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Reversão possível

Flávio Bolsonaro age para diminuir rejeição e fortalecer candidatura para 2026

Flávio Bolsonaro
Cenário de rejeição a Flávio Bolsonaro pode ser revertido ao longo da pré-campanha. (Foto: Lula Marques / Agência Brasil)

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Os números mais recentes das pesquisas eleitorais mostram que Flávio Bolsonaro (PL-RJ) parte de um cenário desafiador na corrida presidencial de 2026, marcado por um avanço nas intenções de votos, inclusive sobre Tarcísio de Freitas (Republicanos), mas também por índices elevados de rejeição em diferentes segmentos do eleitorado.

Levantamento da Genial/Quaest divulgado em 16 de dezembro de 2025 indica que 62% dos brasileiros afirmam que não votariam nele, enquanto 13% dizem que votariam com certeza. Ao mesmo tempo, outros 23% afirmam que “poderiam votar”, um contingente relevante que, segundo analistas, revela espaço real para reposicionamento político e crescimento, caso haja mudanças estratégicas e consistentes ao longo do período pré-eleitoral.

A pesquisa Genial/Quaest foi realizada entre os dias 11 e 14 de dezembro de 2025, com um total de 2.004 entrevistas. O levantamento utilizou amostragem representativa da população brasileira, e a margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

Especialistas em ciência política e estratégia eleitoral avaliam que a reversão do quadro de rejeição é possível, desde que baseada em mudanças estruturais e não apenas em ajustes pontuais de discurso.

Segundo o doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e comentarista político Luiz Augusto Módolo, parte da rejeição está diretamente ligada não só aos apoiadores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas a um contingente do eleitorado que rejeita Jair Bolsonaro e fica contra qualquer candidato com o sobrenome Bolsonaro.

Segundo o cientista político Murilo Carvalho, a rejeição a Flávio também tende a ser intensa entre eleitores independentes, de centro e centro-esquerda - segmentos que se mostram menos permeáveis ao discurso polarizado.

O empresariado e o mercado financeiro, por sua vez, não enxergam problemas nas políticas econômica e administrativa que devem ser adotadas por Flávio. Mas membros desses segmentos ainda resistem ao filho de Bolsonaro por desconfiar que ele pode não conseguir vencer Lula na eleição.

Dentro da própria direita, a preocupação é similar: há um receio de que Flávio não consiga vencer a rejeição, por isso a ordem é trabalhar para fortalecer ao máximo sua candidatura agora, segundo afirmou à reportagem uma fonte de alto escalão do PL que pediu para não ter o nome revelado por tratar de assunto sensível.

Flávio vem tentando fazer sua parte procurando tanto o núcleo que tradicionalmente milita em favor de seu pai como convencendo novos apoiadores de que pode ser moderado e confiável.

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Rejeição de Flávio Bolsonaro não é imutável e exige estratégias, avaliam especialistas

Segundo o cientista político Murilo Carvalho, Flávio mantém um núcleo de apoio fiel entre eleitores conservadores, evangélicos e apoiadores de seu pai, o que ajuda a explicar sua competitividade em determinados cenários eleitorais.

A avaliação predominante entre analistas é que, embora a rejeição atual seja elevada, ela não é imutável, mas precisa de estratégias para ser reduzida. “Com mudanças de postura, discurso e estratégia — especialmente na construção de um projeto próprio, econômico e institucionalmente sólido —, Flávio Bolsonaro pode reduzir resistências e se reposicionar no cenário eleitoral de 2026”, destaca Módolo.

O próprio senador tem afirmado ser “mais centrado” e “mais moderado” do que seu pai, mas ao mesmo tempo diz compartilhar os mesmos princípios de Jair. Ele chegou a citar como exemplo de ter posição própria sua postura diante da pandemia, lembrando que tomou duas doses da vacina contra a Covid-19. Flávio também declarou que sua candidatura é irreversível e “não está à venda”, mesmo com resistências internas no bloco de centro.

O senador tem destacado ainda que o sobrenome Bolsonaro lhe garante visibilidade e um ponto de partida relevante na disputa eleitoral, ao mesmo tempo em que busca sinalizar moderação para ampliar alianças.

Para o doutor em Ciência Política e comentarista político Leandro Gabiati, esse cenário é, em grande medida, previsível. Para o analista, o sobrenome Bolsonaro mantém forte apelo junto a um segmento específico do eleitorado, o que explica o desempenho do senador em comparação a outros candidatos do campo conservador. “O nome Bolsonaro ainda mobiliza uma parcela da sociedade e garante competitividade”, avalia.

Gabiati destaca que a rejeição elevada também segue um padrão esperado, concentrando-se tanto no eleitorado de esquerda quanto em parte expressiva do centro político, que tende a rejeitar candidaturas associadas à polarização. Diante disso, o desafio principal de Flávio Bolsonaro, segundo o cientista político, é reduzir essas resistências para crescer no primeiro turno e, sobretudo, tornar-se viável em um eventual segundo turno. “Para vencer uma eleição em um cenário polarizado, captar uma fatia do eleitor de centro é fundamental”, afirma.

Para o especialista, a sequência de entrevistas e a maior exposição de Flávio em diferentes veículos de comunicação fazem parte de uma tática clara de reposicionamento. “A ideia é diminuir a rejeição. O contato com a mídia e o discurso de moderação caminham nessa direção”, explica.

Ele ressalta, porém, que a consolidação desse movimento dependerá do apoio de profissionais de marketing político e uma estratégia mais estruturada de comunicação.

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Consolidação de eixos econômicos e conquista do mercado financeiro

A formação de uma equipe econômica de peso - aliada à apresentação de propostas para lidar com inflação, dívida pública, ambiente regulatório e desestatizações - também é um ingrediente que pode mudar a rejeição. A previsibilidade e o diálogo são apontados como fatores-chave para reduzir a desconfiança e evitar que ela contamine outros segmentos do eleitorado.

O doutor em Ciência Política Gustavo Alves afirma que Flávio Bolsonaro enfrenta um desgaste típico de nomes associados a projetos políticos anteriores, mas destaca que isso não é definitivo.

“A apresentação de um programa econômico sólido, com propostas claras e sustentado por técnicos reconhecidos, é um passo decisivo para ampliar a confiança de setores do mercado e de eleitores preocupados com estabilidade fiscal, inflação e crescimento econômico”, aponta. Para ele, a consolidação de um eixo econômico bem definido pode funcionar como um divisor de águas na percepção pública.

A doutora em Direito Público Clarisse Andrade avalia que um projeto econômico consistente é fundamental para que Flávio Bolsonaro seja visto como um candidato viável à Presidência. Segundo ela, a clareza programática tende a reduzir ruídos e deslocar o debate do campo simbólico para o campo das propostas concretas. Esse movimento posicionaria o senador como um nome competitivo, especialmente fora do núcleo mais ideológico do eleitorado.

Flávio Bolsonaro tem afirmado contar com o apoio à sua pré-candidatura do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, e tem reagido a movimentos negativos do mercado, dizendo que pretende montar uma equipe técnica de peso e estruturar com antecedência uma plataforma econômica inspirada no trabalho do ex-ministro Paulo Guedes.

Nesta quarta-feira (17), Flávio participou de um almoço com representantes do setor financeiro da Faria Lima, centro financeiro de São Paulo, cujo receio se manifestou com impactos negativos na Bolsa de Valores quando sua pré-candidatura foi lançada. O objetivo do encontro teria sido amenizar as reservas do mercado em relação ao senador.

Para Módolo, a relação com o mercado segue uma lógica própria e implacável: a confiança só se estabelece quando há clareza, previsibilidade e solidez de propostas.

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A conquista de eleitores indecisos, independentes e de centro

Luiz Augusto Módolo destaca que direita e esquerda têm núcleos duros de eleitores extremamente fiéis, que tendem a manter o voto independentemente do cenário. O ativismo desses grupos dificulta a compreensão da disputa por parcelas do eleitorado menos politizadas, que não estão ligadas ou apegadas às siglas nem espectros políticos. O sobrenome Bolsonaro assegura visibilidade nacional e fidelidade de uma parcela expressiva dos eleitores conservadores, cerca de 30%.

“A mesma prudência que desagrada parte do eleitor bolsonarista é justamente o que se faz necessário para conquistar 50% mais um dos votos”, observa.

Assim, o diálogo com eleitores independentes aparece como um dos maiores desafios — e também como uma das maiores oportunidades. Para os analistas ouvidos pela reportagem, esse grupo concentra boa parte da rejeição atual, muito associada à polarização política.

Para Gustavo Alves, a adoção de um discurso mais pragmático, focado em temas como segurança pública, saúde, emprego, empreendedorismo e custo de vida, pode reduzir resistências. “Esse eleitor quer soluções concretas e sinais de governabilidade, muitos inclusive estão cansados da polarização e são pequenos empreendedores que querem sentir menos o peso do Estado”, afirma.

Para conquistar esses eleitores, Flávio não deve se concentrar só no embate com o Supremo Tribunal Federal e a reversão de abusos judiciais. “O foco precisaria estar em questões concretas que afetam diretamente a vida do eleitor, como a economia, a elevada carga tributária, os juros altos e o avanço da violência no país”, atenta Módolo.

Reduzir dependências e criar um programa próprio

Outro dado revelado pela pesquisa divulgada nessa terça-feira é interpretado por especialistas como um alerta estratégico: 54% dos entrevistados avaliam que Jair Bolsonaro errou ao indicar o filho como nome para a sucessão presidencial. Para analistas, esse número não inviabiliza Flávio, mas reforça a necessidade de construção de um projeto próprio, menos dependente do capital político herdado do ex-presidente.

A leitura predominante é de que o senador ainda não é amplamente conhecido por uma agenda própria, o que, se corrigido, pode reduzir resistências e ampliar seu alcance junto a eleitores que hoje permanecem indecisos.

Mas, para ter sucesso, ele precisa reduzir a dependência simbólica da figura do pai. Para o constitucionalista Alessandro Chiarottino, construir uma trajetória própria, com posições autônomas e um estilo político mais institucional, pode ampliar significativamente o espaço de Flávio Bolsonaro no centro do espectro político. “Autonomia não significa rompimento, mas maturidade política”, resume.

Módolo destaca que esse movimento também teria um caráter simbólico importante: demonstrar que a direita brasileira pretende se consolidar como um campo político duradouro. Na sua leitura, isso envolve reconhecer equívocos, como a nomeação de figuras consideradas despreparadas para cargos estratégicos e a abertura excessiva de espaço para aliados oportunistas ou politicamente pouco confiáveis. Para o especialista, sinalizar publicamente que esse tipo de prática não se repetiria seria fundamental para reduzir resistências em setores moderados do eleitorado.

Para ele, a formação antecipada de uma equipe qualificada, incluindo economistas reconhecidos e uma lista clara de juristas com perfil técnico, para futuras indicações ao STF, ajudaria a transmitir força e maturidade ao eleitorado.

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Acusações pesam e há necessidade de consenso na direita

Analistas avaliam ainda que parte da rejeição a Flávio decorre de episódios passados, como as investigações envolvendo o suposto esquema das chamadas “rachadinhas” (suposta cobrança de parte dos salários de assessores pagos com dinheiro público), ainda no período em que Flávio era deputado estadual no Rio de Janeiro. A economista Regina Martins observa que, embora o senador tenha obtido decisões judiciais favoráveis em diferentes momentos, o tema permanece vivo na memória do eleitorado.

“Esse histórico ainda pesa, sobretudo entre eleitores independentes e setores urbanos, mas pode ser mitigado com uma postura mais proativa de transparência, institucionalidade e foco em propostas”, afirma.

O cientista político Murilo Carvalho lembra que, além das acusações de “rachadinhas”, restariam controvérsias envolvendo imóveis e movimentações financeiras. Embora parte desses processos também tenha sido arquivada ou não tenha avançado no Judiciário, o analista ressalta que o impacto simbólico permanece. “Esses episódios alimentam uma percepção associada a privilégios, corrupção e práticas da política tradicional, o que entra em choque direto com o discurso anticorrupção”, observa.

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