A articulação da oposição e do Centrão está impulsionando a tramitação de pautas conservadoras, mostrando que o Congresso Nacional está disposto a aprová-las. Ao menos três deverão ter andamento nesta semana: o Projeto de Lei (PL) que restringe as "saidinhas" temporárias de presos em feriados e a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para ampliar a isenção fiscal para igrejas, que estão sob análise dos deputados; e a PEC que criminalizar a posse e o porte de qualquer quantidade de qualquer tipo droga, que está tramitando no Senado.
Sob a relatoria do deputado federal Capitão Derrite (PL-SP), que se licenciou do cargo de secretário de Segurança de São Paulo para analisar novamente o projeto, o PL das "saidinhas" (2.253/2020) já encontra acordo na Câmara dos Deputados para ser votado ainda esta semana.
O texto foi aprovado pelo Senado em fevereiro, com 62 votos favoráveis, contando com o apoio do presidente da Casa, o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG). A tendência é que uma alteração feita pelos senadores no projeto seja mantida pelos deputados: permissão para saída temporária de presos para cursos profissionalizantes ou ensino médio e superior, pelo tempo necessário para a realização das atividades relacionadas aos estudos.
A PEC das drogas (45/2023), por sua vez, começará a ser discutida no Senado nesta terça-feira (19), após aprovação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa na semana passada. Haverá debates sobre a proposta em cinco sessões, como estabelece o regimento interno para PECs, e a votação do texto ficará para o início de abril. Pacheco é um dos principais signatários desta proposta.
A PEC que amplia as isenções fiscais para igrejas (05/2023) recentemente foi aprovada em uma comissão especial e agora está em fase de acordos na Câmara dos Deputados. O governo se viu obrigado a se engajar na conversa, por meio do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que busca delimitar alguns trechos da proposta. Uma reunião para debater o assunto está marcada para esta terça-feira.
O texto, sob a relatoria do deputado federal Fernando Máximo (União-RO), ainda não está fechado e deverá sofrer alterações até a votação em plenário, a fim de acomodar os acordos. Se aprovada, a imunidade valerá não só para as tributações de renda e patrimônio, mas também para as tributações indiretas das igrejas e templos, como construção e reformas dos templos e para obras voltadas para prestação de serviços para a comunidade.
Nas pautas de costume, Centrão geralmente vota com a direita
As propostas acima mencionadas são exemplos de temas que ecoaram no Congresso após forte repercussão na sociedade civil. No caso do PL das "saidinhas", o projeto ganhou força após um sargento da Polícia Militar de Minas Gerais ser morto por um criminoso que foi beneficiado pela saída temporária de Natal.
Por outro lado, o andamento do projeto também revela a influência da nova configuração do Congresso Nacional após a eleição de 2022. Apesar da derrota do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), a direita e a centro-direita conseguiram emplacar mais de 200 deputados, sendo 99 só do Partido Liberal. Outro fator relevante é que, em pautas de costumes, partidos de centro, como PP e PSD, tendem a votar alinhados à direita.
Comentando esse aspecto, o cientista político Adriano Cerqueira, do Ibmec de Belo Horizonte, lembra que, além da organização dos partidos, a disputa eleitoral deste será marcada pela presença da direita.
“Na questão de costumes, inclusive na questão da segurança pública, os partidos de centro-direita e direita tendem a convergir na defesa do combate ao aborto, no combate à criminalidade, na facilitação da posse de armas. E como este é um ano eleitoral, isso mobiliza o eleitorado de direita, que está se tornando cada vez mais a principal força política eleitoral aqui no Brasil”, avalia Cerqueira.
PEC das Igrejas reflete influência dos evangélicos no Congresso
O ímpeto conservador também se manifesta nos corredores do Legislativo. Enquanto a PEC das "saidinhas" demonstra a força da Segurança Pública, a PEC que amplia as isenções fiscais para igrejas e templos religiosos mostra que o segmento evangélico ampliou seu poder nesta última legislatura.
Com uma composição de 228 membros, entre deputados e senadores, a Frente Parlamentar Evangélica do Congresso Nacional chegou a causar desconforto a Lula após suas críticas a Israel.
Com a ampla participação religiosa na manifestação organizada por Bolsonaro em 25 de fevereiro, na Avenida Paulista, em São Paulo, o Palácio do Planalto se viu forçado a levantar a bandeira branca e não atrapalhar o andamento da PEC na Câmara.
Centrão também capitaliza com pautas conservadoras
Com espectro político oscilante, o Centrão também tira proveito de pautas conservadoras com amplo apoio social. A PEC das drogas, de autoria de Pacheco, é vista por analistas como um projeto que atende ao anseio popular no combate às drogas e também serve de resposta ao Supremo Tribunal Federal (STF), que está julgando a descriminalização do porte de maconha para consumo pessoal.
Na avaliação do cientista político Elton Gomes, professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI), o avanço de projetos de cunho conservador é resultado da dificuldade do governo em articular pautas progressistas e do ganho político que os parlamentares terão ao aprovar pautas com apelo popular.
“Nesta legislatura, o governo enfrenta dificuldades para avançar com suas pautas mais ideológicas, de intervenção mais pesada do Estado e em assuntos relativos às instituições religiosas, por exemplo. No caso das pautas conservadoras, há uma explicação muito simples: a economia política do voto. O parlamentar quer se reeleger. Ele precisa adotar políticas e condutas que beneficiem suas bases eleitorais. A maior parte do eleitorado brasileiro é favorável ao andamento de pautas como estas”, diz Elton.
Oposição também avançou na disputa legislativa
A eleição dos deputados federais Caroline de Toni (PL-SC), Nikolas Ferreira (PL-MG) e Alberto Fraga (PL-DF) para importantes comissões da Câmara – Constituição e Justiça, Educação e Segurança Pública, respectivamente – mostra que a oposição soube articular junto às lideranças da Casa uma posição de vantagem sobre o governo neste ano.
São colegiados que podem dificultar os planos do Planalto, portanto a oposição deverá ter mais espaço de articulação em temas importantes. No caso da comissão presidida por De Toni, o colegiado será responsável por aprovar a PEC que limita decisões individuais dos ministros do STF e outros projetos importantes para a própria oposição, como o "pacote anticrime" já pautado pela presidente da comissão e o "pacote invasão zero", com propostas para coibir invasões de terras.
Já o grupo comandado por Nikolas Ferreira irá avaliar o Plano Nacional de Educação (PNE), peça chave para as políticas educacionais propostas pelo governo. Nesse contexto, é esperado que o parlamentar barre projetos ligados à ideologia de gênero e pautas progressistas no âmbito da Educação.
A comissão presidida por Fraga, que era comandada pela oposição no ano passado, deverá manter a cobrança junto ao Ministério da Justiça acerca de temas de Segurança Pública. Dentre as pautas prioritárias, a reversão parcial do decreto do governo acerca da posse de armas está no centro das discussões do colegiado.
Derrota da oposição na CCJ expõe necessidade de organização
Apesar de conquistar importantes comissões, a oposição ainda precisará lidar com a capacidade de manobra dos governistas para barrar projetos relevantes. Após pautar projetos "anticrime" para endurecer o Código Penal, na última terça-feira (12), De Toni viu aliados do Planalto impedirem a discussão de ocorrer.
O deputado Chico Alencar (Psol-RJ), membro da comissão, alegou durante a sessão que a pauta que previa a análise do pacote anticrime não foi debatida pelos coordenadores de bancada na comissão. Por conta disso, os deputados aprovaram a inversão da pauta, ou seja, os primeiros projetos da agenda seriam colocados em último lugar. O conjunto de projetos deve permanecer na pauta enquanto se busca um entendimento entre a oposição e a base governista na comissão.
Nos bastidores, essa vitória do governo é vista como falta de coordenação por parte da própria oposição, que, segundo um parlamentar, poderia ter adiado a votação até ter certeza de que não havia dúvidas quanto à tramitação da proposta. Outro fator observado foi a presença massiva de governistas durante a sessão. No painel da CCJ, 96 deputados confirmaram presença na comissão, mas as filmagens do colegiado mostram uma participação menor de oposicionistas.
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