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No dia 1º de fevereiro, próximo sábado, os senadores escolherão o novo presidente da Casa. Se não houver surpresas, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) será eleito e irá reassumir a Presidência do Senado e do Congresso Nacional para um mandato de dois anos, após quatro sob o comando de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que é seu aliado. Antes desse período, Alcolumbre já havia sido presidente da Casa entre 2019 e 2021.
Alcolumbre reúne o apoio declarado de oito bancadas partidárias – PSD (15 senadores), MDB (11), PT (9), PL (14), PP (6), PDT (3), PSB (5) e União Brasil (7) –, somando 69 dos 81 senadores. Embora a votação seja secreta e possa haver eventuais dissidências, especialistas estimam que pelo menos 45 votos sejam totalmente garantidos, quatro além do mínimo para vencer.
Em 2021, Pacheco venceu Simone Tebet (MDB-MS) por 57 a 21, e, em 2023, ele derrotou Rogério Marinho (PL-RN) por 49 a 32, período em que a oposição quis marcar posição contra o governo Lula em seu primeiro biênio. Agora, o terreno é mais favorável ao candidato do União, dada a ampla articulação de governo e oposição em torno de Alcolumbre.
Apesar disso, o senador Eduardo Girão (Novo-CE) lançou sua candidatura à presidência do Senado em dezembro do ano passado. “Com ele, não vai mudar nada. Alcolumbre é ainda pior que Pacheco”, disse o parlamentar cearense.
Girão tem feito críticas aos “acordões” e ao fato de o Senado ser “subserviente” ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). “Nós precisamos de um Senado verdadeiramente republicano que defenda a Constituição e tenha independência para fazer o que é bom para o Brasil”, declarou.
Para o senador, o retorno de Alcolumbre na sucessão de Pacheco representa um “retrocesso” por ele não dar prioridade às “demandas legítimas da sociedade”, como os pedidos de impeachment contra os ministros do STF.
Outro nome que cogita desafiar Alcolumbre na eleição para o Senado é Marcos Pontes (PL-SP), mas o ex-presidente Jair Bolsonaro é contra e já afirmou que essa movimentação pode atrapalhar a direita. Sua principal proposta é dar andamento a pedidos de impeachment contra ministros do Supremo.
"Estive presente nas manifestações na Avenida Paulista, onde ouvi os clamores de cidadãos indignados com a inércia do atual presidente do Senado em tirar da gaveta mais de vinte pedidos de impeachment que aguardam decisão", afirmou Pontes à Gazeta do Povo.
A decisão do senador paulista foi “pessoal” e não do partido. O PL vai apoiar Alcolumbre e, em troca, espera ter espaço na Mesa Diretora do Senado e nas comissões da Casa. Pontes disse ter conversado com Alcolumbre e acertado que sua candidatura não altera o acordo de seu partido.
"Tive a palavra dele de que a minha candidatura não alterará em nada os acordos feitos entre ele e o PL. Agora, caso eu seja eleito, o partido ganhará não só o que eles almejam com o senador Davi como também um presidente do Senado e do Congresso", disse Pontes.
Na visão de Bolsonaro, Pontes deveria desistir da ideia de se candidatar à presidência do Senado e negociar apoios para que, entre outras questões, a oposição tenha força para pautar o projeto que anistia os presos do 8 de janeiro de 2023.
"Se não conseguimos ganhar com o Rogério Marinho (PL-RN) [líder da oposição no Senado], que é um baita de um articulador, não vai ser com você agora. Pega mal para todos nós, né? ‘Blá, blá, blá, o Bolsonaro, não sei o que lá’. Pelo amor de Deus, homem, é a realidade. Boa sorte a você, mas isso não é um trabalho de equipe”, afirmou o ex-presidente, em 20 de janeiro, em entrevista ao programa Jornal da AuriVerde.
"Não é para nós, é para o povo brasileiro. Eu não quero uma vaga na Mesa para ter cargo. Mas quando você não tem uma vaga na Mesa, em média 80 cargos por vaga, você está dando este espaço para outro partido, de oposição a nós. Isso fortalece o outro lado, por causa de uma ambição pessoal. É lamentável", disse ainda Bolsonaro em uma fala claramente endereçada a Pontes.
Pontes afirmou que sua postura "não se trata de benefício pessoal, mas sim de um compromisso firme com a população".
Além de Girão e Pontes, o senador Marcos do Val oficializou também sua candidatura à Presidência do Senado.
Candidaturas alternativas de aliados serviram apenas para marcar posição
Segundo Marcus Deois, diretor da consultoria política Ética, “o martelo para a eleição de Alcolumbre já está batido”, apesar de a bancada feminina ter demonstrado frustração por não conseguir viabilizar uma candidatura alternativa “não apenas para marcar posição, mas também para consolidar ainda mais a representatividade na Casa”.
Gabriel Pandini, consultor da Radar Governamental, também acredita em uma vitória tranquila de Alcolumbre. Além do apoio maciço dos partidos, o ex-presidente do Senado (entre 2019 e 2021) conta com o suporte explícito de Pacheco.
O especialista lembra que embora Eliziane Gama (PSD-MA) também tenha ensaiado candidatura - ela chegou a conversar com Lula e com Soraya Thronicke (Podemos-MS) sobre uma possível chapa feminina - o PSD e o Podemos decidiram embarcar na candidatura de Alcolumbre.
De saída, Pacheco ainda espera convite para integrar o ministério de Lula
Prestes a encerrar o período à frente da presidência do Senado, Rodrigo Pacheco pode receber um convite para integrar a Esplanada dos Ministérios. Entre as pastas em discussão estão Relações Exteriores, Defesa, Minas e Energia e Justiça. Ele conta com o aval de Lula para concorrer ao governo de Minas Gerais em 2026, mas também alimenta o desejo de ocupar uma cadeira no STF, vaga que só se abrirá em 2028, no próximo mandato presidencial.
Embora já tenha afirmado que a tendência é deixar a vida pública em 2027, quando termina seu mandato, e retomar a advocacia, Pacheco não descarta totalmente uma possível nomeação ministerial - tema que faz parte das negociações de uma prometida reforma ministerial no governo Lula para acomodar o Centrão.
Paralelamente, ele se empenha em fortalecer o PSD - seu partido e o de maior bancada na Casa, com 15 senadores - e busca espaços de comando na próxima gestão, incluindo a presidência da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a mais importante, possivelmente a cargo de Otto Alencar (PSD-BA).
Nessas negociações, chegou-se a cogitar que Carlos Fávaro (PSD-MT), atual ministro da Agricultura, deixaria a pasta para reassumir a cadeira no Senado e, assim, tornar-se vice de Alcolumbre. Contudo, o futuro presidente da Casa teria prometido o posto número dois ao PL. Ventila-se, por isso, que Eduardo Gomes (PL-TO) será o primeiro vice-presidente, Humberto Costa (PT-PE) o segundo vice, e Daniela Ribeiro (PSD-PB) a primeira-secretária.
Montagem das comissões também avança, com novos e velhos nomes
Para as comissões temáticas, especula-se que Renan Calheiros (MDB-AL) deverá presidir a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), enquanto Fabiano Contarato (PT-ES) comandaria a de Educação (CE). O PL, por sua vez, tentaria emplacar Marcos Rogério (PL-RO) na Comissão de Infraestrutura (CI), e o PT pleiteia a de Relações Exteriores (CRE).
Para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a volta de Alcolumbre pode representar uma situação de relativa tranquilidade, semelhante à que teve com Pacheco. No entanto, analistas ponderam que tudo dependerá do comportamento da economia nos primeiros meses deste ano e de como se desenrolará o impasse em torno do pagamento de emendas parlamentares, mediado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Os sinais iniciais, porém, não são animadores. Além de o ministro Flávio Dino, do STF, não indicar solução iminente para o impasse das emendas, a inflação estourou o teto da meta em 2024 e continua em alta. Além disso, as contas públicas mantêm seguidos déficits. Nesse cenário, o governo apenas especula sobre hipotéticas medidas de reforço ao pacote fiscal aprovado em 2024.
Apesar do apoio do governo, Alcolumbre pode dificultar votações para negociar
Apesar do clima de aparente calmaria, há previsão de turbulências no relacionamento entre a próxima Mesa Diretora do Senado e o governo, especialmente no que diz respeito às emendas parlamentares. Alcolumbre é conhecido por dominar a destinação de verbas do Orçamento, tendo criado dificuldades ao Executivo em momentos pontuais no passado.
Isso pode ocorrer novamente, seja pelo uso da pauta da CCJ, seja por matérias de interesse do Senado, podendo incluir temas que alcancem até o Judiciário - como o corte de supersalários.
Outro ponto de tensão envolve as indicações para as diretorias de agências reguladoras. Em particular, a Agência Nacional de Mineração (ANM) enfrenta problemas, pois o nome escolhido não agrada Alcolumbre. Já no caso da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), há uma vaga em aberto desde maio de 2024 e outra que ficará disponível em maio deste ano, mas o governo ainda não oficializou nenhuma indicação. A ausência de um quinto diretor tem levado a empates e paralisações em decisões cruciais.
Em 16 de dezembro, o governo Lula enviou 17 indicações para nove agências diferentes, retratando as dificuldades políticas em jogo. O risco de inoperância preocupa tanto o Palácio do Planalto quanto o Congresso, mas, em meio às barganhas, o tema acaba sendo usado como instrumento de pressão na disputa por espaços e influências.
Com esse panorama, a provável eleição de Davi Alcolumbre à presidência do Senado sugere alguma estabilidade inicial para o governo, mas as velhas articulações e pressões políticas prometem testar os limites da relação entre Executivo e Legislativo.