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O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), acredita que a análise da constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que responsabiliza as redes sociais por conteúdos dos usuários, será o tema mais importante do ano Judiciário, que recomeça na próxima segunda (3).
De acordo com ele, há a expectativa de que o ministro André Mendonça devolva o processo em breve após ter pedido vista – ou seja, mais prazo para análise da ação. Isso, diz Mendes, pode “estimular” o Congresso a dar início a algum projeto de regulação assim como ocorreu em outros países.
“Espero que, no primeiro semestre, tenhamos uma definição que possa, até mesmo, estimular o Congresso a se debruçar sobre a temática, e ter uma regulação mais detalhada de um tema tão difícil. Sabemos que alguns países têm regulado e isso tem gerado conflitos”, disse o magistrado em entrevista ao Correio Braziliense publicada neste final de semana.
O ministro se referiu a regulações que já estão sendo tocadas na Alemanha, União Europeia, Reino Unido e Austrália. Ele próprio ainda não votou sobre o processo em andamento no STF, mas afirmou que dará o encaminhamento após Mendonça liberar a ação.
Mendonça pediu vista do processo em dezembro e precisa devolvê-lo ao plenário em 90 dias, o que pode ocorrer em meados de março a abril.
“Temos que buscar a regulação. Não é fácil. É desafiadora a questão dos crimes graves, que não dependem de uma decisão judicial; ou quando a empresa cobra publicidade ou cobra pelo incremento da divulgação”, pontuou o ministro.
Ainda de acordo com ele, também é preciso se pensar na criação de uma agência reguladora para gerir a legislação voltada às redes sociais. No entanto, ele reconhece que isso pode levantar dúvidas sobre isenção e a transparência, da “possibilidade de se tornar um suprapoder e ser capturada pelas empresas”.
“Ou passar a ser tão intervencionista que acabará afetando a liberdade de expressão”, pontuou.
Por outro lado, ele negou que o STF esteja extrapolando a separação dos Três Poderes e legislando sobre algo que seria prerrogativa do Congresso Nacional. Para Gilmar Mendes, a Corte tem a atribuição de atuar nas chamadas “omissões inconstitucionais”, e que não há nenhum abuso nisso.
“Quando há omissão inconstitucional por parte do Executivo ou do Legislativo, o Supremo pode atuar — e não está abusando. Então, é fundamental que a gente tenha isso presente”, completou.
André Mendonça pediu vista após o voto de Luís Roberto Barroso, que divergiu de Dias Toffoli e Luiz Fux, no julgamento. Relatores de duas ações sobre o tema, eles propuseram que, em caso de postagens ofensivas, que caracterizem crimes contra a honra (calúnia, injúria e difamação), bastaria a notificação direta da pessoa ofendida à plataforma para que esta passasse a responder pela ofensa.
Barroso propôs que para crimes em geral, sobretudo mais graves, a plataforma seja responsabilizada a partir de notificação direta ou se houver falha sistêmica em adotar um “dever de cuidado”, nome que se dá na legislação europeia a ações ativas de diligência sobre o conteúdo que trafega nas plataformas, no sentido de coibir a disseminação descontrolada de postagens relacionadas a pedofilia, terrorismo, crimes que afetem a coletividade e grupos vulneráveis.