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Perfis pró-Lula atingem milhões com fake news sobre economia no atual governo
Canais de membros do grupo “Influenciadores pela Democracia”, que se reuniram com Lula em fevereiro, têm apostado em fake news para beneficiar o atual governo| Foto: Ricardo Stuckert/PR

Resumo desta reportagem:

  • Quatro perfis de fofoca que, juntos, somam aproximadamente 50 milhões de seguidores nas redes sociais divulgaram fake news sobre redução da desigualdade social no governo Lula.
  • As contas (Choquei, Alfinetei, PopTime e UpdateCharts) omitiram que os dados do IBGE que apontaram melhora econômica no país se tratavam de 2022, quando Lula ainda não tinha assumido o governo.
  • A Gazeta do Povo encontrou mais notícias falsas, além de publicações com forte teor partidário nos quatro perfis.
  • Todas as contas mantêm ou mantinham até pouco tempo contrato com agência comandada por partidários do atual presidente.
  • O governo tem apostado em estreitar relações com influenciadores para melhorar popularidade e avançar em pautas de interesse.

Em 11 de maio, quatro perfis nas redes sociais que, juntos, somam mais de 50 milhões de seguidores, divulgaram fake news sobre a redução da desigualdade social no país com o objetivo de aumentar a popularidade do presidente Lula (PT).

Em comum entre as contas (Choquei, Alfinetei, PopTime e UpdateCharts), todas mantêm tom pró-governo e contrário a adversários políticos de Lula em meio a dezenas de postagens diárias sobre fofoca e entretenimento. Em várias das publicações com teor partidário, até mesmo as fotos e textos usados se repetem entre os perfis.

“HISTÓRICO: Pela 1ª vez em 10 anos, a desigualdade no Brasil CAIU para o MENOR NÍVEL, com as mudanças aplicadas pelo governo Lula”, diz publicação do PopTime. De forma semelhante, o perfil do Choquei postou: “AGORA: Pela primeira vez em uma década, a desigualdade no Brasil caiu para o menor nível, com o auxílio de R$600 do governo Lula e a melhora do mercado de trabalho”.

Os outros perfis repetiram o modelo, colocando em evidência a foto oficial de Lula que constou na urna eletrônica nas eleições do ano passado ao lado de imagens de famílias pobres ou da bandeira do Brasil. O Choquei chegou até mesmo a divulgar o link de uma matéria jornalística que seria sua fonte para a postagem.

A redução da desigualdade nos últimos anos é verdadeira e foi divulgada pelo IBGE na semana passada. Os dados, entretanto, tem a ver com o ano de 2022, ou seja, antes de o governo Lula iniciar. Os perfis omitiram o ano em todas as postagens, criando uma narrativa falsa de que o atual governo teria méritos em uma redução tão significativa da desigualdade econômica.

Mesmo com denúncias de milhares de usuários às plataformas apontando a inveracidade do conteúdo, as postagens foram mantidas por várias horas até serem apagadas pelos próprios administradores das páginas. O perfil do Choquei chegou a receber uma checagem da comunidade de usuários do Twitter – recurso denominado “Notas da Comunidade”.

A correção de informações se dá quando um grande número de usuários da plataforma aponta que determinado conteúdo de uma postagem é falso ou traz informações enganosas. Desde então, abaixo da publicação da Choquei passou a ser exibida a seguinte nota:

“Segundo o IBGE, o menor nível de desigualdade desde o início da série histórica ocorreu em 2022. Na época, Lula não era o presidente. Especialistas apontam que a causa para a queda na desigualdade foi a criação do Auxílio Brasil [programa de renda instituído durante o governo de Jair Bolsonaro]. Esse benefício não foi criado pelo governo Lula”.

Uma das fontes mencionadas pelos usuários para corrigir a desinformação foi justamente a matéria mencionada pelo Choquei como sendo a fonte da fake news divulgada. A reportagem trazia dados corretos, que foram manipulados pelo perfil de fofoca.

Fake news do perfil Choquei foi corrigido pela comunidade do Twitter. Medida ocorre quando um grande número de usuários aponta conteúdo desinformativo.
Fake news do perfil Choquei foi corrigido pela comunidade do Twitter. Medida ocorre quando um grande número de usuários aponta conteúdo desinformativo.

Perfis gerenciados e agenciados por apoiadores de Lula apostam em desinformação e tom partidário para aumentar popularidade do governo

Outro ponto em comum entre as contas disseminadoras de fake news é que três das quatro são agenciadas pela Mynd8, empresa que tem a cantora Preta Gil, apoiadora de Lula, como sócia-proprietária. O Choquei é o único perfil que não consta no rol de contas da agência, mas fez parte do grupo até dezembro de 2021.

Já a Banca Digital, núcleo da agência focado em perfis de entretenimento (como Alfinetei, Fofoquei, Tricotei e Gina Indelicada) é comandado por Murilo Henare, outro apoiador do petista, que no ano passado se encontrou pessoalmente com Lula e Rosângela Silva, a Janja, para cumprimentá-los pela eleição. Na campanha eleitoral, contas nas redes sociais que compõem o Banca Digital deram início a uma aberta linha pró-Lula em suas publicações, o que foi mantido após o início do governo petista.

O Alfinetei, por exemplo, publicou na segunda-feira (15) um vídeo em que um motorista aparece comemorando o preço da gasolina e vinculando a Lula a suposta queda de preços. A descrição: “Caminhoneiro comemora o preço baixo da gasolina, pede para frentista esborrar o tanque e agradece a Lula”. Em números reais, entretanto, o preço da gasolina comum acumula alta de 12,2% no Brasil entre janeiro e abril deste ano na comparação com mesmo período do ano passado, segundo dados da edição de maio do Panorama Veloe de Indicadores de Mobilidade Urbana, realizado em parceria com a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). O governo anunciou, recentemente, redução no preço dos combustíveis. Os novos valores, no entanto, passaram a valer no dia 17 de maio, dois dias após a publicação do Alfinetei.

Já o PopTime foi um dos primeiros a veicular a fake news de que Bolsonaro seria satanista durante o período eleitoral do ano passado. Recentemente, o perfil foi acusado de homofobia por referir-se ao maquiador Agustin Fernandez, amigo pessoal da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, como “pet gay”. O perfil, que é conduzido por pessoas homossexuais, chegou a publicar uma nota de retratação dando a entender que a ofensa se deu apenas pelo fato de o maquiador ter visão política divergente do grupo.

O Choquei, por sua vez, postou neste domingo (14) um vídeo em que um jovem aborda o senador Sergio Moro (União-PR) com ofensas. A publicação traz a seguinte legenda: “Jovem aborda o ex-juiz parcial Sergio Moro e pergunta como é ser um juiz ladrão e recebe tapinha do senador”.

Nesta sexta-feira (19), Lula retuitou uma postagem do perfil que tratava de uma suposta queda nos preços dos combustíveis, sem falar lugar, data ou apontar a fonte da informação. Até a publicação desta matéria, também não havia sido publicada nenhuma pesquisa atualizada de preços da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis.

Dono do principal perfil de entretenimento recebia informações privilegiadas de Janja durante campanha eleitoral

O Choquei, perfil de entretenimento que conta com o maior número de seguidores nas redes sociais atualmente (quase 27 milhões somando Twitter, Instagram e Tiktok), pertence a Raphael Sousa, influenciador que é próximo à primeira-dama Rosângela Silva, a Janja. Após o resultado das eleições no ano passado, ele recebeu convite dela para subir no carro de som oficial da equipe de Lula e acompanhar o discurso da vitória do petista. A esposa do presidente, que desde o período eleitoral costuma manter um trabalho de aproximação com influenciadores para viabilizar apoio ao governo, chegou a enviar conteúdos exclusivos para o perfil durante a disputa eleitoral.

Com a divulgação, nas redes sociais, de notícias com um claro viés editorial pró-Lula, o dono da Choquei contribuiu muito para a campanha petista. No período eleitoral, a conta sempre esteve entre aquelas com maior repercussão em temas eleitorais.

Em entrevista ao Flow Podcast no ano passado, Sousa reconheceu que a atuação do perfil ajudou a eleger o atual presidente e afirmou que todos os colaboradores do Choquei eram pró-Lula, mas que o trabalho de apoio ao petista tinha a ver com o fato de o influenciador ser contrário a Bolsonaro. Apesar disso, o proprietário do perfil se aproximou mais do presidente após o início do novo mandato e mantém na internet a cruzada de defesa do governo a qualquer custo.

Janja promete estreitamento com influenciadores pró-Lula, que aceleram a produção de fake news

Sob a organização da primeira-dama, no início de fevereiro houve um encontro no Palácio do Planalto entre Lula e influenciadores digitais que fizeram campanha para o petista em seus canais nas eleições de 2022. Na reunião, o presidente disse que a propaganda política dos perfis foi determinante para sua eleição. “Não ganharíamos as eleições se não fosse também o trabalho voluntário de influenciadores nas redes. E vocês têm um trabalho muito grande para seguirmos combatendo a fábrica de mentiras”, disse.

O evento atraiu críticas de outros influenciadores da esquerda, que reclamaram que fizeram campanha aberta para Lula, especialmente no segundo turno das eleições, e mesmo assim ficaram de fora do evento. Ao responder às críticas, a primeira-dama sugeriu que a aproximação do governo com influenciadores seria permanente durante o mandato. “É a primeira de muitas”, disse.

Como mostrou reportagem da Folha de S. Paulo publicada no último dia 10, parte do grupo que se encontrou com Lula tem se dedicado à disseminação de notícias falsas especialmente em momentos de maior desgaste do atual governo para desviar o foco das críticas. Segundo a matéria, os alvos majoritários das fake news são familiares do ex-presidente Jair Bolsonaro, com destaque para Michelle Bolsonaro.

Ao jornal, um dos influenciadores que recentemente disseminou fake news pró-governo reconheceu que informações veiculadas por ele eram falsas, mas alegou que não se tratava de desinformação, mas de “uma brincadeira, uma sátira”. Detalhe: o tema central do evento com influenciadores organizado por Janja foi justamente o “combate às fake news”.

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