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Em meio à guerra de versões sobre a participação dos Poderes no PL da Dosimetria, aprovado pelo Parlamento, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) sinalizaram que não se opõem formalmente à proposta de redução de penas, desde que sua aplicação seja feita com análise individualizada pelos magistrados que conduzem cada processo — e não de forma automática para todos os condenados.
Para uma ala do STF, o texto ajudará no distensionamento institucional, sobretudo porque, na prática, os ministros acreditam que ficará a cargo de Alexandre de Moraes interpretar e aplicar, caso a caso, o que prevê o projeto.
O chamado PL da Dosimetria altera a forma de cálculo das penas para quem foi condenado por crimes relacionados aos ataques antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 e à tentativa de golpe de Estado.
A participação de magistrados na elaboração do texto, segundo apuração de bastidores, envolveu sugestões concretas para a redação, que partiram inclusive de Alexandre de Moraes.
Diferentemente de proposta de anistia ampla, o texto não prevê perdão ou anistia generalizada aos envolvidos e, no formato aprovado, não inclui imediatamente o ex-presidente Jair Bolsonaro como beneficiário automático dessa mudança de dosimetria — embora possa vir a impactar suas penas se e quando os critérios forem aplicados a cada caso concreto.
No STF, a avaliação dominante é que a Corte não deve tentar derrubar preventivamente o projeto simplesmente por discordar do teor das penas criminalmente impostas, mas reconhece que cabe ao Judiciário analisar cada situação individualmente.
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O PL da Dosimetria surgiu após muitas críticas a ação dos magistrados relação aos réus que participaram ou fomentaram os atos de 8 de janeiro de 2023. Apesar da exclusão de uma anistia ampla, o projeto pode influenciar significativamente as penas e o tempo de progressão de regime de réus condenados pelo STF, inclusive Bolsonaro, caso a norma seja aplicada às suas condenações no futuro. Isso porque réus que cumprem pena podem pleitear os novos parâmetros em seus procedimentos individuais.
Na Câmara, a proposta foi aprovada com 291 votos favoráveis e 148 contrários, alterando o cálculo das penas para que, por exemplo, dois crimes praticados no mesmo contexto sejam tratados de forma que prevaleça a pena mais grave, em vez da soma de todas as penas possíveis.
No Senado, o texto seguiu com algumas modificações e foi aprovado por 48 votos a 25, mantendo a lógica de alteração da dosimetria.
Apesar disso, integrantes da Primeira Turma, encarregada de julgar a os atos da suposta trama golpita deram declarações contra a atenuação das penas impostas aos condenados, entendendo ser importante defender o trabalho da Corte ao longo dos últimos anos.
Na terça-feira (16), no fim do julgamento que condenou, por unanimidade, o ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal Silvinei Vasques e outros quatro integrantes da trama golpista, Moraes criticou a redução de penas.
"Não é possível mais discursos de atenuante em penas, em penas aplicadas depois do devido processo legal, aplicadas depois da ampla possibilidade de defesa, porque isso seria um recado à sociedade de que o Brasil tolera ou tolerará novos flertes contra a democracia", disse.
Segundo o ministro, a fixação das penas serve tanto para condenar os réus quanto para prevenir que novas tentativas de ruptura democrática ocorram no futuro.
"Prevenir, deixar bem claro que não é possível mais que se tome de assalto o Estado, Ministério da Justiça, Ministério da Defesa, Gabinete de Segurança Institucional, Abin [Agência Brasileira de Inteligência], se tome de assalto a Polícia Rodoviária Federal, para tentar que um determinado grupo, que, repito, se transformou numa verdadeira organização criminosa, queira se manter no poder eternamente, com esses discursos de que a sociedade está a exigir a manutenção deles no poder", disse.
O presidente da Primeira Turma do STF, ministro Flávio Dino, colocou essa lógica de maneira clara em debates internos, afirmando que haverá pleno atendimento ao princípio da individualização da pena — isto é, cada processo deverá ser apreciado em seus próprios termos e não por uma regra uniforme e automática.
Setores do governo e movimentos sociais criticam a proposta como um ataque à punição de responsáveis por crimes contra o Estado Democrático de Direito. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva negou participação do Executivo em um acordo para o texto e anunciou que pretende vetar o projeto caso chegue ao seu gabinete, enquanto aliados já preparam ações judiciais contra a legislação.




