A legislatura atual do Congresso Nacional, que se encerra em fevereiro, teve como uma de suas características a presença de policiais, militares ou outros representantes da categoria da segurança pública. Foram eleitos para Câmara e Senado em 2018 um total de 44 deputados e senadores com esse perfil, contra 18 em 2014. Os deputados e senadores "coronéis", "capitães" ou de outras patentes tiveram no combate à criminalidade sua principal bandeira eleitoral. A entrega de resultados concretos a demandas do setor, porém, não se efetivou de modo amplo.
O Congresso "dos coronéis" não conseguiu aprovar temas caros ao eleitorado mais conservador, como a redução da maioridade penal, o fim das "saidinhas" dos presos ou a prisão dos condenados em segunda instância judicial. Tampouco não se consolidou a aprovação da ampliação do "excludente de ilicitude", que representaria mais possibilidades para agentes de segurança matarem em serviço e não serem responsabilizados por isso.
O grupo também acabou alcançando menos força institucional do que esperava à época da posse. A Frente Parlamentar da Segurança, que abre as portas para todos os parlamentares interessados na temática e é chamada informalmente de "bancada da bala", se tornou numericamente o maior agrupamento do tipo da história do Congresso. Mas isso não se reverteu em poder efetivo ao grupo. Tanto a Câmara quanto o Senado elegeram, nos últimos quatro anos, presidentes que não fazem parte do segmento militar ou da segurança. Os "coronéis" ficaram de fora até mesmo das composições da mesa diretora da Câmara e da comissão diretora do Senado formadas desde 2019.
O cenário contrasta com a euforia vivida pela bancada em 2019, à época da posse da atual legislatura. Relacionados à bancada da segurança e impulsionados pela boa votação de 2018, nomes como Capitão Augusto (PL-SP), Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e Delegado Waldir (União Brasil-GO) foram citados como possíveis candidatos à Presidência da Câmara – o que não se concretizou.
Em janeiro de 2022, a Gazeta do Povo mostrou que o grupo atribuía três fatores para explicar a falta de avanço dos projetos de interesse do setor: a resistência de parlamentares de esquerda, o foco em ações de combate à pandemia de coronavírus e a falta de empenho do governo de Jair Bolsonaro (PL) para aprovação de reformas.
Congresso "dos coronéis" teve vitórias parciais
Mas a bancada "dos coronéis" não teve só insucessos. O grupo conseguiu a aprovação de temas importantes, como o pacote anticrime, idealizado ainda no início do mandato de Bolsonaro pelo então ministro da Justiça, Sergio Moro. A norma contempla, entre outros pontos, o aumento da pena máxima no país, de 30 para 40 anos; a proibição das saídas temporárias em datas festivas para condenados por crime hediondo com morte; mudanças nas regras sobre delação premiada; e permissão para que estados construam presídios de segurança máxima. A aprovação do pacote foi considerada uma grande vitória para o grupo – ainda que o texto tenha sido bastante atenuado desde sua proposta original, e sofreu a exclusão de tópicos como a prisão dos condenados em segunda instância e o "plea bargain", que consiste em uma negociação entre réu e acusação que pode diminuir a pena.
Outro exemplo de conquista obtida pela bancada "dos coronéis" foi o avanço parcial de proposições de interesse do grupo. O segmento conseguiu que alguns projetos superassem etapas dentro do longo processo que marca a tramitação de matérias dentro de Câmara e Senado. Um caso com esse perfil foi a aprovação pela Comissão de Segurança Pública da Câmara, em junho de 2022, de uma proposta que amplia as hipóteses do excludente de ilicitude. O projeto teve relatoria do deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), ex-oficial da Polícia Militar do seu estado e candidato ao Senado em 2022. A iniciativa foi enviada ao Congresso pelo governo federal, parte de um conjunto de propostas enviado pelo Executivo em março. Mas se encontra parada desde então.
O grupo "dos coronéis" foi bem sucedido também em retomar a tramitação de um projeto que extingue, em definitivo, as "saidinhas" dos presos em regime fechado. A proposta havia sido apresentada no Congresso em 2012, pela então senadora Ana Amélia (PSD-RS). Tinha sido aprovada pelo Senado no ano seguinte, quando também foi remetida à Câmara. Aguardou apreciação pelos deputados por quase uma década até ser aprovada pelo plenário da Câmara no último mês de agosto. Como o projeto foi modificado pelos deputados, precisa de outros análise pelo Senado – o que só deve ocorrer após a posse dos novos parlamentares, a partir de fevereiro.
Como especialistas veem a atuação da bancada da segurança
Para o advogado Victor Minervino Quintiere, que também é professor de Direito Penal, a legislatura atual deixou a atuação do Congresso "mais repressiva". Segundo ele, a atuação dos parlamentares do setor da segurança pública esteve focada em questões punitivas, como medidas que ampliem o tempo de reclusão de condenados. Ele avalia que isso ocorreu tanto na Câmara quanto no Senado, embora com mais foco maior dos deputados.
Já o também advogado Raul Abramo, especialista em Direito Penal, acredita que a atuação do Congresso em relação à segurança pública na atual legislatura foi "muito reativa". Ele relaciona episódios como a eclosão do "novo cangaço" para citar que o Congresso acabou sendo pautado por circunstâncias da sociedade. Para ele, isso levou ao que qualifica como debates precipitados e sem o embasamento adequado. "É uma atuação que em muitas ocasiões segue o perfil de 'colcha de retalhos', sem um alinhamento estratégico", diz. Abramo afirma que isso pode gerar uma falsa sensação de segurança na sociedade, por dar a impressão de que temas de grande relevância estão em debate.
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