Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Redistribuição de cargos

Lula terceiriza articulação e aposta em Hugo Motta para recompor base na Câmara

Lula Hugo Motta base na Câmara Centrão
Presidente da Câmara, Hugo Motta, entra na articulação para recompor a base de Lula na Câmara (Foto: Ricardo Stuckert / PR)

Ouça este conteúdo

Depois de uma série de derrotas, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) iniciou um movimento para tentar recompor sua base de apoio no Congresso Nacional. O movimento acontece após as demissões de indicados políticos de deputados que votaram contra a medida provisória que tratava do aumento de impostos.

A estratégia, coordenada pela ministra Gleisi Hoffmann, da Secretaria de Relações Institucionais (SRI), busca atrair novos aliados, premiar parlamentares fiéis e consolidar apoio a votações prioritárias até o fim do ano legislativo.

O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), tem sido escutado nas negociações e assumido papel central na articulação política. Ele participou recentemente de uma reunião com Gleisi, o líder do PP na Câmara, Doutor Luizinho (RJ), e o ministro do Esporte, André Fufuca, para discutir a recomposição.

Segundo parlamentares ouvidos pela reportagem, Motta vem atuando como ponte entre o Planalto e as bancadas do PP e do União, desde que as direções nacionais dessas siglas romperam formalmente com o governo. Ao menos cinco deputados relataram ter sido procurados por assessores de Gleisi nos últimos dias, em uma tentativa de reaproximação após as demissões.

“Vamos repactuar a construção dos partidos que estão dispostos a caminhar com o governo para aprovação daquelas matérias que são estratégicas para o país e para o governo”, afirmou o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE).

O primeiro teste sobre a nova articulação da base governista será na tentativa de aprovação da PEC da Segurança, que ganhou destaque após a operação que deixou pelo menos 121 mortos no Rio de Janeiro. A aprovação da proposta é vista como uma tentativa de Lula capitalizar a pauta de segurança, tradicionalmente encampada pela direita. Apesar disso, a PEC enfrenta resistências para avançar diante da pressão da oposição e de governadores críticos ao texto.

Apesar disso, a ministra Gleisi Hoffmann e outros líderes de partidos na Câmara avaliam que é preciso combinar concessões políticas e diálogo direto com as bancadas para tentar recompor a base. Nos bastidores, Lula tem repetido que prefere “refazer pontes” a promover uma reforma ministerial, mas interlocutores admitem que mudanças na Esplanada não estão descartadas caso ajudem a encerrar a crise na base aliada.

Líderes próximos a Hugo Motta afirmam que o deputado tem um papel estratégico nesse processo de recomposição, com atenção especial aos seus interesses eleitorais na Paraíba, estado considerado um reduto de apoio a Lula. Embora não tenha poder direto sobre a escolha dos novos ocupantes dos cargos, Motta atuará como interlocutor entre o governo e os interessados nas nomeações, o que tende a ampliar sua influência sobre as bancadas parlamentares.

Questionado sobre o posicionamento do Republicanos nas eleições presidenciais de 2026, Motta evitou antecipar qualquer definição. “O nosso partido tem discutido isso de maneira muito responsável. Não há ainda um alinhamento. O Republicanos é um partido de centro-direita, tem o governador de São Paulo em seus quadros, tem dentro do partido integrantes que defendem o presidente Lula, mas penso que essa definição deve ficar para o ano que vem”, afirmou.

Em nível nacional, o Republicanos sinaliza a possibilidade de lançar o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, à Presidência da República. O paulista é visto como uma das principais apostas do Centrão para enfrentar Lula em 2026.

Ao ser questionado se, na Paraíba, apoiaria a reeleição do petista, Motta respondeu com cautela: “eu, enquanto presidente da Câmara, tenho que ter a responsabilidade de saber o cargo que hoje ocupo. Qualquer posição política que eu tome a favor ou contra qualquer candidatura neste momento pode atrapalhar o nosso dia a dia na Câmara”, desconversou.

Distribuição de cargos e de emendas não garante apoio a Lula em 2026

Nos bastidores, auxiliares de Lula afirmam que o Planalto pretende mapear cada indicação política e monitorar a fidelidade dos parlamentares nas votações de interesse do governo. A ideia é usar o novo ciclo de nomeações como instrumento para consolidar uma base mais estável, que garanta a aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e de projetos econômicos até dezembro.

Paralelamente ao rearranjo de cargos, o governo deve liberar cerca de R$ 3 bilhões em emendas do Ministério da Saúde como sinal de aproximação com o Congresso. Do total, R$ 320 milhões serão destinados à oposição, num gesto de distensão e tentativa de retomar o diálogo com parlamentares de centro e direita.

Os recursos serão aplicados em obras e compra de equipamentos de saúde, cumprindo a regra que destina ao menos 50% das emendas ao setor. Em 2025, R$ 18,3 bilhões foram aplicados na saúde e R$ 11,7 bilhões em outras áreas. O valor total previsto para emendas no Orçamento Federal é de R$ 50 bilhões, cuja execução está sob análise do Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu o pagamento automático dessas verbas.

Questionado sobre a relação entre o Palácio do Planalto e a Câmara, Hugo Motta reconheceu que o diálogo ainda precisa evoluir. “Ainda tem muito o que melhorar”, afirmou o presidente da Câmara.

Líderes partidários admitem que hoje há resistência da maior parte dos partidos fora da esquerda em formalizar apoio ao governo, enquanto o PL de Jair Bolsonaro tenta costurar com siglas do Centrão uma aliança única para 2026. “Hoje o Lula é um avião voando sozinho, mas é um avião que voa baixo, com teto baixo e pouca autonomia. Quando o nosso centro decolar, vai voar muito mais alto e será muito melhor para o país”, disse o senador Ciro Nogueira (PP-PI), presidente nacional do PP.

O senador salientou que o campo político da direita terá de escolher um candidato e que essa decisão passará pelos governadores estaduais. Nogueira tem dito que sua preferência é pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, e pelo governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD). Nos bastidores, o presidente do PP tenta se cacifar como candidato a vice-presidente.

Governo ainda pode sofrer derrotas em outras pautas do Congresso

Apesar do esforço do Palácio do Planalto, o governo Lula pode sofrer novas derrotas nos próximos meses. Uma das principais ameaças vem da tentativa do Centrão de desfazer o acordo que garantia ao PT a indicação do próximo ministro do Tribunal de Contas da União (TCU). O entendimento havia sido costurado ainda no ano passado pelo então presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), em troca do apoio da bancada petista à candidatura de Hugo Motta à presidência da Casa.

Além disso, cresce a pressão no Congresso para derrubar os vetos de Lula à Lei Geral do Licenciamento Ambiental, um dos pontos de atrito entre o Planalto e parlamentares da bancada do agronegócio. Para a oposição, a relação entre o Executivo e o Legislativo se deteriorou ainda mais após o presidente petista afirmar, no último dia 15, que o Congresso Nacional “nunca teve tão baixo nível” quanto o atual — declaração feita na presença de Hugo Motta, durante evento no Rio de Janeiro.

O líder da oposição na Câmara, Luciano Zucco (PL-RS), classificou a fala como “irresponsável” e “antidemocrática”. “Pior mesmo é esse escândalo de descontos indevidos contra aposentados, uma gestão que quebrou os Correios, aumentou quase 30 impostos em menos de três anos e mergulhou o país numa crise fiscal sem precedentes”, afirmou.

Zucco acrescentou que as declarações de Lula violam o espírito republicano e representam “um desrespeito à representação popular”. “Um presidente que insulta o Parlamento está insultando o povo brasileiro. O Brasil precisa reagir a esse autoritarismo travestido de discurso populista”, finalizou.

VEJA TAMBÉM:

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.