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Suspensão do controle de javalis afeta agropecuária brasileira
Suspensão do controle de javalis afeta agropecuária brasileira| Foto: Divulgação/Agência Câmara

O novo decreto de armas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), publicado em julho, já havia acendido um sinal de alerta sobre os empecilhos para o controle de javalis por meio da caça com armas de fogo. Agora, a suspensão de novas autorizações para controle nas modalidades de caça ativa, ceva ou espera por meio do Sistema de Informação de Manejo de Fauna (Simaf), anunciada na última sexta-feira (18) pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), reforça o temor sobre os impactos da medida na agropecuária brasileira.

Por meio de uma nota publicada no site do Simaf, os caçadores foram informados sobre a suspensão preventiva de novas autorizações. “Considerando a edição do Decreto 11.615, de 21 de julho de 2023, que determina que a caça excepcional para controle de fauna invasoras somente será autorizada pelo Comando do Exército, suspendemos preventivamente as autorizações de manejo em vida livre nas modalidades de caça ativa, ceva ou espera emitidas pelo Simaf, até que se proceda as adequações necessárias”, diz o boletim informativo.

A publicação gerou muitas dúvidas e, especialmente, insegurança jurídica entre os caçadores, já que não houve publicação em diário oficial, ou mais detalhes, sobre a determinação. A insegurança se deve ao fato de que, além da suspensão de autorizações, há questionamentos sobre a validade das autorizações já emitidas para o controle de javalis com utilização de armas de fogo.

Em consulta ao Ibama, a reportagem da Gazeta do Povo apurou que as autorizações emitidas no último mês, após a publicação do decreto de armas de Lula em 21 de julho de 2023, não são consideradas válidas, por estarem em desacordo com a legislação vigente. Questionada ainda sobre a validade das autorizações emitidas antes do decreto, a assessoria de imprensa do Ibama informou apenas que “o tema será discutido para tratativas”.

A Gazeta do Povo também buscou contato com o Exército para saber se há perspectiva de prazo para que as autorizações sejam retomadas, mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria. O espaço segue aberto para manifestação.

Insegurança no controle de javalis impacta emissão dos relatórios de manejo 

Após o anúncio da medida, os caçadores também passaram a encontrar dificuldade na emissão dos relatórios de manejo, que são uma exigência do órgão ambiental. Os relatórios de manejo de javali possuem informações, como o número de pessoas que participaram do manejo, local onde foi realizado o manejo, o período, o método de manejo, o número de javalis adultos avistados, além de informações sobre os animais abatidos incluindo sexo, peso e estágio de desenvolvimento.

Após a suspensão da emissão de novas autorizações, caçadores relatam que não possuem mais a opção de selecionar todos os métodos de manejo disponíveis anteriormente. “Não há como relatar a caça de javali com armas de fogo, mesmo que se tenha uma autorização anterior ao decreto. Hoje, o sistema só aceita relatório para uso de armadilha e arma branca”, pontuou o presidente da Associação Brasileira de Caçadores, Rafael Salerno. Ainda de acordo com Salerno, a não apresentação dos relatórios de manejo gera multas de, em média, R$ 2 mil por propriedade.

ONG de proteção animal atuou para suspensão da caça e espalha desinformação 

A Ampara Silvestre usou as redes sociais para anunciar a suspensão das autorizações de caça de javali. “A suspensão das licenças pode ser o início de um novo ciclo de ações contra a invasão do javali”, destacou a publicação feita no último domingo (20), sem detalhar quais as ações seriam implementadas. A Ampara Silvestre é uma frente de atuação do Instituto Ampara Animal que é uma organização da sociedade civil de interesse público (Oscip), ou seja, uma organização não governamental (Ong) criada pela iniciativa privada.

De acordo com a publicação, o Instituto Ampara Animal fez parte de reuniões realizadas em Brasília, que teriam contado com a participação de diferentes agentes de governos municipais, estaduais e federais, representantes do agronegócio, instituições e órgãos ambientais como Ibama, Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMbio).

Embora tenha sido mencionado na publicação da ONG, e seja responsável pelo Plano Nacional de Prevenção, Controle e Monitoramento do Javali, o MAPA informou que não foi consultado sobre a suspensão. A gerente do Plano, Lia Treptow Coswig afirmou à reportagem da Gazeta do Povo que não haveria sequer a necessidade de consulta. “Como a norma de controle não é do Mapa e sim do Ibama não fomos consultados, e nem existe necessidade de consulta pois a norma não é nossa”, informou a servidora do Mapa.

A representante da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) na interlocução com o governo para tratar da revisão do Plano de Controle do Javali, Claudia Mendes, também disse não ter chegado ao seu conhecimento nenhuma consulta sobre a suspensão anunciada.

A publicação ainda propaga desinformação ao afirmar que teriam sido revogadas "todas as autorizações da caça de controle de fauna invasoras”. No entanto, à reportagem da Gazeta do Povo, o Ibama informou que não houve suspensão das atividades de manejo de forma integral e que o uso de armadilhas continua autorizado.

Recuperação dos impactos na agropecuária podem demorar mais de 5 anos, diz engenheiro agrônomo 

A decisão do Ibama sobre o controle de javalis pode ter impactos diretos na agropecuária brasileira. Um dos principais é a destruição de lavouras, levando em conta que a decisão do Ibama ocorre no momento do início do plantio de uma nova safra.

“Na prática, a suspensão de novas autorizações para caça com armas de fogo retira cerca de 50 mil caçadores da atividade de controle do javali. Somente no final de semana que sucedeu a publicação sobre a suspensão, é possível estimar que pelo menos 10 mil filhotes de javali tenham sido colocados a campo”, destacou Salerno.

Outro impacto negativo da suspensão é o risco de um surto de doenças como a peste suína africana. “Nós estamos hoje com 10 estados em alerta sanitário com a gripe aviária. Se a gente tiver, uma suspeita de qualquer doença relacionada ao suíno, milhares de empregos serão perdidos da noite para o dia. Mais do que isso, o javali não transmite só doenças para outros suínos, mas também para bovinos, como é o caso da febre aftosa. Um surto de aftosa suspende a comercialização de carne e de todos os derivados, como os lácteos. Isso arrasaria estados inteiros”, afirma o presidente da Associação Brasileira de Caçadores, que também é engenheiro agrônomo.

De acordo com Salerno, os efeitos de um surto sanitário levariam pelo menos cinco anos para serem recuperados. “Nós já tivemos surtos de aftosa no Rio Grande do Sul e no Mato Grosso do Sul. Levou-se pelo menos cinco anos para que esses estados recuperassem o seu nível de renda com essas atividades”, lembrou.

Por meio de nota, a Sociedade Rural Brasileira (SRB) destacou os sérios riscos sanitários que o javali representa para a pecuária nacional, mais neste momento em que avança pelo país a retirada da vacinação contra a febre aftosa. "A Sociedade Rural Brasileira pede atenção do Ministério da Agricultura e das autoridades sanitárias para que esse impasse no controle destas espécies exóticas seja resolvido com celeridade. A burocracia e a inoperância não podem colocar em risco o status sanitário do país, o minucioso trabalho de retirada da imunização da aftosa tão pouco o rebanho brasileiro", afirmam em nota. Por meio de sua assessoria, a SRB informou que vai levar a demanda para a pauta das reuniões do Instituto Pensar Agro (IPA), que presta assessoria à Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).

O deputado federal Rafael Pezenti (MDB-SC) alerta para os impactos da decisão. “Essa é mais uma decisão desastrosa para o agronegócio, vinda de quem não sofre com os ataques e a destruição causada por esses animais. O controle de javalis hoje é o único método eficiente para evitar estragos e enormes prejuízos que causam nas lavouras. A suspensão trará impacto extremamente negativo para produtores e terá reflexos econômicos para o Brasil, além de ser um risco à saúde e integridade física das pessoas”, disse o parlamentar de Santa Catarina, um dos estados que é impactado com os prejuízos causados pelo javali.

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