O ex-ministro Sergio Moro, recém-filiado ao Podemos, e seus aliados mais próximos têm ampliado a série de negociações com representantes de outros pré-candidatos a presidente em 2022. O objetivo é fortalecer o entendimento em torno da chamada "terceira via" na corrida presidencial, uma alternativa ao favoritismo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), e posicionar o próprio Moro como líder da corrente. Os diálogos, porém, esbarram na resistência de boa parte da classe política, já comprometida com as candidaturas de Lula e Bolsonaro.
O conjunto de conversas promovido por Moro e seus aliados inclui interlocutores como o governador João Doria (PSDB), também pré-candidato à Presidência, o MDB, que tem outra postulante ao Palácio do Planalto, a senadora Simone Tebet (MS), e o União Brasil, partido formado com a fusão de PSL e DEM. A nova agremiação espera até mesmo emplacar o vice de Moro - e já tem nome para o posto, o deputado federal Luciano Bivar (PE), que será o presidente do partido.
"Acho que todo mundo vê o Moro como a principal alternativa para tirar Bolsonaro do segundo turno", afirmou o deputado federal Júnior Bozzella (PSL-SP), que articula as negociações para a consolidação do União Brasil e tem a expectativa de aproximar o partido do ex-juiz da Lava Jato.
Moro abre diálogo com Temer
Da parte do MDB, quem mencionou publicamente o diálogo com Moro foi o ex-presidente Michel Temer. Em entrevista à Rádio Bandeirantes, o emedebista relatou ter sido procurado por emissários de Moro, mas declarou que a ideia não avançou além da simples proposta de sugerir um encontro.
Correligionária de Temer e presidenciável da sigla, a senadora Tebet afirmou, na quarta-feira (15), que busca a intensificação das conversas com representantes das outras candidaturas do chamado "centro democrático". Sem mencionar o nome de Moro, a parlamentar expôs que as pesquisas contribuirão para que o grupo caminhe para a convergência em torno de "um ou dois nomes" na disputa política.
Setores do Congresso dobram aposta no favoritismo de Lula e Bolsonaro
Entre outros segmentos do meio político, entretanto, a possibilidade de agregação em torno do nome de Moro é vista como remota. A avaliação de congressistas é a de que o favoritismo que Lula e Bolsonaro detêm hoje na sociedade em geral também se reflete entre os políticos.
"Hoje não há espaço para uma terceira candidatura", disse o deputado Capitão Augusto (PL-SP), presidente da "bancada da bala" da Câmara e apoiador de Bolsonaro. O parlamentar vê Moro na "prateleira de cima" da política, ao lado de Lula e Bolsonaro, mas sem condição de afetar o favoritismo de ambos. "Ele deve bater entre 15 e 17% [nas eleições]. Mas a esquerda já se fechou em torno de Lula, e a direita se fechou em torno de Bolsonaro. É uma disputa muito segmentada", afirmou.
Adversário de Moro, o líder do PT na Câmara, Bohn Gass (RS), opina que o ex-juiz terá dificuldade em expor à sociedade que é diferente de Bolsonaro. "Ele avalizou a política de Bolsonaro. Foi conivente em questões como a destruição da Amazônia e o enfraquecimento das instituições", apontou.
Moro ganhou notoriedade ao conduzir os julgamentos da Lava Jato na 13a Vara da Justiça de Curitiba, em que condenou, entre outras figuras de peso, o próprio Lula. Deixou a magistratura ao fim de 2018 para atuar na equipe de transição de Bolsonaro e, depois, como ministro da Justiça e Segurança Pública. Em abril de 2020, rompeu com o presidente, por acusá-lo de interferir na Polícia Federal com o intuito de proteger os filhos, que eram alvo de investigações de corrupção. Filiou-se ao Podemos em novembro e, embora não fale abertamente a respeito, é tratado pelo partido como seu nome para a Presidência da República. Por conta de sua trajetória, se tornou alvo de petistas e bolsonaristas.
Pacote anticrime foi fonte de embates
Os parlamentares que veem dificuldade de Moro em furar a polarização apontam, além de preferências a Bolsonaro e Lula, uma espécie de "falta de traquejo" que o ex-juiz teria demonstrado em suas relações com o Legislativo quando foi ministro de Bolsonaro.
"Acho que ele bateu cabeça nos primeiros meses de ministério, mas aprendeu muito durante o processo e está mais preparado agora. De todo modo, vai precisar de ajuda, ainda mais com um Congresso mal acostumado com orçamento secreto", declarou o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP).
O principal momento de interlocução de Moro com o Congresso foi durante a tramitação do pacote anticrime. O conjunto de proposições legislativas avançou em Câmara e Senado do início ao fim de 2019. O resultado foi a aprovação de um texto que, embora tenha recebido elogios públicos de Moro, passou por significativa desidratação na comparação com a proposta inicial.
As discussões em torno do pacote levaram Moro a ter um dos seus primeiros embates públicos na condição de ministro. Ele e o então presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), divergiram por conta da prioridade dada ao pacote. Moro cobrou de Maia foco no texto, enquanto o deputado via com mais foco a reforma da previdência. A contestação fez com que Maia chamasse Moro de "funcionário do presidente Bolsonaro" e dissesse que o pacote anticrime proposto pelo ex-juiz era, na verdade, um "copia e cola" de uma iniciativa elaborada pelo antecessor de Moro na Justiça, Alexandre de Moraes, atual ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).
O pacote de Moro motivou críticas de esquerda e direita. Os parlamentares vinculados à esquerda contestaram ações como o excludente de ilicitude, que poderia dificultar a aplicação de punições a policiais que matassem em serviço. Já os direitistas reclamaram de concessões feitas por Moro e de tópicos aprovados como o juiz de garantias, que possibilita uma revisão do processo legal.
Para o deputado José Nelto (Podemos-GO), a tramitação do pacote anticrime indicou que Moro tinha disposição para dialogar com o parlamento - quadro que poderá se repetir durante o próximo período eleitoral. "Ele sempre foi acessível. Tive mais de 40 audiências com ele, e ele discutia todos os assuntos. O pacote anticrime só não passou como ele queria porque o governo não quis colaborar", destacou.
O deputado acrescentou que o momento de seu partido e de Moro é o de diálogo com diferentes forças, o que inclui mesmo siglas que contêm nomes para a presidência. "É um processo de amadurecimento. Mas verificamos que a cada momento o projeto vai ganhando apoio", disse.
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