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Jaques Wagner
O líder do governo, senador Jaques Wagner (PT-BA), deu apoio ao texto final da PEC que limita poderes de ministros do STF e irritou petistas.| Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado.

A aprovação, nesta quarta-feira (22) pelo Senado, da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 8/2021, que limita decisões individuais de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), foi a resposta mais contundente já dada contra o ativismo judicial – ainda mais vinda da Casa Legislativa que tem missão constitucional de conter excessos do Judiciário. O Senado, então associado à proteção desses excessos, levou o tema adiante e ainda revelou um novo arranjo de forças em seu plenário.

O apoio do líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), à PEC foi o momento mais surpreendente e revelador da votação, que registrou 52 senadores favoráveis, três a mais do mínimo necessário à sua aprovação, com outros 18 contrários. O fato, classificado por membros da bancada do PT na Câmara e no Senado como "traição de Wagner", posição essa endossada, segundo relatos de bastidores, por ministros do STF, mostrou uma nova correlação de forças no colegiado de senadores, resultado de intensa negociação entre oposicionistas e parte da base do governo. Outros parlamentares sempre alinhados com o governo em votações apoiaram a PEC, como Flávio Arns (PSB-PR), Chico Rodrigues (PSB-RR) e Otto Alencar (PSD-BA).

Segundo analistas ouvidos pela Gazeta do Povo, a manifestação pública do senador, único petista a votar a favor do texto final, mostrou pragmatismo, com disposição de não deixar o Planalto dividir com o Supremo todo o peso da derrota, após tentar impedir a todo custo a votação.

Wagner também percebeu que o movimento da Casa para aprová-la era superior ao embate de situação e oposição, envolvendo questões de identidade do Parlamento e, por isso, não podia ficar restrito às tensões eclodidas no 8 de janeiro. Com isso, ele rumou na direção oposta de Humberto Costa (PT-PE) e Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), que martelavam ser “inoportuna” a medida, relembrando a postura do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) contra o STF.

Com a realidade dada, restou ao líder tentar ser um sócio do melhor aspecto dela e preservar o diálogo com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), principal fiador da PEC e fortalecido na condução de um novo polo de poder na Casa.

Por fim, os analistas avaliam que, como ex-governador, o senador pode ter compreendido a importância da fixação de contornos razoáveis à atuação dos ministros do STF, como forma de dar previsibilidade aos poderes, além da segurança jurídica.

A declaração de Wagner ocorreu no momento em que se especula a necessidade de mudanças no time de negociadores do governo no Congresso, após a série de derrotas em votações, perdendo espaço para o Centrão e os presidentes das duas Casas. Ficou patente a inação do líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues, para fechar acordos e para evitar desfechos indesejados. Segundo analistas, trocas de líderes podem ocorrer só em 2024, para não evidenciar a pressão do STF contra Wagner e ainda para buscar nomes fora do bloco de esquerda. Um dos operadores desse entendimento é o presidente do PSD, Gilberto Kassab.

Placar da votação sinaliza maior resistência contra abusos do STF

Na avaliação do cientista político Ismael Almeida, a aprovação da PEC não apenas representou marcante sinal de insubmissão do Senado ao STF, mas também resultou no fortalecimento da liderança de Rodrigo Pacheco no plenário. Para ele, o presidente da Casa consolidou a ampliação de respaldo dos colegas, que reconheceram sua influência decisiva na reação histórica contra o ativismo judicial.

“O Senado, ao impor-se com placar expressivo, estabeleceu parâmetro significativo, que pode até ser usado como referência de quórum em situações como processo de impeachment de um ministro do Supremo ou abertura de CPI para investigar possíveis abusos de autoridade no Judiciário. Esse recado é muito importante do ponto de vista político e simboliza novo patamar de relacionamento institucional”, disse.

O texto aprovado interfere na rotina do STF, restringindo a capacidade de qualquer ministro suspender a eficácia de lei ou ato normativo com efeito geral ou de atos dos presidentes da República, do Senado, da Câmara ou do Congresso.

Por acordo, os senadores decidiram tirar da proposta trecho que estabelecia prazos para os pedidos de vista, considerando que o próprio STF disciplinou internamente a questão.

A aprovação ocorreu também após outra alteração de última hora feita pelo relator Esperidião Amin (PP-SC), fruto de conversas com ministros do STF e parlamentares da base governista. A mudança permite que ministros ainda possam derrubar, individualmente, atos normativos do governo federal, como nomeações e portarias de ministérios, e ainda decretos de governadores e prefeitos. Para Jaques Wagner, essas mexidas levaram ao seu apoio, pois evidenciaram que não há interferência do Legislativo no Judiciário.

“A Justiça não será mais a mesma. O reequilíbrio dos poderes voltará ao país, garantindo mais qualidade à democracia. Espero que a Câmara vote logo a nossa proposta”, comemorou o senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), autor da PEC. “A era dos semideuses está acabando”, disse a senadora Damares Alves (Republicanos-DF). “É o respeito à democracia e ao voto popular”, comentou Jorge Seif (PL-SC).

PEC revela a consolidação de novo polo de poder no Senado

Marcus Deois, diretor da Consultoria Ética Inteligência Política, avaliou que a articulação no Senado se mostrou bem-feita, sobretudo com os acertos feitos entre os debates de terça-feira e a votação em dois turnos na quarta-feira.

“O tema é oportuno para o amadurecimento da relação entre os Poderes e da divisão de suas competências”, disse.

Ele entende que o impacto político da morte na cadeia de um réu dos atos de vandalismo do 8 de janeiro favorecerá a tramitação da PEC na Câmara, onde terá de passar por comissão especial, Comissão de Constituição e Justiça e plenário.

A intensa movimentação do Planalto e do próprio presidente do STF, Luís Roberto Barroso, para tentar bloquear o avanço da votação mostrou a luta de ministros pela manutenção de um poder individualizado, que, na visão da maioria dos senadores, desequilibra o jogo democrático. Mas, de outro lado, a resistência que levou à aprovação da PEC consolidou novo polo de poder no Senado. Esse grupo virtual, que une forças contrárias, é visto como crucial pelos líderes da oposição, por saberem não ter força necessária para se impor.

Na reeleição de Pacheco, no ano passado, a candidatura do hoje líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), ex-ministro de Jair Bolsonaro (PL), acabou por isolar ele e os seus aliados. Depois dos 32 votos que recebeu, os senadores de oposição ficaram de fora da Mesa do Senado e das direções de todas as comissões. Agora, ao se aliar a Pacheco e Alcolumbre, a bancada de direita torna-se a parcela mais coesa da nova maioria em formação, que tem 48 dos 81 senadores.

Outros projetos ainda estão sendo avaliado pelo Senado para tentar conter os excessos do STF, como o que determina tempo mais restrito para o mandato de ministros do Supremo, de oito a 15 anos.

Os atuais comandantes do Senado, o presidente Pacheco e seu provável sucessor, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), buscam ampliar o leque de apoios para se manterem no comando em 2025. O papel de Pacheco na aprovação da PEC cresceu dia após dia, tornando-se questão pessoal. Segundo analistas, uma eventual derrota da matéria neste momento final pesaria mais sobre ele do que para a oposição ou para o conjunto dos senadores. Isso porque ele bancou a proposta na condição de presidente do Congresso, enaltecendo a aprovação como a busca de reequilíbrio entre os Poderes.

A proposta ganhou impulso após a série de decisões polêmicas de magistrados do Supremo, sobretudo quando a sua então presidente Rosa Weber desengavetou um grupo de julgamentos polêmicos, envolvendo temas como drogas, aborto e propriedades privadas rurais. O avanço à autonomia do Congresso ficou perigosamente evidenciado, produzindo o ambiente favorável à emenda constitucional, que já havia sido rejeitada na legislatura passada, mas foi desengavetada.

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