A reforma política em discussão no Congresso vem causando polêmica por causa de uma proposta que impacta diretamente a Câmara dos Deputados, as Assembleias Legislativas e as Câmaras de Vereadores do país. A proposta de emenda à Constituição (PEC) 376/2009 institui o voto majoritário para vereadores, deputados estaduais e federais, o chamado voto distritão, no qual são eleitos os mais votados, independentemente do voto nos partidos.
Se aprovado, o voto distritão nivelaria o sistema ao de senadores e de cargos eletivos do Executivo. O atual sistema para vereadores, deputados estaduais e federais é o proporcional, no qual os votos para todos os candidatos dos partidos contam para o número de vagas.
O tema divide internamente alguns partidos. A maioria no Parlamento se mostra favorável ao voto distritão, enquanto os dirigentes partidários, muitos dos quais não ocupam cargo eletivo, são contrários.
A deputada Renata Abreu (SP), que é presidente nacional do Podemos e que será a relatora da reforma política na futura comissão especial, diz que a tendência, hoje, é que seu relatório sustente a migração para o voto distritão. Mas elas garante que isso não é uma vontade pessoal. “A ideia é um sistema que tenha convergência ou que se crie algum tipo de acordo para que passe. Não adianta ser o que eu quero, mas o que é possível avançar. Hoje, existe na Casa um sentimento forte pelo distritão”, explica.
O texto da PEC 376/2009 deve ser votado em breve na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O relator neste colegiado é o deputado Felipe Francischini (PSL-PR). Uma vez aprovada a admissibilidade constitucional, o mérito da PEC será discutido na comissão especial a ser instalada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
Transição do distritão para o distrital misto é uma possibilidade
Apesar de ter uma maioria em torno do voto distritão, o sistema não é consensual no Parlamento. A leitura feita por alguns é de que cria distorções na votação, uma vez que partidos tradicionalmente bem votados podem acabar emplacando poucos membros e outros menos votados eleger mais. Afinal, como elege quem tem mais votos, amplia o personalismo das campanhas, uma característica do Executivo, não do Legislativo.
Por esse motivo, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, sugeriu a lideranças do Congresso em reunião nesta semana a análise do voto distrital misto. Renata Abreu não participou da reunião, mas afirma que uma progressão do voto distritão para o distrital misto pode ser apresentado por ela em seu relatório da PEC 376.
“Pode haver composição para servir como uma transição para o distrital misto. É algo em discussão e que pode caminhar para essa transição caso consigamos mais adesões e um acordo”, afirma a presidente do Podemos.
O voto distrital misto é uma mistura entre o majoritário e o atual sistema proporcional. Nesse modelo, em uma “ponta”, os partidos apresentariam um candidato por região, chamado de distritos, que seria eleito pela maioria de votos. Na outra, seriam apresentados candidatos no atual sistema proporcional.
Federação partidária é alternativa
O debate de uma reforma política não é recente. Como mostrou recentemente a Gazeta do Povo, foi um pleito demandado sobretudo por partidos menores a Arthur Lira e o presidente nacional do MDB, Baleia Rossi (SP), na campanha para as eleições da Mesa Diretora da Câmara. O argumento é de que, sem mudanças no sistema eleitoral, muitos partidos deixarão de existir.
Inicialmente, os partidos pleiteavam pela volta das coligações no sistema proporcional, mas Barroso avisou às lideranças do Congresso que o TSE é absolutamente contrário à volta da coligação aos cargos de vereadores, deputados estaduais e federais. Líderes passaram, então, a discorrer sobre alternativas.
Uma opção defendida por algumas legendas é a federação partidária. A proposta exigiria a união de partidos não somente durante a campanha, mas, também, durante toda a legislatura. Ou seja, uma coligação montada na campanha eleitoral teria de ser mantida na atuação parlamentar durante a legislatura.
Na prática, o grupo de partidos funcionaria como uma só legenda. Além disso, as federações somente seriam permitidas para partidos de mesma orientação ideológica e programática. Dessa forma, por exemplo, o PCdoB poderia se coligar com o PT, mas não com o DEM ou o PSDB.
Voto distritão divide os deputados
A deputada Alice Portugal (PCdoB-BA) defende a federação partidária como alternativa ao voto distritão. Para ela, o distritão destruiria a representatividade partidária uma vez que valeria a identidade individual, o personalismo do candidato e seu cabedal financeiro. “Seria a volta ao vale tudo, do mais forte ao mais fraco, não importando a proporcionalidade ou que eu represente 10% das minhas ideias. O distritão mata os partidos e faz as minorias sucumbirem”, sustenta.
A parlamentar diz que vai debater o assunto na Câmara e procurar a deputada Renata Abreu para conversar, mas reconhece, entretanto, que alguma mudança é necessária. “A verdade é que a pior forma é a que se encontra hoje”, diz Alice, em referência ao sistema proporcional com a cláusula de barreira. “Somos contra. Que seja, no mínimo, congelada onde está”, diz.
A discussão de uma reforma eleitoral é defendida por partidos da esquerda, de centro e da direita, sobretudo os menores. O fim das coligações gerou uma hiperconcentração nos grandes partidos e o encarecimento das campanhas. “As últimas eleições municipais mostraram que prefeitos precisaram ajudar a montar chapas vicinais [entre municípios] para se eleger”, diz Alice Portugal.
A deputada do PCdoB sustenta que nem todas as legendas são pequenas por serem artificiais e não representativas. O discurso é defendido por outros partidos que defendem mudanças no sistema eleitoral, que defendem a pluralidade partidária.
Para o deputado José Nelto (Podemos-GO), que se mostra favorável ao voto distritão, a não aprovação da reforma eleitoral pode reduzir a democracia brasileira a dois partidos. “É a alternativa de agora. Aí, vamos ter tempo para ver o novo modelo, porque não tem outra saída. Era melhor até aumentar a cláusula de barreira e eliminar partidos do que acabar com a coligação proporcional”, critica.
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