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Projeto quer taxar redes sociais e plataformas de streaming para bancar filmes nacionais
Projeto de lei mira plataformas de streaming e redes sociais com imposto sobre audiovisual| Foto: Oscar Nord/Unsplash

A oposição se mobilizou nesta semana para barrar a votação de um projeto de lei que estabelece a cobrança de imposto sobre as plataformas de internet que realizam streamings (exibição de vídeos e filmes), como a Netflix, e que operam redes sociais que permitem o "compartilhamento de conteúdo audiviosual", a exemplo do Youtube, Instagram, X e Facebook.

Esse imposto já existe e é chamado de Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine), gerida pela Agência Nacional de Cinema (Ancine), que financia a produção de filmes e séries nacionais. mas ele incide sobre a comercialização de filmes, de novelas e de séries exibidas em salas de cinema, TVs por assinatura e TVs abertas. O Projeto de Lei (PL) 8.889/2017, de autoria do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), quer que esta taxação seja aplicada também às plataformas de filmes online e às redes sociais, podendo chegar a até 6% da renda bruta anual.

O PL dos Streamings estava na pauta da Câmara dos Deputados na última terça-feira (14), mas foi adiado após pressão de parlamentares da oposição e de usuários de redes sociais. Eles são contra a taxação porque ela pode levar a um aumento do preço dos serviços pagos e exibição de vídeos. Também enxergam na proposta uma tentativa do governo de obter maior controle sobre os conteúdos nas redes e criar um "sistema de retroalimentação" entre financiamento e produção, que ficaria alinhado a ideologias defendidas pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

A desconfiança vem de um trecho que prevê que 10% dos recursos arrecadados sejam destinados para produtoras cujos filmes, séries e demais obras estejam alinhadas com defesa de minorias (mulheres, negros, indígenas, quilombolas, povos e comunidades tradicionais, pessoas com deficiência, e grupos em situação de vulnerabilidade social).

Além desse incentivo, outro ponto controverso é a isenção da cobrança do imposto para plataformas de concessionárias do serviço de radiodifusão de sons e imagens, ou seja, canais da TV aberta e de rádio – motivo pelo qual seus críticos estão chamando a proposta de PL da Globo.

“Eles estariam taxando Netflix, Youtube e as demais plataformas das redes sociais, mas todos os serviços de streaming vindos de concessões públicas não estariam dentro desses sistemas de imposto. Como grande parte das produções nacionais dessas grandes emissoras são financiadas direta ou indiretamente pelo Estado, é um sistema que se retroalimentaria, elas não pagariam esse imposto, mas receberiam os benefícios do governo federal para [financiar] produções nacionais”, afirmou o líder da oposição, deputado Filipe Barros (PL-PR), durante entrevista ao programa Assunto Capital, da Gazeta do Povo.

Clique aqui e veja a entrevista completa de Filipe Barros.

André Figueiredo (PDT-CE), relator da proposta, afirma que o projeto beneficia "a radiodifusão brasileira", que "paga impostos e gera milhares de empregos".

"Este projeto não é para beneficiar apenas uma emissora. Foi discutido com todas as emissoras, com as entidades representativas dessas emissoras", afirmou, completando que, se as plataformas estrangeiras quiserem que mais de 50% de suas obras sejam essencialmente brasileiras, poderão ter os mesmos benefícios da radiodifusão.

Redes sociais reagem ao PL dos Streamings

Em nota endossada pela Meta (dona do Facebook e do Instagram), a Câmara Brasileira da Economia Digital (Câmara-e.net) disse que o PL cria "assimetrias regulatórias entre os agentes de mercado" ao estabelecer um regime intenso para algumas empresas, enquanto concede "exceções explícitas" a outro segmento.

A entidade ainda avalia que a proposta ampliou de forma excessiva sua abrangência, colocando serviços de streaming, de compartilhamento de vídeos, redes sociais e outros dentro de uma mesma regulamentação. Outro ponto de destaque é a tributação de plataformas cujos conteúdos são gerados e compartilhados por seus usuários, o que pode ameaçar a gratuidade de tais serviços.

Em nota enviada à Gazeta do Povo, o YouTube afirmou que o projeto, na atual redação, apresenta falta de simetria, com cobrança para determinados grupos e isenção para outro.

Além disso, a empresa alegou que hospeda vídeos gerados por seus usuários e que a taxação de suas atividades “significa que o conteúdo gerado pelo usuário irá patrocinar a produção de conteúdo para TV e cinema, mercados fundamentalmente distintos”.

"O YouTube não é contra a regulamentação, mas precisa ser uma política pública eficiente e debatida de forma madura pelos diferentes players do mercado, inclusive com a possibilidade de realização de audiências públicas", diz a nota.

A reportagem enviou questionamentos sobre o impacto da aprovação do PL 8889/2017 para a Netlflix, Prime Video e Star +, mas até o momento não obteve resposta. Este canal segue aberto para as manifestações das empresas.

Governo arrecada mais de R$ 800 milhões com a contribuição

A Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional incide sobre praticamente todas as exibições de filmes e séries brasileiras, seja no país ou no exterior, bem como sobre a cessão de direitos de reprodução, entre outras categorias.

Em 2023 foram arrecadados R$ 818,5 milhões. Veja na tabela a seguir o montante arrecadado por ano, desde 2018, já descontada a Desvinculação de Receitas da União (DRU), segundo a Ancine.

Esses recursos são aplicados por meio de editais da Ancine com o objetivo de financiar produções de filmes e séries nacionais, por exemplo. Também são utilizados para a realização de cursos profissionalizantes, seminários, para a manutenção de acervos e para a construção e manutenção de estruturas do audiovisual, sejam salas de cinema ou aquisição de maquinário.

Isenção também é prevista para órgãos públicos e pequenas empresas

A proposta estabelece alíquotas progressivas da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional para todos os setores contemplados no Projeto de Lei, que chegam a 6% sobre a receita anual bruta das empresas, incluindo aquelas oriundas da publicidade.

O parâmetro de distinção é a receita bruta: para as empresas que têm rendimentos de até R$ 4,8 milhões, a proposta é de que não haja taxação. Já para as empresas cujas receitas brutas estejam entre R$ 4,8 e R$ 78 milhões, haverá cobrança de 1%. As que tiverem receita entre R$ 78 e R$ 300 milhões, será cobrado 3%, e acima de R$ 300 milhões, a taxa será de 6%.

Além da isenção para plataformas de emissoras de rádio e TV aberta e para pequenas empresas, há isenção para órgãos e entidades da administração pública, transmissões pela internet de eventos ao vivo e os serviços de Catch-Up TV, que é a oferta de conteúdos já veiculados em TV abertas ou fechadas como, por exemplo, a reprise de novelas por plataformas de streaming e de televisão via internet.

Plataformas que investirem em produções audiovisuais nacionais terão redução na alíquota

O Projeto de Lei também prevê a redução na alíquota da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine) para os “Provedores de Vídeo sob Demanda Plenos”, aqueles cujo catálogo é composto por, pelo menos, 50% de conteúdos brasileiros. Nesses casos, o valor da contribuição será reduzido pela metade.

Essas empresas podem chegar à isenção, desde que apliquem o valor equivalente ao que seria destinado ao imposto na produção de filmes e séries ou na contratação de seus direitos de reprodução e de licenciamento, na formação e capacitação de mão de obra para o setor audiovisual, e na implantação, operação e manutenção de infraestruturas para a produção de conteúdos audiovisuais no país.

Já os demais serviços de streaming, os provedores de televisão por aplicação de internet e as plataformas de compartilhamento de conteúdos audiovisuais podem ter redução de 50% na cobrança do imposto Condecine, caso apliquem o mesmo valor na promoção do audiovisual brasileiro. Os recursos podem ser aplicados da mesma forma que no caso dos Provedores Plenos.

Já as plataformas de compartilhamento, como o Youtube, por exemplo, podem optar por destinar esses recursos para a remuneração dos influenciadores digitais na forma de monetização dos conteúdos visualizados.

De acordo com o relator do PL dos Streamings, a intenção dessa última medida é “evitar que as plataformas repassem para os influenciadores digitais o custo pelo pagamento da Condecine, o que, do contrário, penalizaria financeiramente essa importante categoria de formadores de opinião”.

Controvérsia sobre repasses para influenciadores e possível aumento de preços

Apesar das argumentações do relator da proposta, críticos afirmam que o novo imposto pode levar à redução dos repasses para perfis monetizados ou até ao aumento no custo de assinaturas. Outra hipótese aventada é o aumento do volume de conteúdos publicitários para que as redes busquem compensar a incidência da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine).

O presidente executivo do IBPT, o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação, João Eloi Olenike, explica que a taxação proposta no Projeto de Lei atinge diretamente as plataformas e não os produtores de conteúdo e usuários.

Mas ele entende que o aumento de custos causado pela tributação possa ser repassada aos usuários por meio de um acréscimo de valor nas assinaturas, tanto no caso de plataformas de streaming, como no caso de redes que oferecem perfis premium pagos, como o X, por exemplo.

A Câmara-e.net, em seu comunicado, destacou que um trecho do PL dos Streamings exige o registro de influenciadores e produtores de conteúdo monetizados perante a Ancine. Tal iniciativa, segundo eles, poderia prejudicar a produção orgânica de conteúdos e sua dinâmica de distribuição.

Proposta estabelece cota de filmes nacionais para canais de streaming

Outro ponto trazido pela proposta é a criação de uma cota de catálogo, similar à cota de tela existente para os cinemas, que estabelece uma porcentagem mínima do tempo de exibição para produções nacionais.

No caso dos provedores de vídeo sob demanda, a cota terá início em 2% do total de horas do catálogo, com incremento anual de 2%, chegando ao patamar de 10%. Desses conteúdos, metade deve ser de produção independente, ou seja, estão descartados os filmes e séries produzidas no Brasil pelas próprias plataformas.

Além disso, o PL ainda estabelece que os conteúdos brasileiros devem estar em  “proeminência”. Para tanto, os mecanismos de catalogação, que fazem a indicação de filmes conforme o perfil do usuário, devem dar visibilidade destacada às produções nacionais.

Nos outros casos contemplados pelo projeto que não sejam as plataformas de streaming, caberá à Ancine decidir sobre as diretrizes para o destaque das obras nacionais e da cota de conteúdos brasileiros.

Ricardo Rihan, que foi secretário do audiovisual no governo Bolsonaro e é sócio fundador da Lighthouse produções cinematográficas, é contrário à medida. Ele afirma que, nesse caso, as cotas podem limitar a exibição de conteúdos nacionais, pois, atingido o número de horas de catálogo estipulado, as operadoras podem simplesmente escolher outros títulos para compor seus catálogos.

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