Missão de longuíssimo prazo que vem sendo realizada por diversas gestões à frente do Estado de São Paulo desde a década de 1990, a despoluição do rio Tietê foi abraçada pelo governo Tarcísio de Freitas em um programa que custará R$ 5,6 bilhões até 2026. O programa é uma integração de iniciativas que já vem sendo realizadas e o principal diferencial em relação às gestões anteriores é a implementação de Parcerias Público Privadas (PPPs).
"A gente não quer inventar a roda, mas temos que olhar as ações que já foram desenvolvidas e ver como conseguimos dar escala a elas, aprimorando também o projeto Tietê e trazendo outras inovações como as PPPs. A despoluição é um desafio e a gente sabe que não é em quatro anos que vamos fazer, mas tem que ser uma política de Estado", diz à Gazeta do Povo Natália Resende, secretária de Infraestrutura e Meio Ambiente do Estado de São Paulo. Batizado de IntegraTietê, o programa do governo Tarcísio foi dividido em cinco pilares: Controle de Cheias; Turismo, Lazer e Integração; Eficiência Logística; Governança; e Saúde e Qualidade de Vida.
Esse último, que visa expandir a rede de saneamento e a gestão de resíduos, tem investimentos estimados em 3,9 bilhões de reais e ataca o principal causador da poluição do rio na região metropolitana de São Paulo, no trecho chamado de alto Tietê: os esgotos que são jogados sem tratamento nas águas, principalmente advindos de ocupações irregulares. Este pilar terá fundamentalmente a participação da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) e um modelo de contratação por desempenho com foco em gestão por resultados. "A Sabesp obviamente vai fazer o diagnóstico e usar diversas tecnologia. Entram os contratos de desempenho, mas também outras tecnologias que ela vai identificar ao longo desse processo", diz Natália.
De acordo com a Sabesp, os investimentos estão divididos em R$ 1,3 bilhão no quadriênio 2023/2026, em obras de ampliação da capacidade de tratamento de esgoto nas Estação de Tratamento de Esgoto (ETEs) ABC, Barueri, Parque Novo Mundo e São Miguel, e em R$ 2,6 bilhões em obras de expansão da infraestrutura de coleta e transporte do esgoto gerado na região metropolitana de São Paulo. Estima-se que são 1,5 milhão de ligações de esgoto a serem tratados, além de Estações de Tratamento de Esgoto que precisam ter sua capacidade ampliada.
"A exemplo do Programa Novo Rio Pinheiros, a Sabesp buscará inovações tanto na gestão dos contratos (contratos performance com gestão por resultados) e nas soluções tecnológicas (soluções não convencionais para vencer os obstáculos e desafios decorrentes das diversas áreas de ocupações irregulares existentes para a efetiva implantação das redes coletoras de esgoto e dos coletores-tronco e interceptores para envio do esgoto para as estações de tratamento)", disse a estatal em nota.
Parceria Público Privada para Controle de Cheias do Rio Tietê
A ideia de implementar PPPs será para a área específica de Controle de Cheias, que é feita atualmente pelo Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) por meio de desassoreamento em 41 quilômetros do Tietê, a um valor anual de R$ 320 milhões. O objetivo é ampliar esses serviços em mais 24 quilômetros do rio nos próximos seis meses e a partir de 2025 passar essas obras para a iniciativa privada por meio de uma concessão que visa contemplar 205 quilômetros do rio Tietê.
"A concessão que estamos estudando provavelmente será a administrativa, ou seja, o estado entra praticamente com toda a contraprestação em um contrato no qual é possível colocar mais investimentos a longo prazo. Ele dá mais eficiência e previsibilidade para o investidor também. Já qualificamos o nosso programa de parcerias, estamos em fase de estudos e a previsão é que isso fique pronto e comece em 2025", diz Natália.
Educação ambiental para combater a poluição difusa
Outra questão que contribui com a poluição do Rio Tietê é o lixo jogado pela população nas ruas e que, com as chuvas, acaba sendo escoado pelas águas e indo parar no rio. Chamados de poluição difusa, esses detritos podem ser evitados por meio de um trabalho de conscientização da população sobre a importância se jogar lixo apenas em locais adequados. De acordo com a secretária Natália, essas ações de educação ambiental estão contempladas na aplicação de recursos que virão de um empréstimo no valor de R$ 500 milhões feito pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Além disso, ela afirmou que "está verificando, principalmente no estudo da PPP (onde seria possível colocar mais investimentos por causa da amortização a longo prazo), a parte de conscientização da população."
Origens da despoluição do Rio Tietê
Em 1992, a SOS Mata Atlântica, juntamente com a Rádio Eldorado, lançou uma campanha que desencadeou um abaixo-assinado com mais de 1 milhão de assinaturas pela despoluição do Tietê. Na época, o então governador de São Paulo, Luiz Antonio Fleury Filho, solicitou à Sabesp estudos para a despoluição do rio, dando início ao Projeto Tietê. Desde então, as iniciativas vêm sendo aperfeiçoadas por diferentes governos.
Gustavo Veronesi, coordenador do programa Observando os Rios, da Fundação SOS Mata Atlântica, aprova a iniciativa do atual governo de São Paulo em ampliar as frentes de atuação de despoluição do rio Tietê. "O cuidado e o processo de despoluição do Tietê vem acontecendo ao longo dos anos em sucessivos governos e é muito bom que o novo governo também tenha atenção especial para o nosso principal rio. O IntegraTietê é uma continuidade do projeto de despoluição do Tietê, uma conquista da sociedade no começo da década de 1990, e colocando alguns elementos a mais pensando o rio como um todo. Isso é bastante positivo", diz ele.
Entre os pontos que precisariam ser aperfeiçoados no IntegraTietê, no entanto, Veronesi chama a atenção para a necessidade de se "evitar os processos erosivos, isso é, conter a erosão que vai levar o sedimentos até o fundo do rio, ocasionando o processo de assoreamento". Para isso, seria importante proteger "a margem de rios não só do Tietê, mas os seus afluentes, e também as nascentes desses rios".
Semelhanças com o programa Novo Rio Pinheiros
Luiz Pladevall, engenheiro e presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES-SP), chama a atenção para as semelhanças que o programa IntegraTietê possui com o programa Novo Rio Pinheiros, lançado em 2019 pela gestão Dória e cujos resultados são considerados exitosos. Um dos pontos fundamentais do Novo Rio Pinheiros foi justamente o tratamento de esgoto, tendo alcançado 650,1 mil unidades de imóveis conectados à rede de esgoto e 100,2 mil toneladas de lixo removido, de acordo com dados do dia 14 de março. "O programa do rio Pinheiros foi um sucesso, portanto o governo está certo em querer extrapolar para o rio Tietê o que foi feito", diz Pladevall.
Entre as ações de destaque, estão a coleta e o encaminhamento de parte do esgoto para ETEs, além de construção de cinco Unidades de Recuperação (URs) onde não foi possível instalar ETEs devido à ocupação de imóveis. "A recuperação do rio Pinheiros já é perceptível para quem atravessa o rio a pé, antes parecia que se estava passando por cima de um lixão porque o odor era terrível. Hoje melhorou e muito", diz Pladevall.
Apesar dos desafios, a despoluição do rio Tietê já alcançou números significativos nas últimas décadas. De acordo com a Sabesp, em 1992 o índice de cobertura com rede de coleta de esgoto na região metropolitana de São Paulo era de 70% e hoje já passa de 90%. Além disso, o tratamento do esgoto coletado saltou de 24% para 85%. Já a mancha de poluição do Tietê, que no início dos anos 1990 alcançava mais de 530 km da extensão do rio, atualmente se estende por 122 km, de acordo com dados da SOS Mata Atlântica.
Esses resultados mostram que a despoluição do rio mais importante do Estado de São Paulo, que até a década de 1950 abrigou competições à nado e atividades de pesca, é possível e pode ser acelerada com boas iniciativas que envolvem o governo, a iniciativa privada e a sociedade civil organizada.
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