legislativo brasileiro, a vitória de Donald Trump também representa um reforço na imagem de Bolsonaro devido à conexão pessoal entre os dois. Após algumas derrotas nas eleições municipais deste ano para outras figuras da direita, como o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União), surgiu no meio político o discurso de uma direita sem o ex-mandatário no pleito de 2026. A participação de Pablo Marçal na disputa pela prefeitura de São Paulo trouxe um ponto de inflexão para a direita local.
O burburinho chegou a provocar uma reação de Bolsonaro, que classificou a possibilidade de uma direita sem ele como “utopia”. "Esses caras juntam quantas pessoas no aeroporto, num bate-papo em qualquer lugar do Brasil? Não sabem a linguagem do povo. É uma utopia. Todos que tentaram se arvorar como líder através de likes ou de lacrações nunca chegaram a lugar nenhum", disse Bolsonaro em coletiva de imprensa no Senado Federal, na última terça-feira (29).
Para o cientista político Adriano Cerqueira, professor do Ibmec em Belo Horizonte, a vitória de Trump nas eleições americanas pode representar uma nova fase de protagonismo para Bolsonaro na política brasileira. Segundo ele, a reaproximação entre Trump e Bolsonaro é evidente.
“Trump provavelmente dará todo apoio. Ele sempre menciona o Bolsonaro em discursos e vai trabalhar, sim, nessa articulação envolvendo parlamentares brasileiros e americanos. Bolsonaro sai muito fortalecido e reassume o papel de líder da direita no Brasil sem dúvida nenhuma", avalia.
Desde 2020, oposição pede ajuda estrangeira contra excessos do STF
A escolha de levar ao exterior os acontecimentos domésticos não é nova. Desde 2020, a oposição apela a instâncias internacionais contra os excessos do Supremo Tribunal Federal (STF). Em fevereiro daquele ano, o Instituto Nacional de Advocacia (Inad) levou à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA), uma denúncia contra o ministro Dias Toffoli, que, por decisão judicial, havia obtido acesso a dados sigilosos de cerca de 600 mil pessoas.
Em 2021, o jornalista Allan dos Santos, do Terça Livre, levou ao mesmo órgão uma denúncia contra Alexandre de Moraes, após sofrer diversos tipos de censura e sanções por causa dos inquéritos do Supremo. Já em 2022, a deputada Carla Zambelli (PL-SP), que foi censurada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), levou seu próprio caso à OEA.
No mesmo ano, após advogados denunciarem uma série de abusos do STF, a CIDH chegou a pedir informações sobre o inquérito das fake news ao Supremo.
No ano passado, uma comitiva de parlamentares - formada pelos senadores Eduardo Girão (Novo-CE), Magno Malta (PL-ES) e Carlos Portinho (PL-RJ), além do deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS) - encaminhou à Organização das Nações Unidas (ONU) um dossiê sobre a situação dos presos de 8 de janeiro de 2023. A iniciativa ocorreu após familiares e advogados dos detidos relatarem uma série de denúncias de abusos e ilegalidades nas penitenciárias da Papuda (masculina) e Colmeia (feminina), em Brasília.
Para Marcelo Suano, cientista político e diretor de projetos do Centro de Estratégia, Inteligência e Relações Internacionais, a vitória de Donald Trump não representa apenas um triunfo pessoal, mas uma afirmação dos valores que a direita defende globalmente.
“É a vitória daquele conjunto de valores que são defendidos pela direita, não só nos Estados Unidos, como pela direita brasileira”, comenta Suano, que vê na recente articulação internacional da direita um esforço em resposta à organização da esquerda.
Ele também afirmou que a direita brasileira passou a enxergar a necessidade de cooperação internacional para se contrapor ao avanço da esquerda, que historicamente adota uma pauta comum independente das questões nacionais.
“A esquerda faz isso de uma forma muito profissional. Eles têm a pauta da luta de classe e do processo revolucionário, o que torna mais fácil a unidade”, explicou. Já a direita, segundo ele, historicamente se apresentava de forma individualizada, o que a tornava mais vulnerável.
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