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Câmara e Senado

Oposição mira comissões estratégicas para fortalecer pautas e ampliar vitrine para 2026

O deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) é cotado para assumir a Comissão de Relações Exteriores da Câmara, enquanto seu irmão, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), deve assumir a Comissão de Segurança Pública no Senado (Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado)

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Passadas as eleições para presidência na Câmara dos Deputados e no Senado, a oposição no Congresso está articulando para obter a liderança de comissões-chave nas duas Casas, a fim de reforçar suas pautas prioritárias e, consequentemente, garantir visibilidade para as eleições de 2026. Segurança pública e relações exteriores estão entre as prioridades do grupo.

Na Câmara, os maiores partidos têm direito de fazer as primeiras escolhas. A oposição deve ficar com pelo menos quatro comissões, já que o Partido Liberal (PL) tem o maior número de deputados.

A instalação dos colegiados deve ocorrer somente depois do carnaval, mas já se sabe que o partido do ex-presidente Jair Bolsonaro trabalha para garantir que o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) presida a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (Credn) e para que o deputado Paulo Bilynkyj (PL-SP) assuma a Comissão de Segurança Pública. O PL também está de olho nas comissões de Saúde e de Fiscalização Financeira e Controle, ambas comandadas pelo PT no ano passado.

No Senado, após dois anos sem cargos de protagonismo em comissões, o apoio ao novo presidente, Davi Alcolumbre (União-AP), deve garantir que pelo menos três sejam comandadas por senadores de oposição ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2025.

A senadora Damares Alves (Republicanos-DF) foi indicada para presidir a Comissão de Direitos Humanos; o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) está cotado para comandar a Comissão de Segurança Pública; e o senador Marcos Rogério (PL-RO), a Comissão de Infraestrutura. Os nomes ainda precisarão ser aprovados pelos membros de cada colegiado. 

A escolha da oposição por comissões no Congresso reflete sua estratégia de consolidar bandeiras e manter visibilidade para 2026. O cientista político e CEO do Ranking dos Políticos, Juan Carlos Arruda, afirma que a escolha das comissões “sugere que a oposição busca consolidar suas bandeiras e ter palanques de visibilidade para lideranças já conhecidas” e que há um componente eleitoral para 2026 na indicação dos nomes.

“Flávio Bolsonaro, Damares e Eduardo Bolsonaro são nomes que podem estar no jogo para diferentes cargos, e essas comissões dão a eles uma vitrine para se manterem relevantes no debate nacional”, pontuou o cientista político. 

Oposição viverá novo momento no Senado 

Ao contrário da Câmara, que renova anualmente a presidência das comissões temáticas, no Senado essa troca ocorre a cada dois anos. Com isso, ao apoiar Rogério Marinho (PL-RN) na disputa pela presidência do Senado em 2023, a oposição ficou isolada no acordo que garantiu a eleição de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) naquele ano.

Mas, após ter apoiado a candidatura do recém-empossado Alcolumbre, a oposição viverá um novo momento no Senado em 2025 e 2026. A consultora de Legislativo da BMJ Consultores Associados, Letícia Mendes, avalia que, assumindo o comando das comissões de Direitos Humanos e da Segurança Pública, a oposição pretende trazer à tona as pautas de costumes que afetam diretamente o eleitorado da maior parte da bancada de oposição ao governo Lula.

Na Comissão de Direitos Humanos, tradicionalmente comandada pelo PT, Damares deve dar uma “nova cara” aos trabalhos, trazendo pautas de costumes para os debates. A senadora, que foi ministra dos Direitos Humanos durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), afirmou que, sendo eleita, vai priorizar pautas relacionadas à proteção das crianças, dos idosos, da mulher e dos povos tradicionais, além dos direitos das pessoas com deficiência. “Vamos tratar direitos humanos de maneira universal”, afirmou Damares. 

Já em relação a Comissão de Infraestrutura, que é responsável por opinar a respeito de matérias relacionadas a obras públicas em geral, o grande foco da oposição deve ser em outra atribuição: a de votar as indicações do Executivo para os cargos de diretores das agências reguladoras. Assim, o senador Marcos Rogério, indicado para presidir a comissão, terá o poder de pautar essas votações. 

“Nesse processo de negociação, a oposição sabe muito bem utilizar desses instrumentos para fazer turbulência dentro do governo. Tendo em vista que esses nomes geralmente também são utilizados como troca de cargos e favores, e que o governo deve passar por uma reforma ministerial, a presidência da comissão é importante para a oposição”, avalia a consultora Letícia Mendes.  

Oposição deve ter dobradinha na presidência das comissões de segurança pública no Congresso 

Tanto na Câmara quanto no Senado, a oposição está focando em assumir as comissões de segurança pública. A escolha, na avaliação do pesquisador em direito e segurança pública, Fabrício Rebelo, comporta análise sob duas vertentes principais. A primeira leva em conta o fato de a segurança pública ser uma das maiores mazelas atuais do país.

“Estar à frente dessas comissões acaba por dar destaque aos parlamentares, capitalizando-os politicamente”, disse Rebelo.

A segunda vertente seria a de dar um freio ao ímpeto do governo de assumir o protagonismo nas pautas de segurança pública.

“Com a publicação do Decreto 12.341, no final de 2024, o governo deixou claro que pretende interferir diretamente na segurança pública, mesmo ao arrepio da Constituição Federal. Nesse sentido, a oposição assumir as comissões de segurança  pode marcar uma resistência à interferência pretendida pelo governo federal”, disse Rebelo ao se referir ao decreto que orienta policiais a usar armas de fogo como “último recurso”. 

Em entrevista para a Agência Senado, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) disse que, ao ser eleito presidente da Comissão, pretende pautar matérias que elevem as penas para crimes violentos.

“A linha vai ser priorizar os projetos que endureçam a legislação penal, em especial no tocante aos crimes violentos. Acabar, por exemplo, com essa 'porta giratória' que é a audiência de custódia, em que marginais perigosos reincidem com uma frequência absurda. Vão para a audiência de custódia e saem no mesmo dia, antes mesmo do policial”, pontuou o senador. 

O deputado Paulo Bilynskyj (PL-SP) acredita que o colegiado terá papel fundamental em 2025. “A Segurança Pública é apontada em pesquisas como o setor que mais preocupa o cidadão brasileiro e não é à toa, pois ele afeta o dia a dia. Precisamos virar a página e enfrentar de fato situações que levam à impunidade e acabar com políticas que defendam o criminoso”, disse o deputado à Gazeta do Povo

O novo líder do PL, deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), também confirmou que uma das prioridades da bancada da oposição será fortalecer projetos de segurança pública. "O PL vai insistir em tudo o que é direito regimental do PL. O que for prioridade para nós, eu vou pedir”, disse o deputado, ao se referir sobre as negociações das comissões na Câmara.

Presidência da Comissão de Relações Exteriores tem foco no fortalecimento da direita internacional 

A presidência da Comissão de Relações Exteriores (Credn) na Câmara está no centro das atenções do PL. A comissão deve ser a primeira escolha do partido, já que neste ano, devido a um acordo fechado ainda em 2023, não deve ter a presidência da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a mais importante da Casa.

Embora não seja uma comissão tradicionalmente forte ou com protagonismo, o cenário internacional pode fazer com que os temas tratados na Credn ganhem relevância. A posse de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos é um dos principais motivadores para a oposição a assumir o comando da comissão.

O professor do departamento de Ciência Política da Universidade Federal do Piauí (UFPI) Elton Gomes lembra que a oposição tem buscado apoio internacional, especialmente entre os Republicanos dos EUA, para denunciar uma perseguição judicial a políticos de direita. Assim, eles têm dado notabilidade para a pauta da liberdade de expressão no Brasil, e a expectativa é que isso se acentue durante o mandato de Trump.

“É importante porque, dentre outras coisas, uma das estratégias da oposição para poder contrabalançar a aliança entre a Suprema Corte e o Partido dos Trabalhadores foi procurar apoio internacional”, explica Gomes.

Outra hipótese aventada nos bastidores de Brasília sobre o interesse do PL na Credn é que seria mais constrangedor para o STF ordenar uma eventual apreensão do passaporte de Eduardo Bolsonaro para impedir que ele mantenha contato pessoal com seus interlocutores nos Estados Unidos.

O deputado já comandou a comissão de Relações Exteriores da Câmara em 2019 e é coordenador da secretaria nacional de relações institucionais e internacionais do PL.

A indicação de Eduardo, no entanto, enfrenta a resistência da bancada do PT, que quer barrá-lo para manter a comissão sob o comando do PSDB, que ocupa o posto atualmente.

O temor é que, sem o poder de articulação na comissão, o governo terá que lidar com a resistência a projetos relacionados à COP-30, a conferência mundial do clima. A COP-30 será realizada no Brasil neste ano, tendo como sede a cidade de Belém, no Pará. Lula tem usado o evento para tentar garantir algum protagonismo internacional, se apoiando nas pautas ambientais, tendo como aliada a ministra Marina Silva, conhecida internacionalmente pela sua defesa do meio ambiente.

Comissões de Saúde e de Fiscalização e Controle têm poder de pressionar o governo 

Ao buscar assumir as comissões de Saúde e de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC), a oposição também busca ampliar as formas de pressionar o orçamento do governo.

A Comissão de Saúde é a que tem o poder de controlar o maior volume de recursos a ser aplicados pela União. Sem o comando dessa comissão, o governo fica à mercê das decisões da oposição sobre os valores destinados. 

Neste sentido, o professor de Ciência Política Elton Gomes alerta que há a probabilidade do Congresso, sob o comando de líderes do Centrão, colocar em votação "pautas-bomba" para o governo, a fim de aumentar ainda mais os gastos públicos. Para Gomes, a estratégia pode ser usada caso os congressistas percebam o governo mais fraco. 

No caso da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC), o poder está em ser responsável por acompanhar os gastos da União. Com essa função, ela é a única comissão da Câmara dos Deputados que não possui limitação temática para convocar qualquer ministro do governo. As demais comissões ficam limitadas aos seus temas específicos para convocar os responsáveis das pastas relacionadas. Esse poder de convocação é o que torna a comissão cobiçada pela oposição e temida pelo governo.  

No ano passado, a comissão de fiscalização e controle foi comandada pelo deputado Joseildo Ramos (PT-BA), mas, em 2023, a presidência esteve a cargo da deputada Bia Kicis (PL-DF). Sob o comando da deputada de oposição, 14 reuniões foram dedicadas a questionar ministros do governo Lula sobre a atuação de suas pastas.

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