A juíza de Direito Vanessa de Oliveira Cavalieri, da vara da Infância e Juventude do Rio de Janeiro, condenou duas adolescentes a apresentaram um trabalho escrito e oral sobre o livro “Pequeno Manual Antirracista” por causa de um vídeo divulgado pelas duas com ofensas dirigidas a uma colega de escola.
O trabalho deve ser apresentado à magistrada em audiência especial marcada para 3 de dezembro. Além da apresentação, as duas adolescentes prestarão serviços comunitários por seis meses, com jornada de 4 horas semanais.
Na época dos fatos, a vítima e as acusadas tinham apenas 12 anos. As adolescentes passaram a responder por ato infracional equiparado aos crimes de injúria racial, com elementos de "gordofobia, homofobia e classicismo".
“É de se lamentar que, cada vez mais, adolescentes e até mesmo crianças estejam se envolvendo em atos dessa natureza, como injúrias de diversas naturezas, cyberbullying e até compartilhamento de imagens explícitas, como tem sido percebido pelo volume de novos casos de crime digitais que têm chegado a esta VIJ (Vara da Infância e da Juventude)”, escreveu a juíza em um trecho da decisão.
De acordo com comunicado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), publicado nesta quinta-feira (19), “a decisão ressalta ainda que a vítima, em seu depoimento em juízo, além de narrar todo o episódio em detalhes, também contou sobre o sofrimento que as ofensas lhe causaram e ainda causam”.
“O fato também foi corroborado pela mãe da vítima, que inclusive trouxe uma redação escrita pela filha quase dois anos após o ocorrido, em que se evidencia a permanência do sentimento de humilhação e de impunidade decorrente do episódio de racismo”, disse o Tribunal.
Uma terceira adolescente envolvida no caso ficou de fora do processo
Uma terceira adolescentes envolvida na divulgação das ofensas obteve remissão da medida socioeducativa. Mesmo excluída do processo, a adolescente ainda terá de apresentar o trabalho sobre o livro.
Segundo a decisão, “diferentemente das outras representadas, em seu interrogatório, e até antes, na oitiva informal, a menina demonstrou estar sinceramente arrependida, compreender que o comportamento praticado é inadmissível, e ter amadurecido desde o episódio”.
Para a juíza, o comportamento das meninas está ligado “ao acesso cada vez mais precoce e mais frequente às telas de celulares, computadores e tablets, através das quais crianças e adolescentes passam a usar redes sociais, jogos online e apps de comunicação, com extrema frequência e sem a necessária supervisão de um adulto".
Manual antirracista
A obra escolhida pela juíza como fonte de pesquisa para as adolescentes trata-se do livro “Pequeno Manual Antirracista”, da ativista Djamira Ribeiro.
Conforme análise publicada pela Gazeta do Povo, em 2020, o livro emite uma série de “ordens” para os leitores.
“O manual de Djamila não deveria se chamar ‘manual’, mas sim ordens. Pois, excetuada a Introdução, as seções do livro são somente ordens: ‘Informe-se sobre o racismo’, ‘Enxergue a negritude’, ‘Reconheça os privilégios da branquitude’, ‘Perceba o racismo internalizado em você’, ‘Apoie políticas educacionais afirmativas’, ‘Transforme seu ambiente de trabalho’, ‘Leia autores negros’, ‘Questione a cultura que você consome’, ‘Conheça seus desejos e afetos’, ‘Combata a violência racial’ e ‘Sejamos todos antirracistas’”, diz um trecho da análise feita pela escritora Bruna Fascolla.
Ainda, segundo Fascolla, a autora usa experiências pessoais como fontes de autoridade, sem nunca explicar quem seria o agente responsável pelas “maldades”.
Além disso, Fascolla disse ter identificado na autora do manual “uma incapacidade de enxergar complexidade nos fenômenos históricos, preferindo antes rotulá-los como brancos ou negros”.
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