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Relações Internacionais

EUA, Argentina, Israel e Ucrânia driblam Lula para manter relações diplomáticas com brasileiros

Lula dá recepção calorosa ao chanceler russo Sergei Lavrov no Palácio do Planalto em fevereiro de 2024.
(Foto: Ricardo Stuckert/PR)

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Ações de política externa do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), orientadas ideologicamente para a esquerda e para dar apoio a governos autoritários, estão fazendo países como Estados Unidos, Ucrânia, Argentina e Israel driblarem as vias diplomáticas e procurarem a oposição para fazer contato político com a sociedade brasileira.

O contato básico entre o Itamaraty e diplomatas desses países continua para a resolução de questões comerciais e consulares (como vistos e questões envolvendo cidadãos). Mas o diálogo político está praticamente congelado e os países acusam Lula de intransigência e radicalismo.

A reportagem apurou que, nos bastidores, o sentimento comum entre representantes desses países é que Lula não representa a sociedade brasileira em diversos assuntos de interesse mundial - como ao comparar os israelenses aos nazistas ou se recusar a tentar mediar o resgate de 20 mil crianças levadas da Ucrânia para adoção forçada na Rússia.

Além disso, o governo Lula simplesmente não recebe diplomatas de países com quem não simpatiza ou usa subterfúgios para postergar essas recepções a fim de não ter que tratar de assuntos que acha desfavoráveis.

Por isso, membros desses governos estão adotando a estratégia de fazer contato direto com membros do Congresso e com a imprensa do Brasil. O caso mais recente foi o do governo do presidente Donald Trump, dos Estados Unidos, que convidou a ex-primeira dama Michelle e o deputado Eduardo Bolsonaro para sua cerimônia de posse nesta segunda-feira (20).

Lula não foi convidado, mas não é tradição que presidentes compareçam à posse nos Estados Unidos. Mesmo assim, isso indica que, apesar de deixar os canais diplomáticos tradicionais abertos, Trump deve preferir dialogar diretamente com Bolsonaro e a oposição em vez de procurar o Presidente da República, segundo analistas ouvidos pela reportagem.

Durante a campanha presidencial americana, ao comparar Trump com Kamala Harris, Lula associou o americano ao nazismo e ao fascismo "com outra cara". Já quando Trump tomou posse, o brasileiro sugeriu que a relação entre os países de "cooperação, fundamentada no respeito mútuo e em uma amizade histórica" continue avançando. Ele também disse que não quer briga com os Estados Unidos.

Representantes da Ucrânia não são recebidos por Lula e apelam à imprensa brasileira

Um caso da semana passada envolveu a Ucrânia. Desde que Lula assumiu seu terceiro mandato, o presidente Volodymyr Zelensky vem pedindo para ser recebido no Brasil e convidando Lula para visitar Kyiv. O petista já recebeu duas vezes o chanceler russo Serguei Lavrov, mas vem negando audiências ao chanceler ucraniano. Zelensky chegou a viajar a Brasília (a caminho da Argentina) em 2023 e nem assim Lula concordou em falar com ele.

O chefe de gabinete de Zelensky, Andrii Yermak, então apelou à imprensa na semana passada para fazer chegar a Lula o recado que queria convidá-lo para mediar negociações de resgate de cerca de 20 mil crianças ucranianas que foram sequestradas e adotadas ilegalmente por famílias russas. Questionado por órgãos de imprensa brasileiros, o Itamaraty disse que a proposta de paz da China, da qual o Brasil é signatário, já cobre o tema. Mas a proposta não trata do problema e é considerada pró-Rússia por não prever a devolução de territórios anexados à força por Moscou na Ucrânia.

Em entrevista à imprensa, Yermak disse acreditar que apesar de Lula não ligar para o assunto, o povo brasileiro se compadece da tragédia ucraniana. Por isso, Kyiv tem investido em criar parcerias e promover viagens de parlamentares brasileiros para a Ucrânia e políticos ucranianos para o Brasil. Ao menos três encontros oficiais já aconteceram.

Oficialmente o Itamaraty diz que condena a invasão da Ucrânia pela Rússia nas instâncias internacionais. Mas na prática Lula dá sinais de apoiar o ditador russo Vladimir Putin, como ao vetar a venda de ambulâncias blindadas para a Ucrânia ou assinar a proposta de paz escrita pela China e apoio à Rússia.

Israel recorre a Eduardo Bolsonaro para cobrar explicações da Justiça do Brasil

Com Israel, a situação é similar. O Itamaraty foi cuidadoso ao criticar as ações terroristas do grupo Hamas e rápido ao condenar ataques israelenses que causaram baixas civis na Faixa de Gaza. O governo israelense então deu um passo além da Ucrânia e deu a Lula o título de "persona non grata". O petista se transformou no primeiro presidente brasileiro a não ser considerado bem-vindo em um país estrangeiro.

A punição dada a Lula foi resultado dele ter comparado a guerra que Israel vinha travando contra terroristas do Hamas com as ações dos nazistas contra os judeus. Mesmo antes disso, o embaixador de Israel, Daniel Zonshine, já preferia o contato com a oposição. Ele foi ao Congresso Nacional e se encontrou com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e parlamentares em 2023.

A estratégia continua em prática. Em janeiro deste ano, o ministro de Assuntos da Diáspora e Combate ao Antissemitismo de Israel, Amichai Chikli, preferiu procurar o deputado Eduardo Bolsonaro para entregrar uma carta ao invés de buscar as vias diplomáticas tradicionais. Ele criticou a decisão da Justiça Federal do Brasil de ordenar a investigação de um soldado israelense em férias no Brasil simplesmente pelo fato de ter servido nas Forças de Defesa de Israel em um cargo de baixa patente. A Justiça havia sido provocada por uma organização militante palestina.

Um dos receios dos israelenses é que o assunto ficasse escondido da população se fosse tratado apenas com diplomatas pelas vias oficiais. A carta acabou publicada nas redes sociais de Eduardo e teve ampla cobertura de mídia.

Milei veio ao Brasil e não se encontrou com Lula

A relação de Javier Milei, o presidente da Argentina, com Lula também é praticamente nula, devido a diferenças ideológicas profundas e, principalmente, por Lula ter tentado interferir na eleição argentina apoiando Sergio Massa, o candidato do então presidente peronista Alberto Fernández. Lula angariou a repulsa de Milei por usar o governo brasileiro para favorecer o adversário.

Segundo reportagem do jornal Estado de São Paulo, em 2023, Lula teria atuado para autorizar uma operação para que o Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF) concedesse empréstimo de US$ 1 bilhão à Argentina. Apesar do empréstimo não ser ilegal, a articulação foi interpretada como uma tentativa explícita de ajudar em um momento em que a ação poderia ter impacto eleitoral.

Com a derrota do peronista e a vitória do atual presidente, a relação entre os governos brasileiro e argentino esfriou e o novo presidente argentino passou a estreitar os laços com a oposição local. Em julho do ano passado, ele participou da Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC), realizada em Balneário Camboriú, e fez duras críticas aos governos socialistas da América do Sul e apontou perseguição a nomes da direita em diversos países, inclusive no Brasil.

"Lula está isolando o Brasil no cenário internacional", diz cientista político

Para o cientista político Marcelo Suano, doutor em Ciência Política pela USP, as declarações e ações do presidente Lula estão contribuindo para um isolamento do Brasil no âmbito internacional. Ele critica as alianças com regimes questionados mundialmente, afirmando que isso afasta o país de parceiros estratégicos.

“O que o presidente Lula fez foi exatamente cumprir a profecia das narrativas da esquerda. Ele está isolando o Brasil internacionalmente porque se aliou a personagens e estados questionados por seus regimes políticos. São ditaduras que desrespeitam os direitos humanos e afetam a ordem internacional,” afirmou.

Suano citou como exemplo a proximidade do governo brasileiro com grupos e países que atuam de forma autoritária ou até terrorista. “Vamos pegar o Hamas. O governo não pode ser aliado de uma organização terrorista, mesmo que tenha um braço político mascarado. Isso ficou muito claro para o mundo inteiro,” disse.

Aproximação entre Trump e oposição pode atrapalhar diplomacia brasileira

A exclusão de Lula da posse de Trump e o comparecimento da oposição no evento, com destaque para a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro e o deputado federal Eduardo Bolsonaro, indica que a relação entre o chefe do Executivo americano e a direita brasileira poderá embaralhar as relações entre Washington e Brasília.

Nesse cenário, o Itamaraty poderá ter dificuldades em lidar, por exemplo, com eventuais sanções de Trump contra ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Durante o ano passado, parlamentares brasileiros foram aos Estados Unidos denunciar a conduta do ministro Alexandre de Moraes na condução do julgamento dos presos no 8 de janeiro.

Para o cientista político Thales Castro, presidente do Instituto de Pesquisas Estratégicas em Relações Internacionais e Diplomacia (IPERID), a vitória de Trump embaralha a diplomacia brasileira, que já enfrenta dificuldades em função da postura do governo Lula. “A crise socioeconômica, o déficit fiscal e a crise moral do governo Lula criam um cenário problemático. Enquanto isso, Trump observa com atenção o Brasil e outros países da América Latina,” afirmou.

O analista afirmou que Trump já obteve vitórias diplomáticas antes mesmo de assumir, como o cessar-fogo entre Israel e Hamas e a devolução de três reféns. Para Castro, essas movimentações consolidam a posição de Trump no cenário global, com implicações para o Brasil.

"Podemos esperar um cenário de retaliação contra o Brasil. O senador Marco Rubio, da Flórida, que será o próximo secretário de Estado, possui uma visão muito clara sobre a América Latina. Ele conhece profundamente a região e compreende como o lawfare — o uso e abuso da Justiça para fins de perseguição e para o estabelecimento de uma neoautocracia pelo Judiciário — vem sendo utilizado. Essa estratégia certamente será observada com muita atenção pelo governo americano."

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