Sem deliberações nas sessões extraordinárias deliberativas na Câmara dos Deputados e no Senado na terça-feira (26), os partidos de oposição ao governo federal e 22 frentes parlamentares anunciaram que vão intensificar a obstrução no Congresso Nacional em protesto contra o ativismo judicial praticado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Mesmo com a articulação, as duas Casas tiveram sessões nesta quarta-feira (27).
No Senado, no lugar da obstrução, a Casa decidiu votar e aprovar o marco temporal para demarcação das terras indígenas nesta quarta-feira (27). O texto-base passou com 43 votos a favor e 21 contrários. Também foi uma reação ao STF, que na semana passada rejeitou a tese. O texto prevê que a cessão das áreas em favor dos indígenas só vale para terras que já estivessem habitadas pelas tribos na data da promulgação da Constituição de 1988.
Por meio do movimento de obstrução, os deputados chegaram a dizer que nada seria votado até que os presidentes do Legislativo - Arthur Lira e Rodrigo Pacheco - se posicionassem sobre a intervenção do Judiciário no trabalho do Legislativo. Inicialmente, os congressistas afirmavam que não iriam confirmar presença no plenário nem nas comissões.
A reação do Congresso ao STF é encabeçada pelo Partido Liberal, pelo Novo e por políticos de outras legendas da oposição que fazem parte das 22 frentes parlamentares. Apesar da afirmação de que a adesão foi massiva, ainda não havia um balanço sobre o número daqueles que chegaram a ficar "em obstrução", pois o mesmo parlamentar pode participar simultaneamente de vários grupos no Congresso.
O líder da oposição na Câmara, Carlos Jordy (PL-RJ), disse à Gazeta do Povo que os partidos estão unidos num movimento suprapartidário para demonstrar que o Legislativo não vai mais aceitar que o Supremo trate de temas que devem ser debatidos pelos representantes eleitos pela população.
Jordy destaca que não é possível mais admitir que os ministros do Supremo desempenhem um papel que não é deles, ao puxar para a Corte a responsabilidade de discutir temas como aborto, drogas, imposto sindical e demarcação de terras, por exemplo - muitos dos quais foram analisados pelo Congresso e modificados pela Corte.
"É uma pressão para que o Congresso Nacional tome uma postura. E a postura é em conjunto, porque não adianta nada a gente fazer alguma medida na Câmara e chegar lá no Senado e empacar. Então paramos as duas Casas [na terça], obstrução nas duas Casas, para que haja um respeito às nossas prerrogativas parlamentares que vêm sendo violadas", disse o líder da oposição.
Segundo ele, a união de deputados e senadores tem um mesmo objetivo: marcar posição contra os excessos do Judiciário, e, ao mesmo tempo, buscar pressionar os presidentes tanto da Câmara quanto do Senado a avançar na tramitação de matérias consideradas prioritárias pelos partidos.
Apesar disso, alguns parlamentares citaram que receberam mensagens em grupos das bancadas sobre uma possível retaliação aos que "estão em obstrução", mas eles garantem que esse é um mecanismo legal e democrático. Muitos nem se arriscaram a participar dos momentos de discurso no plenário, chamados de "breves comunicados", para evitar que haja cobrança por presença.
Caso seja confirmado o que dizem os coordenadores da obstrução, existe a possibilidade de não haver sessão nesta quinta (28).
Analistas dizem que sucesso da obstrução vai depender da articulação do movimento
Na avaliação do professor de Ciências Políticas da Universidade Federal de Ouro Preto Adriano Cerqueira, a oposição tem número suficiente para gerar problemas na tramitação de matérias no Congresso, ao provocar uma reação do Congresso ao STF, principalmente pela discordância ao que os parlamentares chamam de usurpação de temas da chamada pauta de costumes, como aborto e drogas, por exemplo. Mas ele acredita que a continuidade da obstrução ainda depende de fatores como a articulação de grupos tão diversos, mas que têm em comum a indignação com a atuação dos ministros da Corte.
Já o cientista político Antônio Henrique Lucena, da Universidade Católica de Pernambuco, diz que tudo vai depender de como o presidente da Câmara, Arthur Lira, vai se posicionar, já que ainda participa de um movimento de negociação de cargos com o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em troca de apoio para votações no Legislativo.
Lucena salienta que a relação entre os poderes no Brasil é um problema há algum tempo, já que o STF tem adotado postura de "legislador", o que gera atritos e termina "instalando essa crise entre poderes". No entanto, o cientista político lembra que grandes bancadas, como a do Agro, com mais de 350 parlamentares, têm poder hoje no Congresso Nacional, o que pode fazer diferença neste momento.
Partidos querem barrar discussão do aborto no STF e aprovar PEC que pode mudar decisões da Corte
Jordy disse ainda que os partidos querem discutir a Proposta de Emenda Constitucional, de autoria do deputado Domingos Sávio (PL-MG), que permite rever decisões do Supremo Tribunal Federal, como mais uma forma de deixar claro que a Corte deve se preocupar com a sua missão, que é o controle de constitucionalidade, e não ficar debatendo temas que estão na pauta do Congresso há tempos.
"Nós esperamos respeito às nossas prerrogativas, no sentido de que se possa conversar com o STF, para que cessem esses abusos, e também darmos respostas, aprovando a PEC do Domingos Sávio", completou o líder da Oposição na Câmara.
Domingos Sávio, que também preside a Frente Parlamentar de Comércio e Serviços, e se uniu ao movimento de obstrução, e aproveitou a reunião dos representantes das bancadas e partidos para dizer que a sua proposta não afronta em nada o STF, e só delimita seus poderes, quando uma decisão que os ministros tomarem afrontar as competências de controle de constitucionalidade. A ideia é a definição dada pelo STF possa ser revertida desde que seja aprovada por 3/5 dos deputados, em dois turnos de votação.
Já o deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS) chegou a afirmar que o Supremo deve ficar no seu "quadrado" e ressaltou que o papel constitucional da Corte é justamente proteger a Constituição.
Movimento quer posicionamento dos presidentes da Câmara e Senado sobre ativismo judicial
O presidente da Frente Parlamentar da Segurança Pública, deputado Alberto Fraga (PL-DF), condenou o que chama de "omissão" dos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), diante das reiteradas intromissões do STF em temas decididos pelo Congresso Nacional. Os presidentes do Congresso ainda não se pronunciaram.
Fraga também afirma que, além dos projetos de interesse do agro - como as demarcações de terras e indenizações a proprietários -, da PEC que possibilita a modificação de decisões da Suprema Corte, o movimento pressiona pela aprovação, no Senado, de um Projeto de Decreto Legislativo que restabeleça alguns direitos sobre o porte de armas, modificados por decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), pelo menos para preservar o direito de defesa.
Quem apoia o movimento de obstrução no Congresso
Partido Liberal – PL
Novo
Frente Parlamentar da Agropecuária – FPA
Frente Parlamentar da Segurança Pública
Frente Parlamentar dos Produtores de Leite
Frente Parlamentar Evangélica
Frente Parlamentar Católica
Frente Parlamentar Contra as Drogas
Frente Parlamentar Pela Defesa das Prerrogativas
Frente Parlamentar em Defesa das Pessoas com Deficiência
Frente Parlamentar do Livre Mercado
Frente Parlamentar Mista em Defesa da Vida e da Família
Frente Parlamentar dos CACS
Frente Parlamentar do Comércio e Serviço
Frente Parlamentar do Biodiesel
Frente Parlamentar do Brasil Competitivo
Frente Parlamentar do Cooperativismo
Frente Parlamentar dos Rodeios e Vaquejadas
Frente Parlamentar do Semiárido
Frente Parlamentar em defesa de educação sem doutrinação ideológica.
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