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O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), derrubou nesta quarta (19) o sigilo da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid que levou à denúncia do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outras 33 pessoas pela suposta tentativa de golpe de Estado.
Moraes também notificou todos os citados, que terão um prazo de 15 dias para se pronunciarem sobre a denúncia do procurador-geral Paulo Gonet, apresentada na noite de terça (18).
“DETERMINO: 1) A NOTIFICAÇÃO dos denunciados, com cópias da denúncia, da íntegra da colaboração premiada e da presente decisão, para que ofereçam as respectivas respostas, no prazo de 15 (quinze) dias, nos termos do art. 4º da Lei 8.038/90. Os prazos serão simultâneos a todos os denunciados, inclusive ao colaborador, uma vez que, somente os réus – uma vez instaurada eventual ação penal – têm o direito de apresentar alegações finais após a manifestação das defesas dos colaboradores , não se aplicando tal entendimento à presente fase processual; 2) O LEVANTAMENTO DO SIGILO DA PET 11.767/DF, na qual foi homologado o acordo de colaboração premiada nº 3490843/2023.0070312 CGCINT/DIP/PF, firmado entre a Polícia Federal e MAURO CÉSAR BARBOSA CID, com sua imediata digitalização e publicidade”, escreveu Moraes.
Com isso, todos os denunciados pela PGR ao STF terão acesso à delação de Cid, que embasou as investigações da Polícia Federal sobre a suposta tentativa de golpe de Estado. O acesso às informações era pedido pelos envolvidos desde que a colaboração foi acertada.
“No tópico relacionado a atuação dos investigados em uma tentativa de Golpe de Estado e de Abolição violenta do Estado Democrático de Direito, o colaborador narrou a existência de um grupo de pessoas denominado ‘radicais’ que tentaram convencer o então Presidente da República a executar um Golpe de Estado”, disse a PF sobre a declaração de Cid.
Cid afirmou que este grupo era formado por, entre outras pessoas, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, o deputado Eduardo Bolsonaro, o ex-ministro Onyx Lorenzoni, os senadores Jorge Seiff e Magno Malta e o general Mario Fernandes.
Mauro Cid afirma, entre outros pontos, que presenciou uma reunião em novembro de 2022 entre Felipe Martins, ex-assessor de assuntos internacionais de Bolsonaro, com o ex-presidente e um jurista em que foi apresentado um documento com várias páginas que indicariam supostas interferências do Poder Judiciário no Poder Executivo. Ao final, foi apresentado um decreto que determinava a prisão de várias autoridades.
“QUE o ex-Presidente JAIR BOLSONARO tinha certeza que encontraria uma fraude nas umas eletrônicas e por isso precisava de um clamor popular para reverter a narrativa: QUE o ex-Presidente estava trabalhando com duas hipóteses: a primeira seria encontrar uma fraude nas eleições e a outra, por meio do grupo radical, encontrar uma forma de convencer as Forças Armadas a aderir a um Golpe de Estado”, disse Cid em um dos depoimentos à Polícia Federal.
Em outro trecho da colaboração, Mauro Cid afirma que um empresário do agronegócio financiou a permanência de Bolsonaro nos Estados Unidos após o fim do mandato, em 2022, mas sem se recordar do nome. "Confirmo, sim, que ele financiou todos os custos. Mas não posso, inclusive eu nunca vi ele pessoalmente, nunca estive com ele", pontuou.
Ele ainda confirmou a suposta adulteração do cartão de vacinação contra a Covid-19 a mando de Bolsonaro;a venda de joias recebidas de presente de autoridades estrangeiras; o alegado "gabinete do ódio" para a "criação e repercussão de notícias não lastreadas ou conhecidamente falsas com o objetivo de atacar integrantes de instituições públicas, desacreditar o processo eleitoral brasileiro, reforçar o discurso de polarização", entre outras informações.
Bolsonaro e outras 33 pessoas, sendo 23 militares, foram denunciadas por crimes como tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, organização criminosa, dano qualificado contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.
“A organização tinha por líderes o próprio Presidente da República e o seu candidato a Vice-Presidente, o General Braga Neto. Ambos aceitaram, estimularam, e realizaram atos tipificados na legislação penal de atentado contra o bem jurídico da existência e independência dos poderes e do Estado de Direito democrático”, disse o procurador-geral.
As penas máximas dos crimes imputados a Bolsonaro somam 43 anos de prisão, mas o cálculo definitivo dependerá dos crimes pelos quais ele for eventualmente condenado, considerando agravantes e atenuantes. No entanto, há possibilidade de absolvição ou até arquivamento da denúncia antes do julgamento.
A decisão sobre o recebimento da denúncia caberá à Primeira Turma do STF, composta pelos ministros Alexandre de Moraes, relator da investigação, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Cristiano Zanin e Flávio Dino. O grupo analisará se há indícios suficientes para tornar Bolsonaro e os demais investigados réus. Dentro da Polícia Federal, a expectativa é que a denúncia seja aceita até o fim de março.
Caso o STF aceite a acusação, será aberta uma ação penal, fase em que os réus poderão se defender formalmente. No julgamento final, o Supremo decidirá pela absolvição ou condenação dos envolvidos. Durante todo o processo, Moraes seguirá como relator e responsável pela condução do caso.