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O Programa Nacional das Salas Lilás, lançado pelo governo Lula em 25 de março e destinado ao acolhimento de mulheres vítimas de violência, pode ser mais um passo na implementação silenciosa no país de um "abortoduto" – um sistema informal de facilitação ao aborto por dentro da estrutura estatal.
O programa, uma parceria dos ministérios da Justiça e Segurança Pública e da Saúde, prevê a implementação de espaços reservados como delegacias e defensorias para o atendimento de mulheres e meninas que sofreram violência de gênero. A primeira unidade foi inaugurada em João Pessoa. A intenção geral é oferecer apoio psicológico, jurídico e social às vítimas, mas há elementos que podem deturpar esse objetivo.
“O texto da portaria parece uma política pública positiva, no sentido de que, realmente, uma mulher que chega em uma situação dessa precisa de um atendimento individualizado, especializado também. E a política pública parece permitir tudo isso. Mas o que está por trás é mais do que isso. Há espaço para que seja facilitado o procedimento do aborto”, alerta a advogada Andrea Hoffman, presidente-executiva do Instituto Isabel.
A nota técnica que orienta a atuação dos profissionais nas Salas Lilás, produzida em dezembro de 2024 e divulgada em fevereiro de 2025, tem aspectos que podem facilitar o aborto fora dos limites previstos em lei.
O documento afirma que "a prática assistencial deve prezar pelo direito à vida livre de violência e à autodeterminação, o que inclui o respeito aos direitos sexuais e direitos reprodutivos". Em nenhum momento o texto esclarece os limites legais do aborto no Brasil. Como já se sabe, o termo "direitos sexuais e reprodutivos" é um eufemismo para a facilitação do acesso ao aborto comum em documentos oficiais desde os anos 1990.
Além disso, o termo "autodeterminação" é frequentemente empregado em contextos desse tipo para enfatizar que a mulher deve colocar a própria vontade acima da vida do bebê. A nota técnica não equilibra a autodeterminação da mulher com o dever constitucional de proteção à vida do nascituro.
O documento também abre brecha para o encaminhamento automático ao aborto. Para os casos de violência sexual, a nota afirma que "é indispensável orientar a pessoa sobre o direito à interrupção gestacional prevista em lei". "É importante que o profissional conheça os serviços de referência para este cuidado no território e saiba direcionar a pessoa, de maneira respeitosa, ética e em tempo oportuno", diz o texto. Não há previsão de oferta de alternativas à interrupção da gestação.
Em nenhum ponto da nota técnica há menção à vida intrauterina ou ao dever de protegê-la. Também não se prevê acolhimento específico à gestante que queira levar a gravidez adiante, nem apoio psicológico com apresentação de alternativas como a adoção.
O Ministério da Saúde foi questionado pela reportagem sobre essas omissões. Em caso de resposta, o texto será atualizado.
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Para Andrea Hoffmann, a ausência de qualquer menção à vida do nascituro ou de apoio à continuidade da gestação é grave. “Enquanto a gente não tiver uma política pública muito clara no sentido de que o aborto, mesmo dentro das excludentes de punibilidade, não seja sempre a primeira decisão, mas a última opção – e sempre priorizando a manutenção das duas vidas –, com informação à mulher sobre quais são as consequências efetivas de um aborto na vida dela, psicológicas, físicas etc., isso [programas como o Salas Lilás] se torna realmente um abortoduto.”
O problema, para a especialista, começa na própria formação de quem atende as mulheres. "A gente não tem como controlar quais são os profissionais que vão atender a mulher, mas a gente sabe que, ao longo do tempo, esses profissionais sociais, psicólogas, enfermeiras etc., têm sido treinados para que o aborto seja a primeira indicação, e não a última", afirma.
Recentemente, em resposta à ameaça representada pelo programa do governo Lula, o deputado federal Delegado Paulo Bilynskyj (PL-SP) apresentou o Projeto de Decreto Legislativo nº 139/2025, que busca sustar a portaria que institui o Programa das Salas Lilás.
Bilynskyj argumenta que a portaria não estabelece salvaguardas explícitas para a proteção da vida do nascituro, o que poderia abrir brechas para a instrumentalização das Salas Lilás como vias indiretas de facilitação ao aborto. O parlamentar sustenta que essa omissão contraria princípios constitucionais, como o direito à vida e a dignidade da pessoa humana.
Para evitar novas iniciativas que possam facilitar um "abortoduto", Hoffmann argumenta que seria importante também uma legislação "no sentido de que todas as informações serão dadas para a mulher para a possibilidade de manutenção das duas vidas, e informando quais são as consequências do aborto, físicas e psicológicas".
"Já vi essa experiência em outros países e funciona muito bem: no local onde se faz aquele primeiro atendimento de violência sexual, as mulheres recebem um material que explica toda essa questão, e ali muitas desistem de prosseguir [com o aborto]."
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