Uma sutil mudança no texto da reforma da Previdência feita pelo relator deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) em seu parecer sobre a proposta do governo, que está em discussão em comissão especial na Câmara dos Deputados, deixa aberta a possibilidade de uma futura anistia aos devedores do Funrural – o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural, que serve para financiar a aposentadoria de quem trabalha no campo.
Hoje 8.275 empresas ou pessoas físicas do agronegócio acumulam uma dívida que já se aproxima dos R$ 17 bilhões com o fundo.
A proposta original da reforma, enviada à Câmara pela equipe econômica do governo, estabelecia “a vedação de tratamento favorecido para contribuintes, por meio da concessão de isenção, da redução de alíquota ou de base de cálculo das contribuições sociais ou das contribuições que as substituam, exceto nas hipóteses previstas na Constituição”.
O voto do relator, que está sendo discutido pela comissão desde terça-feira (18), suprimiu essa proibição, deixando aberta a possibilidade de que novas isenções possam ser implementadas por lei complementar. “Quanto à parte final proposta para o referido dispositivo, entendemos conter detalhamentos desnecessários na Constituição, que poderão ser objeto da futura lei complementar referenciada no próprio dispositivo”, escreveu o relator.
Ao retirar a parte do texto que limita as isenções aos casos já previstos na Constituição, o relatório deixa aberta a possibilidade de que a Câmara vote o projeto do deputado Jerônimo Goergen (PP-RS), que prevê a anistia aos devedores do fundo. O Projeto de Lei 9252/17 tramita na Câmara, sem previsão de ser colocado em votação. Ele anistia o passivo do agronegócio com o fundo com base na insegurança jurídica causada por diferentes interpretações do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema.
Em 2010, o STF considerou, em decisão liminar, inconstitucional a cobrança da contribuição para o fundo. Baseados nesta decisão, muitos produtores do setor interromperam o recolhimento. Porém, em 30 de março de 2017 o Supremo mudou o entendimento e declarou a cobrança constitucional. Com a determinação, todos que deixaram de recolher tornaram-se devedores.
Na última segunda-feira (17), o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM/RJ), disse que não colocará o texto em votação enquanto o governo não demostrar de onde vai sair o dinheiro. “Não vou votar um prejuízo de R$ 30 bilhões para o orçamento público que não seja encomendado pelo governo. O governo tem que me mostrar onde tem R$ 30 bilhões para tirar. Se não, não posso entrar nessa pauta”, disse.
Promessa de campanha, crime de responsabilidade
Anistiar as dívidas do agronegócio com o Funrural é uma das promessas de campanha do presidente Jair Bolsonaro, que teve grande apoio do setor nas eleições de 2018 e conta com a adesão da bancada ruralista a seu governo. O perdão, no entanto, pode levar o governo a recorrer em crime de responsabilidade fiscal, o que o levou a um impasse.
Hoje, com a União passando por contingenciamento dos gastos, a equipe econômica não recomenda apoio ou eventual sanção ao projeto de lei em tramitação na Câmara. Mas, além disso, órgãos do governo como a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), a Receita Federal e a Advocacia-Geral da União (AGU), já alertaram que o perdão fere a Lei de Responsabilidade Fiscal. E o descumprimento dessa lei pode levar, até, a um processo de impeachment.
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