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Tentativa de negociação

Indígenas tentam travar negociação sobre marco temporal no STF

Indígenas ameaçam abandonar conciliação sobre o marco temporal proposta pelo STF
Indígenas ameaçam abandonar conciliação sobre o marco temporal proposta pelo STF. (Foto: Gustavo Moreno/STF)

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Representantes dos povos indígenas que participam da câmara de conciliação sobre o marco temporal tentam travar as discussões. A iniciativa de negociação foi proposta pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) afirma que só é possível continuar com a tentativa de conciliação se houver suspensão da lei do marco temporal (Lei 14.701/2023) até o fim das discussões. O STF, no entanto, não atendeu ao pedido da entidade até o momento.

Embora não dependa da participação direta deles, a pressão indígena tem surtido efeitos e o marco temporal está novamente parado, mesmo após ter sido aprovado pelo Congresso.

A câmara de conciliação foi criada por decisão do ministro Gilmar Mendes, do STF, que é o relator de cinco ações que discutem a constitucionalidade do marco temporal. A lei, aprovada pelo Congresso Nacional em dezembro do ano passado, restabeleceu a data de 5 de outubro de 1988 como data-chave para as demarcações. Esse marco, no entanto, havia sido rejeitado pelo STF em setembro.

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Diante dos impasses, Gilmar Mendes apostou na conciliação para buscar soluções para “garantir direitos dos povos originários e da população não-indígena”. Para o ministro, o marco temporal é uma das questões mais complexas em debate na sociedade, e seus efeitos são vistos em conflitos territoriais em todo o país.

“Esta oportunidade aberta aqui é uma janela de pacificação histórica, que deve ser aproveitada por todos, para que se tente produzir um resultado em cooperação entre todos os participantes. É chegada a hora, hoje, de todos sentarem-se à mesa e chegarem a um consenso mínimo”, disse o decano.

Ainda em razão da divergência entre as decisões do Judiciário e do Legislativo, desde abril, também por meio de decisão do ministro Gilmar Mendes, estão suspensos todos os processos judiciais que discutem a questão do marco temporal. 

Sob alegação de que "direitos não se negociam", indígenas se opõem a participar de debates sobre o marco temporal

Desde o anúncio da criação da câmara de conciliação, em abril, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) tem se posicionado contra a negociação. “Direitos não se negociam”, diz uma das frases que vem sendo repetidas pelas lideranças indígenas. 

Enquanto os indígenas ameaçam deixar a tentativa de solucionar o problema, a bancada do agro tem se empenhado em buscar a pacificação para o tema. Representada pelo deputado Pedro Lupion (PP-PR) e pela senadora Tereza Cristina (PP-MS), a bancada reafirmou que preza pela paz no campo e pela segurança jurídica.

A pressão dos indígenas durante a primeira reunião da câmara de conciliação no STF fez com que a confirmação sobre as próximas datas das reuniões fosse adiada. 

Embora o cronograma com a reserva de três datas tenha sido anunciado, o STF apontou que a confirmação se dará apenas após a manifestação da Apib. Os indígenas pediram um prazo de 48 horas para discutir as datas. As previstas para as próximas reuniões no STF são 28 de agosto, 9 e 23 de setembro, das 15h às 19h.  

No entanto, encerrado o prazo, a Apib afirmou que se reunirá com suas bases somente na semana do dia 12 de agosto. Portanto, a indefinição sobre o andamento da câmara de conciliação vai prosseguir.

O prazo para o encerramento da câmara está previsto para 18 de dezembro. Caso não haja acordo até essa data, os processos seguirão seu curso normal no Supremo. 

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Lideranças indígenas afirmam que não são representadas pelo governo federal 

Apesar de ter várias lideranças indígenas indicadas por órgãos do governo federal e da Câmara dos Deputados para compor a câmara, os indígenas não se dizem representados por elas. Eles alegam que a composição do grupo é majoritariamente a favor do marco temporal. 

“Eles são maioria e não estão interessados em defender os nossos direitos na câmara [de conciliação], mas nós vamos nos mobilizar ao redor do país”, disse Kleber Karipuna, representante da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) na Apib.

Segundo informações do site do STF, a câmara é formada por seis membros do Congresso (senadores e deputados federais), quatro do governo federal, dois dos estados, e um representante dos municípios. Os representantes do governo, por exemplo, são ligados à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e ao Ministério dos Povos Indígenas.

Entre os representantes do Congresso, estão a parlamentar indígena Celia Xakriabá (Psol-MG), além dos já citados deputado Pedro Lupion (PP-PR) e a senadora Tereza Cristina (PP-MS).

Além disso, a Articulação dos Povos Indígenas (Apib) tem seis representantes no colegiado. O STF informou ainda que cada um dos autores das ações sobre o marco temporal também poderá indicar um representante.

Somada à reclamação sobre a composição que consideram desproporcional, os indígenas alegam também que a suspensão dos efeitos da lei do marco temporal é uma condicionante para que eles continuem no processo.

Durante a reunião no STF, no entanto, o juiz assistente Diego Viegas Veras assegurou que os debates devem continuar, mesmo sem a participação da Apib. Ele afirmou ainda que a suspensão da lei não seria tema de debate da câmara de conciliação. 

Bancada do agro defende pacificação para marco temporal

A indisposição dos indígenas em negociar uma solução para a demarcação de terras no Brasil é confrontada com a busca pela pacificação defendida pela bancada do agro. A coordenadora política da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) no Senado Federal, senadora Tereza Cristina (PP-MS), disse esperar que se alcance uma solução negociada para a questão. 

"Nós podemos caminhar se todos vierem despidos de preconceitos [...] Que ninguém saia prejudicado e termine esse assunto antes de 18 de dezembro, porque temos problemas como invasões acontecendo em várias regiões do país", afirmou a senadora. 

Os representantes do agro também reforçam o posicionamento em defesa da segurança jurídica e da necessidade de cumprimento da lei do marco temporal.

"Segurança jurídica e direito de propriedade são direitos garantidos pela legislação e devem vir em primeiro lugar. Não aceitaremos atropelos à segurança jurídica ou ao direito de propriedade. A Lei do Marco Temporal está vigente, é válida e precisa ser cumprida. É proibida a demarcação de áreas sem indenização prévia de terra nua e benfeitorias. Esse é também o entendimento do STF. Cumpra-se!", disse o presidente da FPA, deputado Pedro Lupion (PP-PR).   

Questionada, a FPA não se manifestou sobre a possibilidade de os indígenas abandonarem a conciliação. 

Indígenas já abandonaram grupo de trabalho sobre a Ferrogrão  

No dia 29 de julho, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) anunciou o rompimento com um Grupo de Trabalho (GT) do Ministério dos Transportes destinado a debater a Ferrogrão. Para os indígenas, a ferrovia, que terá 933 km e vai ligar o Porto de Miritituba (PA) ao município de Sinop (MT), “tem o potencial de destruir modos de vida tradicionais no coração da Amazônia”. 

O GT sobre a Ferrogrão foi criado no âmbito de uma ação no Supremo Tribunal Federal -a ADI 6553 - que discute a inconstitucionalidade da lei de desafetação de parte do Parque do Jamanxim para viabilizar a ferrovia.

Em março, o governo federal já havia cedido à pressão dos indígenas e adiado o andamento do projeto após uma manifestação contrária deles com relação à Ferrogrão. No acordo para seguimento do projeto, o ministério se comprometeu a fazer novas rodadas de debates com os indígenas.

À Gazeta do Povo, o Ministério dos Transportes disse que recebeu com "surpresa a decisão unilateral de interrupção da interlocução dos representantes da sociedade civil no Grupo de Trabalho Ferrogrão". De acordo com a pasta, o "espaço de diálogo ocorreu em cooperação com a sociedade civil, desde sua composição e plano de trabalho". 

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