O texto do deputado Danilo Forte (União-CE) aprovado na semana passada pela Comissão Mista de Orçamento sobre o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) 2024, que deve ser votado em plenário nesta semana, pode diminuir o poder de barganha do governo. Isso porque ele cria novas regras para a execução de emendas individuais e de bancadas dos estados, que são os instrumentos usados pelos parlamentares para enviar dinheiro às suas bases eleitorais para obras ou investimentos.
A Lei de Diretrizes Orçamentárias, base para elaboração do Orçamento Geral da União, deverá ser votada pelo plenário do Congresso Nacional em sessão a ser realizada nesta terça-feira (19), segundo Danilo Forte.
Segundo ele, o Congresso ganhou "autonomia" ao definir algumas regras para a destinação das emendas ao Orçamento da União. Emendas individuais ou de bancada deverão ser pagas em no máximo seis meses, o que reduz o poder de barganha do governo. Mas a vitória do Legislativo foi menor do que os parlamentares desejavam.
Resultado de acordos com líderes, o relator fez uma complementação de voto para retirar os prazos para o pagamento de outro tipo de emendas, as de comissão. Mas decidiu manter a destinação mínima de 0,9% da receita líquida de 2022 para essas emendas, sendo dois terços para as comissões da Câmara, e um terço para as do Senado.
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) queria continuar manobrando os recursos, por meio dos ministérios, para usá-los como moeda de troca em momentos de incerteza política e conquista de votos em pautas importantes para o Executivo. Do outro, deputados e senadores queriam maior poder para decidir sobre esse dinheiro.
Após o Supremo Tribunal Federal ter declarado inconstitucionais as antigas emendas RP-9, ou de relator - que ficaram conhecidas como orçamento secreto -, no final do ano passado, o governo conquistou mais liberdade para manejar esses recursos, liberados via ministérios, ganhando maior poder sobre o orçamento. Mas os parlamentares se queixavam que as verbas demoravam a ser pagas, e tentaram encontrar formas de retomar o poder.
Foi nesse contexto que, durante a discussão da Lei de Diretrizes Orçamentárias, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), chegou a sugerir ao relator, Danilo Forte, que transformasse as emendas de comissões permanentes do Congresso em impositivas, ou seja, de pagamento obrigatório, e ainda que respeitassem um calendário pré-determinado para pagamento.
Apesar do empenho de Lira, o relator terminou cedendo aos apelos do governo, o qual reclamou que ficaria com pouco espaço de manobra no orçamento, e retirou a obrigatoriedade de empenho (compromisso de pagamento) dessas emendas, mantendo o valor previsto em cerca de R$ 11 bilhões.
Novas regras diminuem poder discricionário do governo, diz deputado Gilson Marques
Pelo relatório, as emendas impositivas terão que ser contratadas ainda no primeiro semestre de 2024. Em caso de contingenciamento de recursos para cumprimento da meta fiscal, o governo terá que fazer cortes, na mesma proporção, nas emendas e nas demais despesas não obrigatórias do Orçamento. Outro dispositivo determina que, após a liquidação da emenda, ela terá prioridade de pagamento em relação a outras despesas.
O relatório aprovado pela Comissão Mista de Orçamento também manteve os novos prazos de execução para as emendas parlamentares individuais (que somam R$ 25 bilhões) e de bancadas estaduais (R$ 12 bilhões). Essas emendas são de execução obrigatória, mas o Executivo, até agora, decide em que momento isso ocorre.
“Sempre tivemos os princípios democráticos do diálogo, da construção de consensos. Eu mesmo fui obrigado, em alguns momentos, a ter que recuar porque vi que não tinha o necessário consenso”, declarou Forte.
Para a líder do Partido Novo na Câmara dos Deputados, Adriana Ventura (SP), o estabelecimento de datas para o pagamento das emendas impositivas, tanto as individuais quanto de bancada, foi uma vitória do Legislativo. A deputada afirmou que esse foi "um contra-ataque ao toma-la-da-cá" geralmente utilizado pelo governo para aumentar seu poder de barganha na conquista de votos para aprovar matérias de seu interesse, como aconteceu, recentemente, na votação da reforma tributária.
A deputada ressalta que o Orçamento não pode ser usado de forma eleitoreira, às portas das eleições municipais de 2024, nem como massa de manobra em votações. "Para além da questão do prazo, as emendas impositivas deveriam ser usadas estritamente para o bem comum, a partir da análise de dados e com critérios técnicos para a escolha dos beneficiários, alinhadas com o planejamento estadual de políticas públicas", pontua.
Adriana Ventura lembra ainda que não dá para esquecer que o orçamento brasileiro é curto, e, portanto, não deveria ser gasto com o que não é essencial.
Para o deputado Gilson Marques (Novo-SC), é indiscutível que o Congresso ganhou maior poder na LDO 2024, já que o relator colocou prazo até 30 de junho de 2024 para o empenho e pagamento das emendas impositivas, para custeio da saúde e assistência social; o que segundo ele, "diminui a capacidade do governo manipular o Orçamento, liberando recursos próximo a votações importantes".
Ainda de acordo com o parlamentar, a inclusão de um valor mínimo de R$ 11 bilhões para emendas de comissão fará com que as emendas somadas cheguem a um total de R$ 50 bilhões em 2024. "Quanto maior o valor das emendas distribuídas pelo Congresso, menor o valor discricionário que sobra para aplicação do próprio governo", explicou o deputado.
Presidente do PT reclama de valor de emendas para Congresso
A presidente nacional do PT, a deputada Gleisi Hoffmann, em mais um capítulo da guerra pelo poder de distribuição das emendas, atacou o Congresso por reservar R$ 48 bilhões aos parlamentares no texto-base do Orçamento de 2024. Do total aprovado na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), R$ 37 bilhões são para pagamento obrigatório em até 30 dias após a divulgação das propostas.
Gleisi disse que o Congresso está impondo uma espécie de “parlamentarismo orçamentário” após o Judiciário proibir o mecanismo chamado anteriormente de “orçamento secreto”.
“A Comissão Mista de Orçamento avançou mais um tantão nas verbas orçamentárias a serem executadas por parlamentares. […] Só para se ter ideia da grandeza do número, R$ 48 bi é mais da metade que o destinado para todo investimento no país este ano”, postou a deputada numa rede social.
Gleisi afirmou que o aumento no valor das emendas – que estão fechando 2023 na casa dos R$ 39 bilhões – vão impactar nos programas sociais e investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que podem chegar a um total de R$ 1,7 trilhão até 2027.
Congresso tende a cada vez mais aumentar controle sobre orçamento, diz analista
Para o analista político Adriano Cerqueira, da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e do IBMEC, o Congresso quer cada vez mais diminuir a dependência do Executivo ao definir a liberação de recursos previstos no orçamento, geralmente usado como forma de pressão para obter vantagens em projetos defendidos pelo governo. Para Cerqueira, com a declaração da inconstitucionalidade do orçamento secreto pelo STF, que garantir mais liberdade ao Congresso, o poder do presidente Lula sobre o dinheiro do orçamento voltou a aumentar, o que desagradava os parlamentares.
"Essa queda de braço que está acontecendo é fazer as chamadas emendas impositivas - o que está previsto no orçamento e tem que ser votado no ano seguinte. É isso que está em questão. O governo está perdendo um arbítrio que tinha antes para definir que emendas seriam ou não privilegiadas na liberação de recursos".
Cerqueira lembra o que ocorreu na semana passada, quando o governo liberou R$ 10 bilhões em emendas para garantir a aprovação de matérias da pauta econômica, que foram analisadas na Câmara.
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