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Relação de Lula com governadores
Após liberação do TCU, licitação do túnel Santos-Guarujá deve ser feita pelo estado de SP ou pelo governo federal.| Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República

A postura do governo federal de cobrar publicamente governadores de partidos da oposição após a liberação de recursos sinaliza que o maior projeto do novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) deve voltar a ser alvo de disputa entre o governo Lula (PT) e a gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos). O túnel imerso entre Santos-Guarujá foi anunciado conjuntamente pelos dois mandatários, em fevereiro do ano passado, e o projeto aguarda a liberação do Tribunal de Contas da União (TCU) para a fase de licitação.

A nova etapa colocará o edital de concessão da obra, orçada em R$ 5,8 bilhões, sob a responsabilidade da União ou do estado de São Paulo. No final de janeiro, a inauguração da estação Varginha, parte da expansão da linha 9 – esmeralda, do sistema de trens metropolitanos da capital paulista, gerou mal-estar nos bastidores políticos durante o discurso do ministro das Cidades, Jader Barbalho Filho.

O governo federal destacou o investimento de R$ 600 milhões em todo o projeto, por meio do PAC, sendo que, conforme o ministro, R$ 107 milhões teriam sido provenientes do governo Lula apenas para a finalização do trecho de extensão. Os cálculos do estado de São Paulo divergem da conta do governo federal, sendo que a maior parte das verbas para a obra - que estava prevista no PAC desde 2014 - foram destinadas pelos ex-presidentes Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PL).

A gestão petista seria responsável pelo repasse de 3% do total. Mesmo assim, Jader Filho repetiu o tom do discurso de ministros de Lula com alfinetadas a governadores da oposição. “O Brasil está cada dia mais dividido, mas a gente mostra aqui que parceria é que traz avanços não só para o estado de São Paulo, mas para todo o país”, declarou. O evento contou com a presença do governador paulista e do prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), ambos aliados de Bolsonaro.

O início do projeto do túnel imerso entre Santos-Guarujá foi marcado por desentendimento entre os governos federal e estadual. Após um encontro entre Lula e Tarcísio, chegou-se a um consenso sobre o projeto e modelo de concessão, por meio de uma parceria público-privada (PPP). A obra contará com recursos da União e também do governo do estado de São Paulo.

Em dezembro, o Ministério de Portos e Aeroportos encaminhou o projeto para análise do TCU, que deve ser concluída até abril, de acordo com o cronograma da pasta. O mês de maio deve ser reservado para as adaptações, seguindo os apontamentos feitos pelo tribunal. A previsão é que o edital seja lançado em junho, com leilão na Bolsa de Valores de São Paulo, a B3, no mês de agosto.

O projeto também faz parte da carteira da Secretaria de Parcerias em Investimentos do governo paulista e ainda não existe um detalhamento sobre qual esfera, federal ou estadual, deve concentrar o processo licitatório. No meio político, a responsabilidade sobre a maior obra do PAC é vista como uma forma de capitalizar votos para 2026. Lula pode disputar a reeleição e Tarcísio é um dos principais nomes cotados para a disputa presidencial, se Bolsonaro ficar de fora da corrida pelo Palácio do Planalto. No entanto, a estratégia que ele vem construindo até aqui indica que deve opção pela reeleição ao governo paulista.

Procurada pela Gazeta do Povo, a Secretaria de Parcerias em Investimentos não confirmou a formação de uma comissão mista para definição sobre o processo de concessão, mas informou que o governo estadual “trabalha em conjunto com o governo federal para que o edital do túnel imerso Santos-Guarujá seja lançado o mais breve possível”.

A pasta detalhou que o grupo de trabalho envolve, além do governo do estado, pela Secretaria de Parcerias em Investimentos, o governo federal, por meio do Ministério de Portos e Aeroportos (Mpor), Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), Autoridade Portuária de Santos (APS) e a Agência de Transportes do Estado de SP (Artesp), que "segue trabalhando para que esse projeto centenário possa se concretizar e trazer grandes investimentos em mobilidade e geração de empregos para a Baixada Santista”.

Aliado de Lula, presidente do BNDES cobra gratidão e reciprocidade de governadores

No final de janeiro, o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Aloizio Mercadante, anunciou R$ 6,4 bilhões de financiamento para a concessionária EPR, administradora do lote 2 de rodovias do Paraná. A ausência do governador paranaense, Ratinho Junior (PSD), causou desconforto no petista, que manteve o discurso no sentido de "dar com uma mão e cobrar apoio com a outra". Os investimentos para as rodovias do estado também fazem parte do novo PAC.

Aliado de Bolsonaro, Ratinho Junior também é cotado como pré-candidato à Presidência da República como um dos nomes para representar a direita em 2026. “É difícil para alguns governadores prisioneiros da polarização que não reconhecem, mas o presidente Lula segue republicano e trabalhando sempre em parceria”, declarou Mercadante.

O presidente do BNDES lembrou de investimentos feitos em duas estações do metrô em Brasília, projeto orçado em R$ 400 milhões, e cobrou gratidão e reciprocidade dos governadores da oposição. O Distrito Federal é governado por Ibaneis Rocha (MDB).

“Não vi uma palavra do governador dizendo assim: 'obrigado BNDES, obrigado governo Lula pela parceria que estamos fazendo'. O governo anterior não financiou um metro de metrô no Distrito Federal. Essa reciprocidade ajuda a construir uma relação civilizada", cobrou Mercadante.

Governantes vão treinar habilidade para manter relações em ano pré-eleitoral

Para o cientista político e professor do Insper Leandro Consentino, o presidente da República e os governadores precisam ter habilidade e diálogo político nas relações institucionais, principalmente em um ano pré-eleitoral, com intuito de manter os projetos de infraestrutura e viabilizar as obras aguardadas pela população. “A tendência é de dificuldade de esforços conjuntos e acusação mútua de lado a lado, caso as obras atrasem ou não sejam viabilizadas da maneira que se esperava. Lamentavelmente, o Brasil se submete a esse tipo de rixa política menor, em detrimento de melhorias importantes”, avalia.

Segundo ele, a indefinição no cenário político para a corrida eleitoral de 2026 também torna a relação mais sensível, pois atuais governadores podem enfrentar Lula na disputa pela reeleição no ano que vem. “Existe a disposição de certos governadores em alçar voos mais altos. Esse relacionamento [institucional com a Presidência] fica mais complicado e acaba levando à briga pela paternidade das obras e dos recursos. O problema é que esse cenário pode envenenar as relações e torna mais complicada a viabilização das obras”, analisa.

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